Começou como um ajuste ou mesmo um teste, mas a partir de 2016 os ônibus da região metropolitana de Belo Horizonte gradativamente passaram a circular sem o agente de bordo, conhecido popularmente como cobrador ou trocador de ônibus. Uma tendência? Uma mudança? Economia? Era útil ou não este trabalhador? Perguntas cujas respostas ficam óbvias para passageiros na falta deste profissional nos coletivos.
Algumas pessoas acham que a tecnologia avançou e, portanto, não seria mais necessário um trabalhador presente para esta função. Outros de forma mais objetiva procuram responder com a afirmação de que o custo do transporte passa pelo número de servidores e a partir do momento que não há mais um cobrador este custo não ficaria para quem paga as passagens.
Mas e o trabalhador e a trabalhadora? Aquele ser humano, que tem uma vida, família e estava presente no cotidiano do transporte público. Os motoristas têm dado prova de que não é verdade a afirmação de que a tecnologia resolveu o problema das cobranças. Os motoristas viraram também cobradores, passaram a ter as duas funções. O resultado desta pressão ao longo dos últimos anos se expressa nos vários acidentes de trânsito (alguns que tiveram morte) que ocorreram por conta da dupla atribuição imposta pelas empresas. Quanto ao custo, não houve o repasse por meio da diminuição do valor das passagens para quem utiliza o transporte público.
Algumas destas perguntas podem ser respondidas com um olhar mais profundo sobre o papel do trabalho na sociedade moderna. O que há neste cenário desfavorável aos mais pobres é o sucateamento do direito constitucional da liberdade. O ir e vir se precariza com a ausência do agente de bordo, como se importasse apenas as passagens pagas. Este trabalhador e essa trabalhadora tinha como atribuição profissional garantir, por exemplo, o acesso das pessoas com deficiência aos coletivos seja no manuseio do elevador para usuários de cadeira de rodas, ou mesmo no diálogo com os demais usuários do transporte público e orientações gerais.
A garantia da cidadania passa não pela cobrança da passagem de ônibus, mas pela qualidade e garantias sociais que o transporte disponibiliza. A figura humana é insubstituível em relação a qualquer custeio ou tecnologia que garanta a cobrança de passagens.
De acordo com a teoria crítica, a alienação se torna objetiva quando procura separar o trabalho do ser humano. Esta separação tende a perceber os trabalhadores apenas como suas funções profissionais e não como seres criativos, coletivos e presentes na consolidação do trabalho enquanto transformação. As afirmações que se apresentam com a saída dos cobradores é que o importante agora é o pagamento e não todas as outras possibilidades no mundo do trabalho que o trabalhador tinha como responsabilidade.
Passados dois anos, além da demissão em massa destes trabalhadores o que fica é o incomodo da população. Fica explícito o verdadeiro interesse das empresas privadas na exploração de um serviço público e na garantia do direito ao transporte: o lucro. Ônibus devem servir a coletividade e não ao lucro.
Leonardo Koury Martins é assistente social, professor e militante da Frente Brasil Popular.
Edição: Elis Almeida