Pratinhos de planta, garrafas, pneus, tambores de água, filtros... Todo mundo sabe que é preciso ficar de olho nesses recipientes para evitar a proliferação de focos de mosquito, especialmente do Aedes aegypti, transmissor de doenças como zika, dengue e chikungunya. Em Minas Gerais, por exemplo, já são mais de 247 mil casos prováveis de dengue apenas em 2019. Já morreram 38 pessoas e outras 92 mortes estão em investigação.
A Secretaria Estadual de Saúde declarou situação de emergência de saúde pública em municípios das regiões Centro, Noroeste, Norte, Oeste, Triângulo Norte e Triângulo Sul do Estado. Um estudo - chamado Levantamento de Índice Rápido para Aedes aegypti (LIRa) - mostra que os principais fatores para proliferação dos criadores são “depósitos domiciliares”, “lixo” e “depósito de água”. Ou seja, grande parte do problema depende de questões da própria cidade e de políticas públicas.
“É muito mais importante o cuidado público - da Prefeitura, do governo - do que o individual. Os espaços de responsabilidade do Estado, como terrenos abandonados, lixões, lotes vagos, são muito maiores e mais relevantes do que o interior de cada casa. Além disso, quando se vive num lugar descuidado pelo Estado, as pessoas acabam cuidando menos também”, sublinha Aline Bentes, médica pediatra infectologista da rede pública de Belo Horizonte e professora da UFMG.
Aline destaca que a concepção de saúde precisa ir além da dimensão do cuidado pessoal e perpassa condições de vida que, muitas vezes, estão fora do arco de ação dos indivíduos. “Por exemplo, a falta de fornecimento de água leva as pessoas a armazenaram como podem. Ao fazerem isso, para sobrevivência, elas muitas vezes guardam a água de forma inadequada, em tambores sem tampa”, pontua.
Menos infraestrutura, mais dengue
Segundo pesquisa da Fundação João Pinheiro, 23% da população do estado não tem acesso à rede de esgotamento sanitário, que inclui os serviços de abastecimento de água, esgoto, manejo de resíduos sólidos e de água da chuva. Os dados são de 2014.
A professora da faculdade de arquitetura da UFMG Jupira Gomes de Mendonça reforça que os espaços urbanos precários, sem infraestrutura, sem saneamento, levam a diversos problemas sociais, inclusive de saúde. “No caso da dengue, é fácil ver que onde tem menos casos é em lugares onde há mais infraestrutura, maior índice de limpeza urbana, como coleta de lixo e varrição das ruas”, destaca.
Ela chama a atenção para a questão da moradia: como muitas pessoas precisam dividir a residência com outras famílias ou têm gastos excessivos com aluguel, acabam buscando alternativas como ocupações irregulares, em locais sem estrutura. “E esse problema vai piorar. Estamos vendo um refluxo nas políticas habitacionais. Não que antes elas fossem as ideais, mas havia uma produção de moradia subsidiada, em regiões com alguma infraestrutura. Agora, nem isso há e a situação toda vai se agravar”, alerta. Ela chama atenção também para o risco de privatização do saneamento básico, o que vai excluir ainda mais pessoas desse direito e impactar todo o espaço urbano.
“A dengue não respeita os limites da propriedade. Todos que vivem na cidade são afetados. Enquanto a gente achar que apenas medidas individuais – cada um cuidando do seu vasinho de planta – serão suficientes, teremos surtos. Cada um fazer sua parte é importante, mas só vamos conseguir combater a dengue quando entendermos que a cidade é de todos. Se os problemas são coletivos, as soluções também precisam ser”, reforça a médica Aline Bentes.
Sinais de alerta e vacina
Há apenas um tipo de vacina contra a dengue, mas ela é restrita a quem comprovadamente já teve a doença e tem mais de 9 anos de idade. Ela está presente apenas na rede particular de saúde. Há estudos da Fiocruz para desenvolvimento de uma outra vacina, que possa ser dada para quem nunca teve dengue, mas ainda sem previsão de lançamento.
É importante ficar atento aos sinais - dor de cabeça, febre, mal-estar - e beber muita água. Aline recomenda observar a urina: o xixi bem clarinho indica boa hidratação. Em caso de sangramento, dor abdominal, vômitos persistentes, tonteiras, alteração de comportamento, a recomendação é procurar imediatamente uma unidade de saúde.
Edição: Elis Almeida