A Samarco, empresa controlada pela Vale e pela BHP Billiton, voltará a operar no Complexo de Germano, localizado em Mariana (MG). A autorização foi concedida no último dia 25 pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), em votação concluída com 10 votos a favor, um voto contrário, do Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc-CBH), e uma abstenção. Em nota, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) afirmou que a “retomada das atividades não é automática e que são necessárias obras que levarão cerca de 15 meses”.
A atividade da mineradora ficou suspensa desde o rompimento da barragem de Fundão, que completa quatro anos neste 5 de novembro. O crime despejou 48 milhões de metros cúbicos de lama tóxica no Rio Doce, atingindo 43 municípios, matando 19 pessoas e provocando um aborto. Até hoje, atingidos denunciam a negligência da empresa, cobram por indenizações justas e reivindicam a construção de novas casas.
“O ideal era ter cassado a concessão da Samarco frente ao crime que ela cometeu e também por sua incompetência em não ter garantido a reparação dos atingidos até hoje. Não se trata somente de questões ambientais, de regularidade do processo produtivo, mas de toda a postura da empresa que mostra que não vai resolver o problema criado”, afirma Joceli Andrioli, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). Segundo ele, ainda existem milhares de famílias atingidas ao longo da bacia que não foram cadastradas e a situação dos indígenas, quilombolas e pescadores está “caótica”.
A Samarco afirma que as operações serão retomadas utilizando novas tecnologias para o empilhamento de rejeitos a seco, que diminuiria o risco de acidentes. No entanto, como aponta Tatiana Ribeiro Souza, professora da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), a preocupação da mineradora deveria ser com o rejeito que já foi produzido e que está espalhado na bacia do Rio Doce.
“É surpreendente que uma mineradora que não tomou as medidas preventivas para que não ocorresse o rompimento da barragem, não tomou as medidas necessárias para reparar os danos causados, tenha de novo a autorização do Estado para operar, quando ela deu todas as demonstrações que não atua com responsabilidade ambiental e nem social”, critica. A mineradora diz que, até agosto de 2019, foram alocados cerca de R$ 6,68 bilhões para medidas de reparação e compensação.
Dependência da mineração
“As vantagens que são apresentadas com a retomada da operação da mineradora, que é a geração de recurso para o município, deveria ser medida reparatória pelo dano que ela causou. Ou seja, ela deveria gerar esse recurso para os municípios atingidos sem estar operando de novo”, analisa Tatiana. Para ela, os rompimentos de barragens ocorridos em Mariana e em Brumadinho deveriam inspirar um novo modelo de mineração no país, que envolva a diminuição da dependência econômica que os municípios possuem da atividade minerária.
Atualmente, de acordo com a legislação, os municípios recebem uma Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem), que são os royalties pagos para que mineradoras possam explorar as reservas minerais. De uma forma geral, a mineração ameaça as economias tradicionais e, muitas vezes, se torna a única fonte de renda para a população, aumentando assim a dependência financeira dos municípios em relação as empresas.
Lucro com o crime
A Vale, que junto com a BHP Billiton controlam a Samarco, é responsável pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), em janeiro deste ano. A barragem tinha 60 metros de altura e despejou cerca de 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, deixando 252 mortos, 18 desaparecidos e milhares de atingidos ao longo da Bacia do Rio Paraopeba.
No último dia 24, a mineradora divulgou seu resultado financeiro do terceiro trimestre, julho a setembro, deste ano. De acordo com o relatório, a Vale fechou o período com um lucro de US$ 1,6 bilhões (R$ 6,5 bilhões) e um aumento de 20,2% da extração de minério de ferro, na comparação com o trimestre anterior.
Em nota, o MAB afirmou que o balanço da empresa demonstra que o “o lucro está acima da vida”, criticou a lentidão da Justiça e a negligência na reparação aos atingidos. “O criminoso controla o cenário do crime, as vítimas, enquanto a Justiça lenta segue garantindo a impunidade”, diz o texto.
Edição: Joana Tavares