“Vale assassina!” Com essas palavras, atingidos por barragens das bacias do Rio Doce e Rio Paraobepa iniciaram, nesta segunda-feira (20), uma marcha nacional de 300 quilômetros, partindo de Belo Horizonte rumo a Brumadinho (MG). O ato de lançamento iniciou na Praça do Papa, seguindo pela avenida Afonso Pena e terminou às portas da sede do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), na capital mineira.
“Que o tribunal apure e puna os responsáveis pelo crime em Brumadinho e também em Mariana. Também vamos questionar no Tribunal os projetos que ameaçam de morte outras comunidades”, denunciou Joceli Andrioli, da direção do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Durante seis dias, os manifestantes percorrerão cidades da Região Metropolitana de BH para protestar contra os crimes da mineradora. A marcha também conta com a participação de atingidos por barragens de 15 países dos continentes americano e europeu.
“Um dos objetivos é pedir que os órgãos responsáveis não parem as buscas. Temos 272 vítimas em Brumadinho, 20 em Mariana, mas ainda faltam encontrar, como dizem as famílias, 11 joias nesse processo das buscas para que possam ter um enterro decente. Além disso, exigimos que se realize o que já foi definido nas negociações, a assessoria técnica, indenização justa e reparação dos direitos que foram violados”, afirma Soniamara Maranho, da direção nacional do MAB, que organiza a manifestação.
A liderança também ressalta que, embora a Vale tenha fechado o ano de 2019 com lucro líquido de R$ 25 bilhões e um repasse de R$ 7,25 bilhões em dividendos aos acionistas, os atingidos permanecem sem reparação. “A Vale continua tendo lucros extraordinários, mas mantém sua dívida histórica com os atingidos por barragens em Minas Gerais”, critica.
Reconhecimento
Michelle Regina de Paula mora em Betim, a 100 metros do Rio Paraopeba. Ela perdeu uma prima, funcionária da Vale, soterrada pela lama da barragem da mina em Córrego do Feijão, em Brumadinho. “Os pais e irmãos da minha prima passam por atendimento psicológico, a família convive com esse trauma, ela deixou duas filhas. Além disso, a vida que a gente leva é problema com a água, o que dá no quintal a gente não pode comer, nem uma fruta a gente pode comer. Então, eu tive que aceitar a morte da minha prima e aprender a lutar pelos meus filhos”, conta a moradora.
Michelle relata a dificuldade de ser reconhecida como atingida pela Vale: “eles consideram que nós, que moramos em Betim, no leito do rio, somos oportunistas. E não somos. O rio está lá, quem o matou foi uma empresa. Se ela não lembra dos funcionários dela, vai lembra do resto?”.
O reconhecimento negado pela empresa, segundo ela, veio por meio do movimento popular. “O MAB foi um divisor de águas. Sabíamos que tínhamos direitos, por causa do rio, mas não sabíamos como fazer. Se não fosse o MAB, a gente estava lá quietinho e a Vale ia fazer o que quisesse”, conclui.
Atualmente, populações nas cidades de Nova Lima, Barão de Cocais, Congonhas, Paracatu e Macacos vivem sob barragens que estão sob risco de rompimento. “O pessoal já não dorme mais à noite, vive sob stress, com todos os problemas que acometem a população”, denuncia Joceli Andrioli.
Ainda nesta segunda, os atingidos passaram pelo prédio da Agência Nacional de Mineração e depois partem em direção a Pompéu (MG), onde acontecem atividades na terça-feira (21). Depois, seguem por Juatuba, Betim, São Joaquim de Bicas e Pará de Minas, até chegar a Brumadinho no dia 25. Nesses locais, o movimento debate os direitos dos atingidos, a segurança, a contaminação da água e a saúde em um grande seminário internacional.
Ato final
Na próxima sexta-feira (24), a Frente Brasil Popular realiza um ato que marca o um ano do crime da Vale, com a presença do ex-presidente Lula, em Citrolândia Betim (MG). No sábado, 25, data de aniversário do crime, acontece a 1ª Romaria pela Ecologia Integral em Brumadinho, organizada pela Arquidiocese de Belo Horizonte. Dentre as atividades previstas terá o lançamento do livro do bispo dom Vicente Ferreira, Brumadinho: 25 é todo dia.
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Edição: Elis Almeida