Centenas de pessoas lotaram as dependências da Câmara Municipal de Belo Horizonte, na terça-feira (20), durante sessão que votou o projeto de lei 1749/2015, que cria o novo Plano Diretor da capital mineira. O texto elaborado pela população na IV Conferência Municipal de Política Urbana, em 2014, passou em primeiro turno na Câmara, com 31 votos a favor, 6 contra e 2 abstenções.
A votação foi marcada por uma reviravolta. Para que fosse aprovado, o plano diretor que a população elaborou precisava do voto de 28 dos 41 vereadores. Inicialmente, a maioria, atendendo a uma exigência dos empresários do setor imobiliário, era contra a proposta. Nos últimos dias, porém, os movimentos pela reforma urbana conseguiram a maioria necessária na Câmara.
“Nós fizemos uma ‘via sacra’ nos gabinetes dos vereadores, quase todos os dias, e aproveitamos os espaços que tivemos para conscientizar, mostrando que esse plano não é bom apenas para um segmento, mas para toda a cidade”, comenta Edneia Aparecida de Souza, integrante do grupo “Vereador, aprove o Plano Diretor”, articulação de entidades que participaram da Conferência de Política Urbana.
A pressão popular, segundo ela, garantiu o apoio do Executivo. “A Prefeitura avaliou as emendas dos vereadores, viu as que não prejudicavam a essência do que foi discutido na Conferência e incorporou essas emendas. Isso fez com que os vereadores se sentissem responsáveis por essa construção coletiva que é o plano diretor”, acredita.
Segundo turno, emendas e substitutivo
A matéria agora será discutida em segundo turno, quando os vereadores examinarão as emendas ao projeto. A emenda de número 146/18 foi encaminhada pelo governo na terça (20), no início da tarde, e contém um novo projeto. A principal mudança proposta no texto, segundo o líder do governo, Léo Burguês (PSL), é um novo critério para a edificação de prédios no Centro.
A versão original do Plano previu que, nos limites da avenida do Contorno, um proprietário poderia construir até uma vez a área do terreno, sem indenizar a cidade (atualmente, o limite é de 2,7 vezes). Isso é conhecido como Coeficiente de Aproveitamento Básico (CA Básico). Acima desse valor, o proprietário deveria pagar uma contrapartida ao Município, conhecido como outorga onerosa. O recurso será revertido para o desenvolvimento urbano. Pagando a outorga, o proprietário poderia construir no máximo quatro vezes o tamanho do terreno.
“Os instrumentos de política urbana, como a outorga onerosa, garantem que não haja uma verticalização da cidade a um nível desastroso, o que acarretaria depredação do meio ambiente. Por outro lado, reverte o valor da outorga para construir infraestrutura urbanas nas periferias, além de garantir um fundo de mobilidade para, inclusive, subsidiar as tarifas de transporte, e habitação de interesse social”, explica a vereadora Bella Gonçalves (Psol).
O novo texto propõe uma regra de transição, até implementar o CA Básico igual a 1 em toda a cidade. “Vamos manter o coeficiente de aproveitamento nessa área durante três anos. A pessoa, se quiser, pode comprar até 5,0. Quem comprar a outorga na transição paga com 50% de desconto. Com isso, os construtores vão diminuir o valor da fração ideal e ganhar em escala na sua construção. O construtor que protocolar o projeto nos próximos três anos terá mais quatro de prazo para iniciar a obra”, explica o vereador Léo Burguês (PSL).
Para a vereadora Cida Falabela (Psol), a espinha dorsal do Plano foi preservada. “Esse primeiro turno é uma vitória do povo. Mesmo com um substitutivo sendo apresentado com tanta rapidez, os princípios básicos foram mantidos e é por isso que nós defendemos que ele fosse votado. A luta continua no segundo turno, não vai ser fácil, mas o povo mobilizado é que faz as mudanças mesmo”, pontua.
Vereador contesta votação
Ao fim da seção, o vereador Dorgal Andrada (Patri), que votou contra o Plano Diretor e foi contrário à outorga onerosa, fez uma questão de ordem. O parlamentar disse que a sessão extrapolou o tempo regimental e que, por esse motivo, ele vai tomar medidas legais para anular a votação.
“A reunião deveria ter se encerrado às 17h15 porque o regimento interno estabelece que a duração máxima da reunião na Câmara Municipal é de 3h30. A duração máxima do primeiro expediente é de 2 horas. De 3h30 menos 2 horas, sobra 1h30. Na segunda fase pode durar, no máximo, 1h25. Fazendo as contas, o presidente excedeu essa limite, por volta de cinco a seis minutos. No meu entendimento, tudo o que ocorrer após as 17h15 deve ser anulado por providências a serem tomadas”, afirma o vereador.
Combater o problema das chuvas
Segundo Edneia Aparecida de Souza, integrante do grupo “Vereador, aprove o Plano Diretor”, as áreas onde acontecem tragédias com desabamentos e alagamentos são as mais pobres da cidade. Pobres porque não receberam infraestrutura urbana quase nenhuma. A outorga onerosa pega as áreas onde a Prefeitura investiu praticamente todo o imposto arrecadado ao longo da construção da cidade de Belo Horizonte, as mais valorizadas, e coloca ali um instrumento de justiça social.
“A partir de agora, se você quiser adensar essa área valorizada com o dinheiro de todo mundo, você tem que pagar uma contrapartida, que vai ser o investimento para que esse tipo de tragédia no resto da cidade não ocorra mais. Essa contrapartida é também uma forma de financiar para que nessas áreas onde acontecem alagamentos, onde há corredores importantes e estão sendo discutidas as centralidades, seja discutido o problema dos alagamentos”, defende Edneia.
Edição: Joana Tavares