Minas Gerais

Exploração

Trabalhadores denunciam terceirizada da Prefeitura de Belo Horizonte (MG)

Funcionários alegam indicação de vereadores para vagas na cooperativa

Belo Horizonte |
Reunião da Comissão de Administração Pública da Câmara Municipal de BH com a participação de trabalhadores do setor de transporte
Reunião da Comissão de Administração Pública da Câmara Municipal de BH com a participação de trabalhadores do setor de transporte - Abraão Bruck / CMBH

Uma cooperativa em BH teria achado uma nova fórmula para extorquir dinheiro. De acordo com denúncias, motoristas estão sendo obrigados a pagar para obter uma vaga de trabalho na Cooperativa de Transporte Urbano e Rural (Coopertur), que presta serviços à prefeitura de Belo Horizonte. Além disso, profissionais estariam sendo indicados por vereadores. 

A Coopertur é uma pessoa jurídica contratada pela Prefeitura de Belo Horizonte pelo valor de R$ 51 milhões, para prestar serviços de motoristas oficiais. O atual contrato foi iniciado em setembro de 2016 e dura um ano. 

Segundo as denúncias, pessoas procuram a Coopertur em busca de emprego. Chegando lá, a cooperativa orienta o candidato a comprar um carro na empresa Locagerais, especializada em locação de veículos e terceirização de frota. Elas deveriam pagar pelo veículo o preço de R$ 15 mil de entrada, mais R$ 15 mil para garantir a vaga (o valor pode variar). O motorista também pagaria R$ 750 para ser associado e abriria mão de seus dois primeiros meses de remuneração, com o objetivo de ajudar a estruturar a Coopertur.

Vinculado a cooperativa desde setembro de 2016, Bruno Gleidson conta que não passou pela “venda casada”, mas pagou a taxa de R$ 750 e abriu mão de dois meses de remuneração. Ele questiona o fato de que, mesmo com a colaboração à cooperativa, seja demitido sem justificativa. Motoristas declaram, ainda,a que a cooperativa recolhe a contribuição previdenciária dos trabalhadores e não repassa o dinheiro ao INSS, e que os pagamentos atrasam 20 dias todos os meses. 

Ligação complexa

A acusação vai mais longe e envolve o projeto social Luiz Vidas, que oferece serviços gratuitos de ambulância, transporte e educação na Região Metropolitana de BH. O dinheiro cobrado aos motoristas passaria pela Locagerais, sendo direcionado à compra de ambulâncias no “Luiz Vidas”. Tanto o projeto quanto a empresa Locagerais têm como diretor Luiz Henrique Pires, filho de Luiz Ubiratan, que é presidente do Partido da Mobilização Nacional (PMN) em BH. Ele atuaria, segundo trabalhadores, como “patrão” na Coopertur. 

Um motorista que prefere não se identificar disse que a doação de ambulâncias a vereadores seria uma forma de “comprá-los”. “Ubiratan está preparando o filho para ser deputado. Então, está comprando apoio de vereadores”, declara. As demissões também teriam relação com o suposto esquema. Segundo o motorista, os profissionais seriam substituídos por pessoas indicadas por vereadores.

“Eles estão nos substituindo e dizendo que é orientação da prefeitura. Todo mundo sabe. Se você tem contato com um vereador, vai lá na Câmara e arranja o serviço”, denuncia o motorista. As demissões também serviriam ao recolhimento indevido de verbas. Recontratando profissionais, a cooperativa poderia arrecadar até R$ 4 milhões. 

Outro lado

Questionada, a PBH afirma que a cooperativa é a única responsável pela substituição de seus cooperados e que as denúncias devem ser apuradas pelos órgãos competentes. À reportagem, a associação Luiz Vidas disse que as acusações carecem de provas e estão sendo analisadas pela sua assessoria jurídica. Luiz Henrique Pires divulgou um vídeo-resposta no Facebook, no qual afirma que as empresas Coopertur e Locagerais têm vínculos apenas comerciais e que seu pai, Luiz Ubiratan, não tem ligação com a Locagerais. Sobre as ambulâncias do Luiz Vidas, diz que o projeto sobrevive com “recursos próprios, de maneira independente”.

Audiência pública

Os vereadores Pedro Patrus (PT) e Gabriel Azevedo (PHS) solicitaram audiência pública para o dia 16 de maio, às 19h, com o objetivo de debater o assunto. Foram convidados para a reunião o secretário de Governo, Paulo Lamac, de Planejamento, Orçamento e Informação, André Reis, bem como representantes da Coopertur. O debate deve ser acompanhado pela Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Minas Gerais.

Terceirização abre brechas para corrupção

Essas suspeitas, que envolvem uma entidade que presta serviços ao Município, ainda precisam ser comprovadas. Mas o caso mostra o favorecimento de particulares com dinheiro público. 

Historicamente, a terceirização tem servido a três propósitos no setor público. “O primeiro é a corrupção, viabilizando o repasse de recursos a pessoas que mantêm vínculos com quem está no ente estatal, por intermédio de uma terceirizada”, comenta o economista Frederico Melo, assessor técnico do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). 

Outra finalidade da terceirização seria burlar direitos dos servidores públicos, como estabilidade, limites da responsabilidade fiscal, concursos públicos, além de admitir pessoas ligadas a vereadores e outros políticos. Por fim, ao terceirizar, o poder público se exime de violações de direitos e outros maus-feitos, transferindo responsabilidade à empresa contratada. 

 

Edição: Joana Tavares