A cidade de Juiz de Fora, na zona da mata mineira, poderia estar celebrando as duas décadas da presença da empresa Mercedes-Benz. Porém, um anúncio da empresa de que pretende mudar a maior parte da fábrica para outros estados encheu o aniversário de preocupações. Estima-se que 900 trabalhadores serão demitidos e que a economia da região sofra uma baixa.
A empresa confirma a pretensão de transferir a maioria das atividades para o porto de Vitória (ES) e para São Bernardo do Campo (SP). Atualmente, a fábrica de caminhões em Juiz de Fora é considerada uma das mais modernas da América Latina. Em uma audiência pública na Câmara Municipal de Juiz de Fora, na segunda (15), o diretor de comunicação da Mercedes-Benz Brasil, Luiz Carlos Moraes, sustentou que a empresa continua a apostar no mercado brasileiro, mas está se mudando para aumentar sua eficiência.
“Nós precisamos de crescimento e só crescimento faz aumentar o número de empregos”, afirma. “A logística Rio de Janeiro – Minas Gerais não funciona. Vamos atacar os problemas. Não podem transferir para nós um problema que é de infraestrutura”, cobrou o diretor de comunicação da Mercedes, se referindo aos poderes públicos. Luiz Carlos ainda comenta que as vendas de caminhões no Brasil caíram de 172 mil unidades em 2011 para 75 mil em 2017.
Prefeitura cobra governo de Minas
O prefeito Antônio Almas (PSDB), presente na audiência, afirma que procurou parlamentares do Senado e da Câmara Federal para auxiliar na solução do problema. “Na verdade, a Prefeitura e a Câmara Municipal são os menores atores. Os grandes atores são a Assembleia Legislativa, Governo do Estado, Congresso Nacional e a Presidência da República. São eles que têm relação mais direta com a diretoria da empresa”, argumenta.
Trabalhadores e responsabilidade social
Os funcionários e funcionárias da Mercedes-Benz Juiz de Fora são cerca de 1.150 e, destes, 900 podem perder o emprego. Eles se amedrontam de fazer parte dos 13 milhões de desempregados do país, o que indica dificuldade na procura por uma nova ocupação. E consideram injusto que, depois de anos, percam a estabilidade trabalhista sem reconhecimentos da empresa à qual se dedicaram.
Durante a audiência pública, o presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos, Marco Antônio de Jesus, argumenta que o governo de Minas forneceu um grande incentivo (financiamento, terreno e fiscal) em 1999, na implantação da Mercedes, e cobra que a empresa responda a esse investimento com responsabilidade social.
Uma matéria do jornal Folha de S. Paulo, de fevereiro de 1999, aponta que a empresa recebeu R$ 770 milhões do governo de Itamar Franco, através do Fundo de Desenvolvimento de Indústrias Estratégicas e do Fundo de Incentivo à Industrialização. O valor corresponderia hoje a R$ 3,6 bilhões, corrigidos pelo IGP-M.
Segundo o sindicato, na negociação entre Mercedes e trabalhadores que aconteceu na terça (16), a empresa confirmou que fechará parte das atividades já em maio, atingindo 215 trabalhadores, sendo 15 diretos, que se manterão na empresa, e 200 terceirizados. A justificativa, informa o sindicato, seria que o governo do Espírito Santo se comprometeu a regularizar os documentos para os caminhões em 4 dias a partir da sua produção, enquanto no estado de Minas isso demora cerca de 20 dias.
A empresa teria anunciado ainda que em junho de 2020 pretende diminuir a produção de caminhões Actros em Juiz de Fora, mantendo apenas a produção de cabines. Podem ser demitidos 700 trabalhadores diretos. O resultado da negociação é de que o sindicato, junto à empresa, pensará em outros produtos para que a fábrica em Juiz de Fora não paralise.
Mercedes, Fiat e a guerra fiscal
“Hoje o Brasil vive uma guerra fiscal entre os estados. Basta ver o pacote que o governador de São Paulo lançou. Minas Gerais tem um dos maiores ICMSs do país e precisa rever alguns posicionamentos. A guerra fiscal não é só na Mercedes. Há rumores de que a Fiat já mandou parte da fábrica para Pernambuco e agora está discutindo a ida de toda a fábrica pra lá”, comenta João César da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Juiz de Fora.
O governo de Minas foi procurado, e respondeu que existe o compromisso em manter a fábrica, mas não divulgou mais detalhes. O deputado Betão (PT) apresentou sete requerimentos à ALMG. Dentre eles, um pedido de levantamento de informações sobre financiamentos e outros benefícios que o Estado tenha dado às empresas desde 1996.
Reposta da empresa
Em nota, a Mercedes-Benz Juiz de Fora afirma que em nenhum momento teve a intenção de fechar a fábrica de Juiz de Fora e que investimentos futuros contemplarão também atividades na cidade mineira. Leia na íntegra:
“A Mercedes-Benz do Brasil em nenhum momento informou que deixaria de produzir em Juiz de Fora/Minas Gerais. Pelo contrário, sempre reiterou a importância estratégica dessa planta para a Empresa. Todos os investimentos da Companhia para veículos comerciais, invariavelmente, tem contemplado Juiz de Fora. Assim como aconteceu em 2014, com o investimento de R$ 230 milhões para Juiz de Fora e R$ 500 milhões para São Bernardo do Campo/São Paulo. Dos R$ 2,4 bilhões planejados entre 2018 e 2022, também há parte destinada para a planta mineira. Sempre foi reiterado de que as duas fábricas produzem em total sintonia. Juiz de Fora é responsável pela produção de todas as cabinas de caminhões e São Bernardo do Campo pela fabricação de caminhões. As necessidades de ajustes, naturais tanto na produção como nos processos logísticos, buscam tornar a nossa Empresa ainda mais eficiente e competitiva no mercado brasileiro.”
Edição: Joana Tavares