Com mais de 95 mil votos, Beatriz Cerqueira foi a 8ª candidata mais bem votada para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Do campo progressista, a melhor votada. Mas o número que mais chama a atenção é o fato de ter tido votos em 836 dos 853 municípios do estado. Filha de garçom com manicure, ela foi professora da educação básica, coordenadora geral do Sind-UTE/MG, presidenta da CUT Minas e agora leva para o parlamento o desafio de representar os trabalhadores em momento de corte de direitos. “Essa vitória significa que nós, pessoas comuns, podemos estar no Parlamento, que ele não é propriedade de um setor de privilegiados”, diz.
Como você avalia a sua trajetória até aqui, de professora da educação básica, a liderança sindical e agora deputada estadual?
Ser deputada estadual é consequência de um processo em que fomos identificando que as lutas sociais e sindicais são importantes, mas também é imprescindível disputar representatividade na política. Quando nós deixamos de fazer isso, as bancadas vinculadas aos trabalhadores caíram substancialmente. O golpe que vivemos demonstrou a necessidade da disputa do parlamento, e minha candidatura se insere nesse contexto. Ela foi construída na base da categoria a qual eu pertenço – a da educação – mas também junto a uma central de sindicatos, a CUT, a qual eu presidi desde 2012.
Você teve votos em quase todo o território estadual – 836 municípios, entre os 853. O que representa essa expressividade para os trabalhadores que você representa?
Representa que a gente consegue estar no Parlamento, que o Parlamento não é propriedade da elite, de um setor privilegiado. Nós, pessoas comuns, podemos estar lá. Sou uma professora primária. Minha trajetória toda é de luta social, fiz uma campanha sem padrinho, sem poder econômico, construída a muitas mãos. Isso significa que a política apode ser disputada dessa forma. Trabalhamos muito a ideia de representatividade, de chegar com uma plataforma de compromissos e não escondemos nosso posicionamento ideológico.
Quais os principais desafios de exercer um mandato com essas características em um contexto de avanço do conservadorismo?
O primeiro desafio é ser mulher no espaço de poder. Acho que as pessoas não têm dimensão do quanto nossa fala é inferiorizada, de como tentam mandar na gente o tempo inteiro. O segundo desafio é trabalhar com força social própria. Não adianta ir para o parlamento sem capilaridade social fora. Aquela plataforma que te levou ali deve estar presente, com pressão de fora pra dentro. O terceiro desafio é a atuação em si. Como vamos envolver as pessoas, discutir o que é importante pra elas? As pessoas veem o legislativo estadual de uma forma muito distante. Como diminuir essa distância e trazer as pessoas para uma participação efetiva e cotidiana? Por fim, outro desafio é não institucionalizar. O parlamento precisa ser um instrumento de luta na conjuntura em que estamos vivendo.
Como você enxerga a disputa entre Romeu Zema e Antonio Anastasia para o governo de Minas?
A gente sofreu, como em boa parte do país, uma onda fascista na reta final do primeiro turno. A política está muito bloqueada, as pessoas não têm paciência de discutir quando o que você fala não está i integralmente de acordo com o pensamento dela. Vivemos um primeiro turno no qual não se debateu o que precisava ser debatido. Como vamos revolver 28 milhões de desempregados ou subempregados? Como resolver o problema de 12 milhões de famílias que não compram mais gás de cozinha? O aumento da pobreza? A situação das milhares de pessoas que se tornaram moradores de rua porque foram expulsas da condição de pagar aluguel? O futuro da educação, da saúde, da universidade. Como vamos voltar a gerar riqueza no país. Era isso que tinha que estar sendo discutido. E para o segundo turno é preciso retomar as discussões que definem a vida das pessoas.
Aqui no estado a gente foi vítima dessa onda conservadora que se abateu em todo o Brasil na reta final. Nenhum dos dois projetos que chegaram ao segundo turno em Minas Gerais trazem qualquer progresso para a classe trabalhadora. Já conhecemos o projeto neoliberal do PSDB e, embora não conheçamos o ouro candidato igualmente por ele não estar na política, podemos ver que seu comportamento é totalmente Estado mínimo: vender tudo, desregulamentar tudo. Na área da educação, seu projeto é transformar a educação pública em privada. Então ele é um aprofundamento do que nós já vivemos em outros momentos. O parlamento assume, então, uma tarefa ainda mais importante nesse cenário, seja qual dos dois ganhe. Precisamos de uma atuação parlamentar que dê conta de impedir os retrocessos que serão propostos por um ou outro candidato. Os movimentos e sindicatos também assumem um papel ainda mais importante, de resistência.
Edição: Larissa Costa