Na última semana, antes de anunciar que teria candidato próprio ao governo do estado, o MDB, partido de Temer e do vice-governador Antônio Andrade, participou de uma articulação para tentar derrubar Fernando Pimentel. De acordo com denúncia feita pelo advogado Mariel Márley Marra e aceita pela Assembleia Legislativa, Pimentel deixou de repassar recursos ao Legislativo, prefeituras e advogados do estado. O governo aponta as crises financeira e política como motivo para atrasos. O andamento da denúncia foi temporariamente suspenso, atendendo a questão de ordem dos deputados Durval Ângelo e Rogério Correia (PT). Nesta entrevista, Sílvio Neto, dirigente do MST e integrante da Frente Brasil Popular, analisa a possibilidade do impeachment e a avalia como uma tentativa de reproduzir em Minas o golpe dado há dois anos contra a presidenta Dilma Rousseff.
Brasil de Fato – Na sua análise, o que levou a Assembleia Legislativa a aceitar o pedido de impeachment do Pimentel?
Sílvio Netto – A conjuntura de Minas não está descolada do momento que estamos vivendo nos níveis nacional e internacional. Há uma crise econômica diante da qual os recursos do estado são disputados entre as elites e os mais pobres, os trabalhadores, o povo brasileiro. Foi isso que motivou o golpe, com a retirada, há dois anos, da presidenta eleita pela maioria dos brasileiros. Passados dois anos do golpe nacional, a parcela do MDB que representa os interesses das elites propõe a retirada do governo que elegemos em Minas para desgastar uma possível reeleição e se apropriar do governo para manter privilégios.
A aliança do governo Pimentel com o MDB foi um erro?
Foi algo necessário para o enfrentamento ao projeto extremamente nefasto que o povo mineiro suportou durante anos o projeto tucano, de um neoliberalismo clássico, que manteve interesses das mineradoras, siderúrgicas, agronegócio. Para fazer essa disputa, uma parcela do PMDB fez essa aliança com o PT e, consequentemente, gerou esse governo de superação do pesadelo que Minas viveu. Agora, a aliança que o próximo governo de Minas Gerais tem que fazer é com as organizações populares, sindicais, a juventude, as iniciativas de constituição de um projeto democrático e popular.
O processo de impeachment cita atrasos de repasses para municípios e a Assembleia Legislativa. O governo afirma que pegou o estado quebrado pela gestão tucana. Isso pode ter a ver também com o problema da arrecadação, por conta da crise?
Precisamos ter um entendimento sobre três elementos. Primeiro, de fato, o atual governo entrou um curto-circuito econômico, provocado por uma política completamente equivocada dos tucanos. Em segundo lugar, há uma crise econômica internacional, o que afeta especialmente Minas Gerais, que tem uma economia muito dependente das exportações de commodities. Porém, isso tudo não fundamenta a ideia de que houve crime de responsabilidade, assim como não se justifica a denúncia feita há dois anos de pedalada fiscal contra Dilma. São argumentos infundados. Por isso, essa iniciativa de tentar derrubar o governador é uma reprodução do golpe nacional.
Nesse processo, qual o papel da transferência de título da presidenta Dilma para Minas, a fim de ser candidata ao Senado?
A presidenta Dilma é acolhida pelos movimentos da Frente Brasil Popular para, junto com os mineiros, participar dessa disputa em 2018. O povo sabe que foi golpe, que ela é uma mulher injustiçada. Uma parcela mais conservadora sabe a força que tiveram os governos Lula e Dilma na melhoria de vida do conjunto do povo mineiro. Por isso, têm feito essa birra toda para inibir uma ação positiva do Partido dos Trabalhadores para trazer Dilma para o cenário estadual, contrapondo-se a manobras de uma parcela do MDB, junto com inimigos históricos do povo mineiro, representados pelos senadores Aécio, Anastasia e Perrella.
O governo teve uma postura avançada em algumas áreas, como no acerto de contas e quando não aceitou as condições impostas por Temer (MDB) para renegociar a dívida do estado. Por outro lado, tem sido muito criticado em outros campos, enfrentou uma greve importante na educação e tenta privatizar a Codemig. Como a Frente Brasil Popular avalia esse governo?
É um governo contraditório. Porém, é importante entender que existem iniciativas importantes para o conjunto do povo mineiro. A criação da Secretaria do Desenvolvimento Agrário mostra uma disposição do governo em pagar uma dívida histórica que o estado tem os camponeses. A Secretaria de Direitos Humanos é um avanço importante, para que possamos reivindicar diversas demandas vinculadas aos direitos fundamentais do povo mineiro.
O governo é fruto de uma correlação de forças da sociedade mineira. Só a aliança com o povo mineiro vai permitir que o governo supere essas contradições. O governo Pimentel é, sem dúvida, o que mais representa os trabalhadores aqui em Minas.
A Frente Brasil Popular se posicionou contra o golpe em Minas. Nesta semana, porém, a tramitação do processo de impeachment foi paralisada. Como a Frente se posiciona a partir de agora?
A Frente entende que o processo foi paralisado porque os deputados precisam ter juízo nesse momento. Aqui em Minas, fizemos grandes enfrentamentos para derrotar os governos tucanos e garantir desapropriações de terras, o acordo do piso da educação e que as ruas se mantivessem ocupadas pelos trabalhadores. Toda essa força vai ser canalizada em um combate aos deputados golpistas que ousarem tentar mexer com a democracia mineira. Reforçamos que o governador tem que avançar em suas políticas, mas é o governo que elegemos e, por isso, é com ele que queremos brigar.
Aproveito para fazer uma convocação ampla para que a sociedade se some à nossa iniciativa do Congresso do Povo. Os deputados golpistas demonstram que o parlamento não nos serve. Por isso, estamos chamando um parlamento paralelo. Um espaço para entender os problemas que temos vivido, os desafios a enfrentar e quem são nossos inimigos.
Além disso, o presidente Lula está preso em Curitiba. Exigimos nas ruas, praças, em qualquer oportunidade, a libertação imediata dele, para que possamos ter um retorno à democracia para Minas e o Brasil.
Edição: Joana Tavares