Na Audiência Pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, realizada no dia 16 de dezembro de 2019, foram debatidos os problemas e as ilegalidades do projeto da mineradora de capital Chinês Sul Americana de Metais – SAM, apoiada pelo governo de Romeu Zema (Novo).
No debate, ficou claro que há três manobras para a implantação do projeto da SAM:
1) Política. Em setembro de 2019, na sede da Sociedade Rural em Montes Claros, o governador assinou um protocolo de intenções com a SAM. Nas palavras do documento, o governo objetiva a “conjugação de esforços do Estado”, concedendo “benefícios” para “viabilizar a implantação do Projeto Bloco 8” - da SAM. Dentre outros benefícios, o Governo Zema comprometeu-se com a:
- aprovar a licença prévia até o mês de fevereiro de 2020 (para isso a SUPPRI e a SEDESE vêm atropelando as etapas do processo) e licença de instalação até seis meses após a solicitação da SAM;
- concessão de todos as Declarações de Utilidade Pública (DUP) e de interesse social para uso da área do projeto para fins de servidão, ou de desapropriação. Ainda, a secretaria irá fornecer o parecer técnico das DUP em até 90 dias após o pedido. Ou seja, a “sustentação jurídica” para o despejo forçado;
- diferir o ICMS nas importações e aquisições internas, entre outras. Isso certamente reduzirá a carga tributária de várias operações da SAM;
- por intermédio da Agência de Promoção de Investimento e Comércio Exterior de Minas Gerais (INDI), o Governo Zema se “compromete prestar apoio e assistência à SAM durante as fases de implantação e operação do projeto” (grifos tirados do protocolo de intenções).
2) fracionamento do licenciamento ambiental. A empresa SAM fez uma manobra para facilitar a aprovação do licenciamento ambiental, fragmentando o projeto com dois licenciamentos: o complexo minerário (através da SUPPRI/SEMAD) e o mineroduto (através do IBAMA). O MPF e o MPE de forma conjunta, moveram uma Ação Civil Pública contra o processo de licenciamento, focando na ilegalidade da fragmentação. Para o fracionamento a SAM “criou” uma empresa com o nome de Lotus para construir o mineroduto, cuja a SAM é sócia, escancarando de vez a estratégia. A manobra da SAM foi armada pois o IBAMA, em 2016, indeferiu o processo considerando o Projeto da SAM inviável ambientalmente.
3) projeto camaleão. Desde 2010 o projeto se arrasta e tem várias versões. A população não tem informações confiáveis sobre qual o desenho do projeto. A água para a mineradora será captada da hidroelétrica de Irapé? Será construída uma barragem no rio Vacarias, que hoje está praticamente seco? Serão destruídas 70 ou 30 nascentes? Será construído um muro de contenções no caso de rompimento barragem que não está previsto no EIA? Ninguém sabe ao certo qual será o projeto, e a SAM usa isso para cooptar as comunidades e poder público local, como também para facilitar o licenciamento.
Os dados do projeto são assustadores: rejeito acumulado em mais de 1,2 bilhões de m3 (Fundão tinha 54 m3); consumo de água maior que 50 milhões de m3 por ano; mineroduto de 478 km em região semiárida; 11 comunidades tradicionais atingidas diretamente pela área do complexo minerário; destruição de mais de 70 nascentes e rebaixamento do lençol freático.
As comunidades tradicionais Geraizeiras participaram da audiência, trazendo o grito dos povos, que se posicionaram de forma clara contra o empreendimento, que o chamam de “projeto de morte”. Ainda os povos Geraizeiros e suas organizações lançaram a campanha “Mineração Aqui Não! Pelos Povos e Águas do Semiárido!”.
A fala dos representantes dos movimentos e organizações (MAM, MAB, FETAEMG, CPT e Movimento Geraizeiro) trouxeram também os crimes cometidos pela Vale em Mariana e Brumadinho. Eles estão indignados com a exportação do modelo minerário da região central do Estado de Minas para outras regiões, ainda mais na região do semiárido, o que causará impactos catastróficos.
Os requerimentos da Audiência Pública apontam para a suspensão do licenciamento e a anulação do protocolo de intenções, justificando a quebra da moralidade administrativa e do princípio da legalidade.
* Alexandre Gonçalves é agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Edição: Joana Tavares