Minas Gerais

Opinião

Artigo | Justiça para Filipe Reis

O extermínio da juventude negra brasileira é um projeto que ultrapassa fronteiras

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
O jovem vivia em Lisboa, Portugal, e lá conseguiu abrir uma barbearia que começou a despontar na região
O jovem vivia em Lisboa, Portugal, e lá conseguiu abrir uma barbearia que começou a despontar na região - Foto: Reprodução Facebook

Filipe Reis era um jovem de 24 anos, daqueles que trazem nos olhos o brilho e a alegria da vida. Negro e vindo da periferia de Belo Horizonte, o rapaz viu do outro lado do Atlântico melhores oportunidades de trabalho e moradia. Vivia em Lisboa, Portugal, e lá conseguiu abrir uma barbearia que começou a despontar na região. No dia 21 de abril foi brutalmente assassinado após sair de uma boate. Seu corpo ficou desaparecido e só foi encontrado uma semana depois, boiando em um estaleiro no Parque das Nações, uma das regiões mais movimentadas da capital portuguesa. Testemunhas afirmam que ele foi vítima de uma briga e teria sido espancado e esfaqueado. Mas as causas, circunstâncias e os responsáveis do crime ainda são uma incógnita para a família.

O assassinato de Filipe nos faz refletir sobre o nível de intolerância que estamos vivenciando. De tamanha xenofobia, que torna impossível a convivência com o outro, com o diferente. O extermínio da juventude negra brasileira é um projeto que ultrapassa fronteiras. Todos os dias nossos jovens são assassinados, no Brasil ou fora dele. A falta de oportunidades e a ilusão de um futuro com mais qualidade de vida nos leva a deixar nossa pátria e nos submetermos à violência e ao preconceito daqueles que acreditam ter mais valor do que nós.

Tão assassino quanto aqueles que tiraram a vida de Filipe é também o Estado brasileiro, que a cada dia retira os insuficientes, mas fundamentais avanços que conseguimos nos últimos anos, para que nossos jovens tenham condições de viver dignamente em nosso país.

A despedida precoce de Filipe, assim como toda partida repentina, deixa a dor e o vazio. Mas seu assassinato nos tira o sono e rasga a garganta. Gritamos de indignação por um futuro ceifado antes da hora e que para os poderosos parece não ter valor. Neste país que só retira direitos e precariza as condições de vida do povo, não é de se espantar que nenhuma cobrança sobre os responsáveis pelo crime tenha sido feita. Os algozes de Filipe continuam à solta em Portugal e o Estado brasileiro se cala novamente diante de mais uma vida que se vai. Será que além da dor da perda, a família ainda terá que conviver com a impunidade? Quantos Filipes ainda vamos precisar perder?

O nosso querido, infelizmente, é mais uma vítima do sistema capitalista. Que nos nega oportunidade de ter uma vida digna em nosso país de origem, que nos oprime todos os dias por causa da nossa cor, do nosso gênero e por nossa classe social. O sistema assassinou Filipe Reis e nos mata todos os dias, espancados, ou com 80 tiros, de fome, de depressão...

Apesar das angústias que nos assolam nesses tempos sombrios, a esperança nos alimenta. Me acalenta em saber que Filipe segue vivo em cada um dos milhares de  jovens que saíram às ruas no último dia 15,  para protestar contra os cortes que ameaçam a educação no país e para defender o futuro de várias gerações.
Viva Filipe! Que seja sempre lembrado e esteja presente em cada curva de sorriso que ainda daremos nos dias de liberdade, que virão quando tiverem fim todas as amarras que oprimem e violentam o nosso povo.

Amélia Gomes é jornalista do Brasil de Fato.

Edição: Elis Almeida