O governo federal deve a Minas Gerais, e não o contrário. É isso que defendem os deputados e prefeitos mineiros. Devido a Lei Kandir, o estado passou 20 anos sem receber ICMS de produtos destinados à exportação e, na opinião dos deputados, precisa ser ressarcido por isso, num total de R$ 135 bilhões.
Tudo começou com a Lei Complementar 87 de 1996, que implementou a isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a produtos destinados à venda fora do país. Uma decisão baseada no argumento de que os produtos brasileiros deveriam ficar mais baratos - sem o imposto - e pudessem competir no exterior. O resultado foi que 16 estados deixaram de receber enormes quantias em imposto.
Em Minas, o estado que mais perdeu com a isenção, os deputados estaduais criaram uma Comissão Especial da Assembleia Legislativa que propõe o “encontro” de finanças. Ou seja, que a dívida de R$ 87 bilhões de Minas Gerais seja descontada dos R$ 135 bilhões devidos pelo governo federal. O deputado estadual Durval Ângelo (PT), relator da comissão, afirma que o valor é a somatória do que a União deveria ter repassado ao estado desde 1996.
“Nós tivemos ano em que Minas recebeu 14% do que perdeu com a isenção, apesar de a lei federal falar em reposição total. Esses 135 bilhões é o valor com a correção nos mesmos índices de correção da dívida”, explica Durval. A intenção é que o estado pare de repassar cerca de R$ 300 milhões por mês para a União, como pagamento de juros. Para estancar o que os deputados chamam de “agiotagem” do governo federal.
Prefeitos engajados
25% de todo o ICMS arrecadado no estado é destinado às prefeituras e, caso o governo federal devolva o valor das isenções, cerca de R$ 34 bilhões serão repassados aos municípios. Por isso, a Associação Mineira de Municípios (AMM) é um dos atores mais envolvidos no movimento “Acerto de Contas”. Em 29 de maio, mais de 200 prefeitos e 20 deputados compareceram a audiência pública sobre o tema na Assembleia Legislativa.
O prefeito de Moema (MG) e presidente da AMM, Julvan Lacerda (PMDB), defende o acordo. “Se o estado consegue equilibrar suas contas, pode ajudar mais os municípios. Hoje, deixa muitas responsabilidades dele para o poder municipal”, analisa.
Trâmite
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de novembro de 2016 prevê que a Câmara dos Deputados faça o cálculo do ressarcimento do governo federal aos estados. O Congresso Nacional tem 12 meses para elaborar a lei; caso contrário, a responsabilidade passa a ser do Tribunal de Contas da União. O ressarcimento existe no papel desde 2003, adicionada pela Emenda Constitucional 42, mas até hoje não foi cumprida.
Lei é justa? Quem ganha com a isenção de ICMS de produtos exportadores
A não cobrança do ICMS para produtos primários e semimanufaturados “faz mal” ao estado de Minas Gerais, segundo afirma o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Fernando Duca. Além de perder orçamento, o estado recebe somente os royalties da exploração de minério de ferro, café e nióbio em seu território. Atividade que gera grandes custos com impactos ambientais.
Poucos são também os empregos diretos das empresas de exportação primária, apenas 1,2% do total do estado. Para comparação, o setor de serviços gera 33%, e a indústria de transformação gera 16%. O economista lembra, ainda, que a qualidade dos empregos nas mineradoras e plantações de café oferecem menores salários, menor nível de formação, mais instabilidade do que as indústrias.
Edição: Frederico Santana