Estudantes proibidos de se manifestarem pacificamente nas escolas, ativistas da reforma agrária presos por lutar pelo direito à terra, censura de opiniões políticas em meios de comunicação, espionagem de manifestantes, cassação sumária de mandatos. Parecem cenas dos tempos da ditadura militar, certo? Errado. Estamos falando de 2016, de hoje, deste exato momento. Por ser um direito fundamental, base de toda sociedade que se pretende democrática, a liberdade de expressão costuma ser o primeiro alvo da sanha conservadora. É o que estamos vivendo no Brasil.
A ruptura da ordem democrática, especialmente após a deposição da presidenta Dilma Rousseff sem a comprovação cabal de crime de responsabilidade, alçou ao poder um grupo político sem legitimidade popular que está aplicando um programa de governo que havia sido derrotado nas eleições presidenciais de 2014. Esse cenário fez desencadear um forte recrudescimento em termos de violações à livre manifestação do pensamento e de posições políticas. Claro, um governo sem respaldo das urnas e com baixo apoio da sociedade só pode se afirmar na medida em que controla as críticas e as reações oposicionistas contra si.
Não por acaso, assistimos à intervenção imediata de Michel Temer sobre a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), destituindo o diretor-presidente, que tinha mandato de quatro anos e extinguindo o Conselho Curador da empresa, formado por representantes da sociedade civil. Durante as Olimpíadas do Rio, em agosto, após tomar uma vaia ensurdecedora na cerimônia de abertura, Temer agiu nos bastidores para aplacar as manifestações que se multiplicavam a cada competição. A arbitrariedade só foi interrompida após uma decisão judicial.
Repressão violenta de manifestações pelo “Fora Temer” – inclusive usando táticas de espionagem de grupos de ativistas – e censura de conteúdos nas redes sociais já fazem parte do dia a dia. Nas redações comerciais, o cerceamento de vozes dissonantes ficou evidente. O jornalista José Trajano, do canal ESPN, foi demitido por defender sua posição contra o golpe. Agora, mais recentemente, com mais de 870 escolas ocupadas em todo o país contra a reforma do ensino médio, o Ministério da Educação emite ofício aos diretores pedindo a identificação dos alunos envolvidos nas mobilizações.
Para chamar a atenção da sociedade para a seriedade dessas e de outras violações, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), em parceria com diversas organizações da sociedade civil, lançou nesta semana a campanha “Calar Jamais!”. Por meio de uma plataforma online, no site www.paraexpressaraliberdade.org.br, serão recebidas denúncias de violações que tem ocorrido em todo o país, com o objetivo de dar maior visibilidade ao problema. A identificação dos denunciantes poderá ser mantida em sigilo. As denúncias recebidas serão apuradas, divulgadas e encaminhadas para autoridades competentes, dentro e fora do Brasil, como a OEA e a ONU. Defender a liberdade de expressão é preservar a própria dignidade humana. Participe!
*Pedro Rafael Vilela é Secretário-executivo do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e correspondente do Brasil de Fato em Brasília.
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