Minas Gerais

Minas Gerais

Comissão Independente de Inquérito pede punição da Vale

Expectativa é que relatório organizado pela comissão auxilie trabalho de CPIs e do Judiciário

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho é um crime trabalhista sem precedentes em todo o mundo
O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho é um crime trabalhista sem precedentes em todo o mundo - Ricardo Stuckert

Uma Comissão Independente de Inquérito tem trabalhado nas investigações sobre o rompimento da barragem da Vale na mina de Córrego do Feijão. Nesta quinta-feira (1) o grupo apresentou o primeiro parecer sobre o caso, com dados levantados na última semana. A Comissão é formada por advogados, sindicalistas e professores que atuam com o tema. Após visitas e coletas de depoimentos dos trabalhadores sobreviventes e dos atingidos, a Comissão definiu pontos centrais sobre o caso: justiça, independência, transparência, prevenção e dissuasão.

Independência é fundamental

O eixo principal dos trabalhos preliminares da comissão é a necessidade de independência nas investigações sobre o caso e reparações dos atingidos. Na avaliação do grupo, a Vale tem interesses monetários em todo o processo e sempre visará conter os gastos com o crime socioambiental que ela cometeu, por isso deve ser afastada de todo o processo. Foi o que destacou David Michaels, professor da George Washington University e Secretário Adjunto do Trabalho do Presidente Obama para a Administração de Segurança e Saúde Ocupacional dos Estados Unidos: "Esperamos que o nosso trabalho também ajude a implementar um sistema de justiça que dê conta de reparar todas as vítimas do crime, em todas as dimensões em que elas foram atingidas. E esse sistema não pode ser controlado pela Vale. É uma lição que aprendemos após o caso de Mariana, em que as empresas tiveram poder demais nos processos de reparação. Precisa ter um sistema independente de reparação social e ambiental".

Na avaliação do professor, assim como as reparações, o monitoramento das barragens que estão sob risco de rompimento também deve ser feito por uma auditoria independente, que não tenha vínculos com as mineradoras. No relatório preliminar, a comissão sugere a criação de um programa de auditoria permanente dessas estruturas. "A prevenção de novos crimes deve ser uma preocupação prioritária de todos. Muitos fatores evidenciam que a empresa sabia que o rompimento aconteceria e o negligenciou. Por isso, devemos estar alertas para que novos rompimentos não aconteçam", ressalta Michaels.

Além do monitoramento constante, outro ponto ressaltado pelo grupo é a necessidade de que os responsáveis pelo crime sejam, de fato, penalizados criminalmente. O que até hoje não aconteceu no caso da barragem de Fundão, em 2015. A comissão também sugeriu que haja uma investigação profunda sobre a real situação de contaminação dos rios atingidos pela lama.

Crime sem precedente em todo o mundo

Durante a coletiva de imprensa para apresentação do relatório parcial, a comissão também destacou que o caso do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho é um crime trabalhista sem precedentes em todo o mundo. Por isso, para Oscar Alzaga, advogado trabalhista mexicano e ex-juiz do trabalho, a busca incessante pela verdade é um interesse que ultrapassa fronteiras. "Não podemos deixar que as mentiras da empresa prevaleçam, porque a verdade é importante não só para Minas Gerais, mas para todo o Brasil e o mundo. As empresas não fazem no resto do mundo o que elas fazem na América Latina. Aqui elas agem com extrema irresponsabilidade e negligência. Elas apostam no esquecimento. Apostam que a sociedade não vai se lembrar dos crimes que eles cometeram. Por isso é tão importante essa luta pela verdade dos fatos e pela justiça", declarou o representante do Sindicato dos Mineiros do México.

A avaliação é endossada por Joceli Andreoli, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que também tem acompanhado os trabalhos da comissão. "O que está em debate aqui não é o crime da Vale no Brasil, é o marco internacional dos crimes da mineração. Se ficar impune no Brasil significa que outros povos também sofrerão com essa lógica do lucro acima da vida", denuncia Andreoli.

O relatório final sobre as investigações da Comissão está previsto para ser divulgado no dia 14 de setembro. O documento será entregue para as CPIs que investigam o caso, tanto na ALMG quanto no Congresso. O texto também deve ser encaminhado para o Judiciário para auxiliar nos processos. Além do levantamento, será produzido um documentário sobre os trabalhos da comissão.

A Comissão tem o apoio da Comissão Internacional de Direito do Trabalho (ICLR), Associação Internacional de Advogados Democratas (ILAW), Rede de Advogados Assistindo Trabalhadores, Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas (ALAL) e Associação Canadense de Advogados Sindicais (CALL).


 

Edição: Joana Tavares