Minas Gerais

CRIANÇA NÃO É MÃE

Apenas em 2024, quase 40 meninas de 10 a 13 anos tiveram filhos em MG

Constituição Federal considera estupro manter relação sexual com menores de 14 anos

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
PL do estupro afeta principalmente crianças negras - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc) indicam que, apenas em 2024, 37 meninas de 10 a 13 anos tiveram filhos em Minas Gerais. A Constituição Federal considera estupro de vulnerável manter relação sexual com menores de 14 anos. Portanto, elas teriam direito a realização do aborto legal. O levantamento ainda demonstra que a maioria das meninas são negras. 

Ao ampliar para a faixa de 10 a 18 anos, os dados são ainda maiores. Apenas neste ano, mais de 3900 jovens deram à luz no estado. Dessas, cerca de 77% são meninas e jovens negras. 

PL do Estupro pode piorar a situação

Especialistas alertam que, se o projeto de lei (PL) 1904/2024 for aprovado, o número de crianças e adolescentes vítimas de estupro que serão obrigadas a parir, antes mesmo de ter o corpo formado, pode aumentar. Além disso, as que optarem por não seguir adiante com a gestação, poderão ter penas maiores que a de seus estupradores.

Isso porque, o PL propõe a equiparação do aborto ao crime de homicídio, mesmo em casos permitidos por lei. 

A secretária de Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, Iêda Leal, afirma que o PL 1904/2024 chega a ser um desrespeito e conclama as autoridades do país a agirem frente a essa proposta. 

“É desrespeitoso achar que as crianças devem gerar os  filhos de quem as violentaram. Precisamos proteger as nossas jovens, meninas, e crianças. Nós precisamos garantir educação, saúde, lazer, moradia, cultura”, afirmou ao Brasil de Fato MG.

Nilma Lino, ex-ministra-chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República do governo Dilma (PT), também alerta que o PL faz parte da tentativa da extrema direita de usurpar o poder, minando a democracia de dentro para fora. 

“Eu espero que a população brasileira reaja, como já está tendo uma reação enorme. Mas não somente nós mulheres, os homens e a comunidade LGBTQIA + também. Todas as pessoas que lutam por um país democrático precisam pressionar o Congresso Nacional para que esse projeto seja retirado de pauta”, enfatizou Nilma Lino. 
Após a realização de manifestações em dezenas de municípios do Brasil contrárias ao PL, pressionado, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, afirmou que a proposta só entrará em pauta no segundo semestre. 

Impactos concretos

Fernanda* tem 10 anos, é negra, está no ensino fundamental e mora em Manhumirim. Ela poderia estar apenas brincando, estudando e fazendo tudo o que uma criança faz. Mas além de criança, ela é mãe de dois filhos. O segundo, nasceu em fevereiro deste ano. Sobre o genitor dos seus filhos, não existem informações. 

Clara* tem 12 anos, também é negra, está matriculada no ensino fundamental e mora em Varginha. Em março deste ano, ela deu à luz a seu primeiro filho. Antes disso, já havia tido duas gestações interrompidas. O genitor tem 22 anos, ou seja, é dez anos mais velho que ela. 

Fernanda e Clara são nomes fictícios, mas representam a realidade de adolescentes reais. As informações foram retiradas do banco de dados do Sinasc. 

Em Minas Gerais, existem 37 hospitais aptos a realizarem o aborto legalizado, 5 deles em Belo Horizonte. Esse total corresponde a menos de 4% dos municípios mineiros. Tanto Manhumirim quanto Varginha contam com serviços de saúde que realizam os procedimentos. 

Além de gravidez fruto de estupro, o aborto também é permitido quando há risco de vida da gestante e em casos de fetos anencéfalos. No primeiro caso, de acordo com a lei, não é preciso boletim de ocorrência. 

Edição: Ana Carolina Vasconcelos