A possibilidade de transferência de unidades da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig) para a iniciativa privada tem movimentado setores de defesa da saúde pública que denunciam a natureza mercadológica da proposta. Ainda sem nenhum projeto concreto apresentado, representantes do governo Romeu Zema (Novo) admitem a intenção de repassar a gestão de hospitais para as chamadas Organizações Sociais (OSs). O Conselho Estadual de Saúde (CES-MG) deverá deliberar sobre a proposta, já que pela legislação é responsável pela aprovação de políticas públicas na área.
Denúncias sobre negação de atendimento à população e desvio de recursos públicos são acumuladas por OSs em todo o país. Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) já foram instauradas em São Paulo, Goiás e Mato Grosso, além de outros estados, com ações judiciais por causa de irregularidades, como Tocantins, Paraíba e Amazonas e inclusive Uberlândia, no Triângulo Mineiro.
São Paulo foi o primeiro estado a aderir à lei e após dez anos de implementação enfrenta graves problemas nos hospitais administrados pelo terceiro setor. “A situação é de total endividamento. As OSs detêm 25% da receita do estado, e mesmo assim o sucateamento da saúde é enorme. Mais da metade dos profissionais da saúde são contratados pelas OSs, fato que acaba extinguindo os concursos públicos. Dos 46 hospitais gerenciados pelas organizações, 19 estão endividados, contabilizando um total de mais de R$ 72 bilhões de dívida para o estado”, exemplificou Mauri Bezerra, diretor do Sind-Saúde/SP.
Ele também alerta para os atendimentos negados quando o hospital atinge a meta estabelecida no contrato. “Há uma grande variação entre os índices de cumprimento de metas, caracterizando falta de planejamento. Se determinado hospital bate a meta de serviços, ou até mesmo só por desorganização acham que bateram, pacientes são encaminhados para outros locais, muitas vezes bem longe de seu bairro, de sua residência”, complementou Mauri Bezerra.
Para a diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores de Minas (Sind-Saúde/MG) Neuza Freitas, a proposta é de privatização. “A Organização Social é uma privatização, não tem outro nome. Se já temos exemplos de outros estados onde a experiência não funcionou, imagine em uma fundação que é a maior da América Latina, composta por 21 unidades hospitalares, além da sede administrativa”, questiona.
O que diz o governo
A justificativa do governo de Minas Gerais não se diferencia do de São Paulo e de outros estados e cidades que implementaram a lei. Segundo a Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag), o que motiva o Estado a terceirizar o gerenciamento da Fhemig são as “amarras burocráticas que dificultam e impedem o funcionamento de qualidade das instituições de administrações diretas”.
Entre a série de propostas apresentadas, uma delas é a de criação de uma comissão para o monitoramento e fiscalização dos contratos das OSs, instâncias que também foram criadas em muitas cidades, e ainda assim acumularam denúncias e condenações por fraudes, a exemplo de São Paulo.
Segundo o secretário do Conselho Estadual de Saúde (CES-MG) Renato Barros, problemas não faltam no modelo de gestão proposto: atendimento precário, fraude no cumprimento de metas, contratação de profissionais de forma irregular, diretores favorecidos com contratação de empresas, desvio de finalidade dos repasses financeiros, falta de medicamentos e equipamentos, redução de atendimentos e internações e muitos outros.
“A implementação da lei, se levada adiante, pode significar, por exemplo, o desmonte do Sistema Único de Saúde. O SUS busca a padronização do sistema, enquanto o modelo de administração da OS leva à fragmentação”, afirma.
Na próxima segunda (14), vai acontecer a reunião do Conselho Estadual de Saúde, que deve deliberar sobre a proposta na Fhemig. A reunião é aberta e será na Assembleia Legislativa, às 9 horas.
Segundo o vice-presidente do Conselho Estadual de Saúde (CES-MG) Ederson Alves da Silva, o governo deve acatar a decisão dos conselheiros. “Já nos posicionamos contrários há uns anos e mantemos o posicionamento. Em nossa última Conferência Estadual de Saúde também foi deliberado pela não aprovação de parcerias público-privado na Fhemig”, relembra Ederson.
Edição: Joana Tavares