Mobilizar-se contra um projeto de mineração não é fácil, mas há sempre quem tenha a ensinar e apoiar. Foi nisso que apostou o seminário “Diferentes Formas de Dizer Não: experiências de proibição, resistência e restrição à mineração”, realizado de 12 a 15 de agosto. A cidade escolhida para receber o seminário foi Muriaé, região da Serra do Brigadeiro, Minas Gerais, que passa por vitórias e conflitos com a mineração.
Os debates e trocas de experiências foram os objetivos prioritários do encontro, relata o dirigente estadual do Movimento pela Soberania na Mineração (MAM), Luiz Paulo Siqueira. Os projetos de mineração podem atingir as comunidades de diferentes formas, por exemplo, contaminando a água, causando doenças diversas, expulsando famílias e grupos de seus territórios ou até destruindo reservas ambientais. A ideia foi, juntos, construir um conhecimento popular capaz de barrar a mineração e suas diferentes consequências.
Uma das lutas mais destacadas entre os participantes, segundo Luiz Paulo, é pela determinação de áreas livres de mineração, que seriam territórios em que a mineração é expressamente proibida, definidos por lei. “Não é porque tem minério no subsolo, que a região tem vocação para atividades minerárias. Muitas vezes o minério no subsolo cumpre um papel fundamental para o ambiente, para a agricultura, para a água, para o armazenamento hídrico. Quando se extrai o minério, acaba destruindo tudo”, explica.
O encontro reuniu uma grande diversidade de representantes, o que demonstra a gama de populações que estão sendo atingidas pela mineração no país. Participaram cerca de 120 pessoas de associações de bairro, sindicatos, movimentos populares, pastorais sociais, indígenas, quilombolas e organizações não governamentais. Foram organizadas vivências na Serra do Brigadeiro, em três áreas ameaçadas pela mineração (Rosário de Lima, Belisário e Miradouro). As regiões sediaram também audiências públicas, atividades sobre espiritualidade ecológica e café da manhã na praça.
Encontro reuniu 120 pessoas de todo país para enfrentar poder das mineradoras
7 formas diferentes de barrar a mineração
A pesquisadora Maiana Maia, da Faculdade de Órgãos para Assistência Social e Educacional, estuda os conflitos entre mineração e comunidades. Apesar de destacar que “não existe receita de bolo, ela listou para o Brasil de Fato sete aspectos que mais podem contribuir para o sucesso da luta popular.
1: Fortalecimento das comunidades frente as estratégias empresariais
“Qualquer uma das grandes empresas de mineração que atuam no Brasil costumam ser muito parecidas na forma de atuação no território que quer se implantar. São muitas estratégias de cooptação das lideranças, de ameaças, de violências, de espionagem. O que a gente tem aprendido é que pra conseguir fazer frente a essas estratégias, precisamos de comunidades empoderadas e fortalecidas, com fortes atores locais fortalecidos e capazes de estabelecer alianças.”
2: Desconstruir as promessas e divulgar os impactos gerados pelo projeto de mineração
“Esse segundo acerto é a sabedoria de conseguir criar uma outra narrativa sobre os projetos de mineração. Iniciativas que consigam olhar para as promessas que a empresas estão divulgando e questionar: será que os empregos vão ser gerados mesmo? Vai gerar renda? Que tipo de emprego vai gerar? O que acontece com a cidade depois que o minério acaba?
É importante jogar luz sobre todos os impactos no território, na saúde, nas águas, sobre as outras economias que existem e vão desaparecer. Existe muita coisa que é dita errada pela mineradora e que as resistências são capazes de denunciar.”
3: Produção de conhecimento
“O terceiro acerto costuma ser a articulação de uma rede de saberes, tanto o saber da comunidade sobre o seu território, quanto o saber universitário de pesquisadores engajados e o saber técnico, de laudos de laboratório. Aglutinar uma série de iniciativas que produzem contra informação. Isso é importante para fazer frente a informações que as mineradoras divulgam, como também para produzir cartilhas para a comunidade, vídeos, panfletos. Tenha estratégias de produção de conhecimento, pois conhecimento é poder. E as informações não podem ficar só na mão das mineradoras, pois elas têm o interesse de manter a população desinformada ou produzir informações não verdadeiras”.
4: Alianças
“Estabelecimentos de alianças, inclusive as mais inéditas e improváveis, com pessoas impactadas não só diretamente, mas indiretamente. Uma mineração, por exemplo, mexe com o abastecimento de água urbano, poeira, afundamento de terrenos, doenças que vão sobrecarregar os hospitais. A gente percebe que os impactos vão alcançando uma multiplicidade de atores. E esses atores têm que estar conectados para que a comunidade atingida diretamente não fique sobrecarregada. As alianças são uma chave de poder para a resistência”.
5: Mecanismos institucionais
“Em muitos dos relatos de resistência, o estado (governo) não estava ao lado da população, pelo contrário, eles ficam ao lado da mineradora dizendo que a mineração é de ‘interesse nacional’. Mas existe na resistência a possibilidade de pressionar o governo e se mostraram capazes de construir leis, de influenciar o plano diretor, ou de conseguir jurisprudências que impeçam a mineração.”
6: Disputa de narrativas e argumentos
“Dizer em alto e bom som o por que do ‘não à mineração’. É muito interessante perceber que por trás da faixa que diz ‘não à mineração’ existe um monte de ‘sins’. É um sim à agricultura familiar, às nascentes e cursos dágua, um sim ao turismo ecológico, um sim à nossa biodiversidade enquanto país. É preciso apresentar para a população essas proposições afirmativas. Essa é uma chave poderosa!”
7: Mostrar que há outras alternativas
“E o mais importante de todos os acertos: é anunciar que existem outras possibilidades. A mineração é evitável, e ainda é uma das opções que talvez gerem menos riqueza. Como a agricultura familiar e agroecológica, as formas de vida dos povos e comunidades tradicionais, o turismo ecológico, e destaco o papel desse povo que resiste e que é guardião das nossas matas, das nossas águas, dos nossos alimentos”.
Edição: Elis Almeida