Em tempos de golpe e ódio na sociedade, é importante lembrar que a militância é uma atitude de amor. Uma preocupação com a coletividade e com cada um. Com a vida. Amor ao povo, amor à luta por justiça, amor ao desejo de mudança. Não temos alternativa. Lutamos com a humanidade que temos, com os companheiros que temos, no contexto em que vivemos - que introjeta valores, práticas, desvios - ou não lutamos.
A outra alternativa é cuidar da vida, fingir que a política não é importante, e que basta fazermos nossa parte, individualmente. É fundamental no processo de construção lidar com os desvios militantes. Aliás, é o próprio processo de construção de mundo novo, lidar com as nossas deficiências e as dos outros. O desafio é justamente esse, não é outro. O desafio é a construção de novas relações interpessoais. Os defeitos que vemos, sentimos, com os quais nos incomodamos, não são genéticos, naturais, e muito menos pessoais. São produtos. São sociais. Fazem parte da deformação da maneira como a sociedade está organizada.
Em nossas críticas, costumamos não errar no diagnóstico dos desvios alheios. Mas costumamos errar em não ver os problemas dessa natureza em movimento, em contexto histórico, em mudança. E também em não nos colocarmos dentro dele. Não é fácil. Não é simples. Entre outros motivos, porque também essa busca por novas práticas e valores nadam contra a corrente. E por mais que a construamos cotidianamente, ela também é desconstruída cotidianamente. Tem avanços, mas tem retrocessos. E aí, é preciso recomeçar.
Não é problema desanimar, cansar. O que não podemos é desistir. Porque não tem saída nesse sistema e o que ele quer é que desistamos mesmo. Não faltam exemplos de quem desanima e fica pelo caminho, muitos bem-intencionados, mas desestimulados com a fragilidade de quem se coloca para construir outro mundo e acaba reproduzindo-o. Seria fácil construir o novo, se o velho não penetrasse em nós e em nossas organizações. Mas penetra. A solução é mais organização, mais firmeza ideológica, mais diálogo, mais crítica e autocrítica. Podemos nos surpreender ao fazer isso e acabar por descobrir que nós temos nos desviado também, até por omissão.
É preciso desejar, de todo coração, que cada um de nós construa a coletividade necessária para seu engajamento na construção desse outro mundo que queremos, de igualdade e liberdade. E que não desistamos; nem da luta, nem da humanidade. Que renovemos nosso compromisso com a militância a cada abraço companheiro, respeitoso com os desafios que se colocam, mas certos de que são só isso, desafios.
*Frederico Santana Rick é militante da Consulta Popular e da Frente Brasil Popular.
Edição: Joana Tavares