“O sertanejo é, antes de tudo, um forte”.
Com esta frase Euclides da Cunha, em seu clássico Os Sertões, descreve os sertanejos que encontrou no nordeste brasileiro durante a cobertura jornalística dos momentos finais da Guerra de Canudos, onde cinco expedições do exército brasileiro perpetraram o crime de destruir Belo Monte e assassinar Antônio Conselheiro.
O autor de Os Sertões era um típico filho da classe média do centro do país e foi para o nordeste relatar a guerra desigual entre o Exército bem armado e o heroísmo sertanejo defendendo seu mundo de suficiência e liberdade.
Aos poucos, no contato com a realidade brutal e com a vida dura do povo sertanejo, foi mudando sua visão de mundo. As pechas de “jagunços”, “fanáticos”, “bárbaros” e outras tantas comuns na elite intelectual, foram desabando na compreensão do escritor.
Sua indignação sobe às alturas quando descreve a localização do corpo do Conselheiro pelo exército, desenterrado para cortar a cabeça e exibir em praças públicas para delírio das elites da época. Euclides classificou-os de loucos e criminosos.
Apesar do grande impacto do clássico, esta visão odiosa e preconceituosa continuou ao longo da história do Brasil e continua ainda hoje. Este preconceito e ódio são contra o povo, pobres, negros, índios, mulheres, moradores das periferias, camponeses, contra todos os que não se enquadram nos esquemas mentais da elite e de parte da classe média idiotizada. E, ao longo da história, a elite escolhe um alvo para atacar, um símbolo representativo para destruir. Quebra este, quebra todos.
No passado os “alvos símbolo” foram Zumbi, Tiradentes, Antônio Conselheiro, Getúlio Vargas.
Hoje é Luiz Inácio Lula da Silva.
O plano é fazer com Lula o que fizeram com os outros e expor, com métodos midiáticos do século 21, a cabeça na praça como fizeram com Zumbi, Tiradentes e Conselheiro.
Mas o povo pobre e trabalhador não parou no tempo, não se abateu com as derrotas do passado e seguiu aprendendo e se organizando como classe, enfrentando a exploração, a exclusão, o preconceito e o ódio das elites.
E Lula transformou-se no principal símbolo coletivo desta luta histórica no período recente. Por isto alvo de tanto ódio. Não é ele, somos todos os que não cabemos no projeto das elites. São todos os oprimidos e trabalhadores deste país. É pelo que representa que Lula tem que ser tirado de cena, humilhado, preso, destituído de direitos políticos. É o mau exemplo da atualidade para o projeto entreguista das elites econômicas e parte da classe média ambiciosa e idiotizada.
Quando iniciou a perseguição a Lula, o aparato judicial-policial-midiático tinha uma teoria: “Lula é uma estátua de gelo, se chegar fogo, derrete”. Enganaram-se. Lula é uma estátua de granito. Chamusca, mas continua de pé.
É que Lula foi forjado na têmpera sertaneja, nas agruras do povo brasileiro em suas lutas por sobrevivência e dignidade. Parafraseando ainda o autor de “Os “Sertões”, Lula é parte da rocha viva do povo brasileiro. Este o grande engano dos perseguidores. Lula fosse só ele, era de gelo. Lula é o povo, é granito.
Lula transformou-se na condensação das melhores virtudes e das mais genuínas esperanças do povo brasileiro. Representa a retomada da esperança e de um Projeto de Nação. Caso Lula fosse um vendido, um traidor do povo, tivesse virado as costas aos seus e negado de onde veio e suas origens, já estaria destruído.
Lula tornou-se um símbolo grandioso, muito maior que ele mesmo. Talvez no período recente da história da humanidade, só dois semelhantes: Gandhi e Mandela.
Cito Gandhi e Mandela por dois motivos. Primeiro, porque é a escala de grandeza que a história de lutas do povo brasileiro projetou Lula. Segundo, porque Tiradentes, Zumbi, Conselheiro e Vargas foram inocentes perseguidos e derrotados em seu período de vida biológica. Gandhi e Mandela foram vitoriosos.
Chegou o tempo da virada na história do Brasil. Lula vencerá, não importa o que tentem fazer com ele. E iniciaremos um novo ciclo de respeito, dignidade e justiça com o protagonismo dos trabalhadores organizados.
O povo brasileiro tem energia e tenacidade forjada na luta e no sacrifício, por isto, é forte. Uma missão cabe agora ao povo com Lula: tomar as ruas e o quotidiano para fazer valer o que interessa às maiorias.
Então as elites saberão e o mundo saberá que Lula é, antes de tudo, um forte.
*Frei Sérgio Antônio Görgen ofm é franciscano, militante do MPA e autor do livro “Trincheiras da Resistência Camponesa”.
Edição: Joana Tavares