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O pior dano do neoliberalismo foi corromper mais ainda as sociedades

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"O pior dano do neoliberalismo, contudo, foi o de ter corrompido mais ainda as sociedades, isto é, contribuiu para a degradação mental e ética do povo" - Créditos da ilustração : Manual de Codicia
Fugir da responsabilidade é agir de má-fé

As crises sistêmica, ecológica e sanitária estão provocando uma crítica e uma reação ao capitalismo de mercado, sustentado pela ideologia do Consenso de Washington (1989). O jogo sujo das privatizações carreou para o mercado financeiro enormes fortunas, mas em 2001 somente 8% das transações financeiras internacionais tiveram como objetivo a movimentação de capitais para financiar a produção de riquezas reais.

O pior dano do neoliberalismo, contudo, foi o de ter corrompido mais ainda as sociedades, isto é, contribuiu para a degradação mental e ética do povo.

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Algumas idéias morais favoreceram o desenvolvimento do humanismo e a busca do estado de bem-estar coletivo. Outras foram reacionárias, conservadoras e retrógradas. Karl Marx (1818-1883) diz que as ideias morais são manifestações de superestrutura, condicionadas pelas relações materiais de produção. Por isso mesmo, são variáveis no tempo e no espaço, como produto histórico que são.

Desta forma, John Stuart Mill (1806-1873) afirma que é bom tudo que fomenta o bem-estar geral. Augusto Comte (1798-1857) aplica a máxima que diz “o bem é viver para outrem”.

Na contramão dos pensadores humanistas do século XIX aparece o fundamentalista liberal Herbert Spencer (1820-1903) que sustenta na “sobrevivência dos mais aptos” o bem supremo da ética. “Tudo que serve à vida, à vontade de poder, à sua sobrevivência, é bom: o que contraria ou impede é mau”, escreve.

A admissão de que “o fim justifica o meio é um dos arquétipos da atualidade

Spencer achava que um código de moral que não satisfizesse as provas de relação natural e da luta pela existência, estaria desde o começo fadado ao fracasso.  Spencer investiu contra todas as ações do Estado. Era contra a educação e a saúde públicas financiadas pelo Estado e a proteção governamental dos cidadãos contra empresários financeiros fraudulentos.

Spencer chegava a ponto de mandar levar suas correspondências diretamente ao destinatário para mostrar que não precisava e não confiava no serviço público dos correios. Com a vitória da democracia e do ideal socialista pós Segunda Guerra Mundial, essa ideologia liberal extremada foi derrotada. Porém, o neoliberalismo teve a ousadia de fomentar a ressurreição das ideias morais de Spencer.

A passagem dos indivíduos da condição de sujeito ético ativo para a condição de sujeito ético passivo foi a mais contundente das reviravoltas da atualidade. O sujeito ético ativo é aquele que controla interiormente seus impulsos, suas inclinações e suas paixões: indaga se devem e como devem ser respeitados ou transgredidos por outros valores existentes; exerce sua própria consciência com liberdade e responsabilidade.

Sujeito ético passivo é aquele que se deixa governar e arrastar por seus impulsos, inclinações e paixões, pelas circunstâncias, pela boa ou má sorte, pela opinião alheia, pelo medo dos outros, pela vontade de um outro, não exercendo sua própria consciência.

Na verdade, ao optar por um meio antiético de conseguir um fim ou de responder a um problema, o sujeito ético passivo age de “má fé” porque está fugindo da responsabilidade.

Portanto, a admissão de que “o fim justifica o meio”; a lei do menor esforço; a fuga da responsabilidade; o preconceito contra os serviços públicos; o negacionismo e resistência à vacina contra o covid19; o atribuir aos outros a culpa pelo fracasso e a alienação pela ambição de consumir são os arquétipos da cultura da atualidade, contaminados com o vírus da globalização e neoliberalismo.

Edição: Elis Almeida