Quatro projetos de produção audiovisual, com temática LGBT, foram censurados pelo governo de Jair Bolsonaro. Na última semana, foi divulgado o resultado do edital público com linhas de financiamento de séries para TV em que os projetos “Afronte”, “Transversais”, “Religare queer” e "Sexo reverso" não foram contemplados. O que é estranho, segundo o roteirista de “Religare queer”, Kiko Goifman, são os projetos terem sido citados pelo presidente em uma transmissão ao vivo, em agosto do ano passado.
“Quando a gente foi atacado pelo presidente, tivemos acesso à nossa pontuação. A gente não tinha a menor ideia que éramos projetos tão bem pontuados. É uma questão técnica. Os pareceres sobre os nossos projetos foram maravilhosos. O que eu coloco como censura é que virou questão de honra [para o governo] que nossos projetos não ganhassem” denuncia. “Religare Queer” era um dos finalistas, cuja nota, de acordo com o roteirista, era de 19,5 em um total de 20 pontos.
Na transmissão ao vivo, Bolsonaro cita os projetos e faz comentário do tipo “conseguimos abortar essa missão”, em referência à sinopse de “Transversais”, que conta a história de cinco pessoas transgêneros que moram em diferentes cidades do Ceará. “Mais um filme que foi para o saco”, disse o presidente sobre “Afronte”, produção que se debruça sobre a realidade vivida por negros homossexuais no Distrito Federal. Todas as quatro obras citadas eram finalistas no edital, aberto em 2018.
“Religare Queer”, da diretora Claudia Priscilla e consultoria da Laerte Coutinho, trata do universo de pessoas LGBTs e suas religiosidades. Reúne histórias e personagens que se intercruzam. “A gente foi chamado de pornografia pelo presidente, o que é uma coisa absurda, porque esse projeto beira à delicadeza e o lirismo”, comenta o roteirista.
Após o “garimpo na Ancine”, em termos do próprio presidente, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, chegou a suspender o edital, mas foi impedido por uma decisão judicial, que concluiu a existência de discriminação por parte do governo contra projetos com temas relacionados a lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis.
Bixa Travesty
Kiko Goifman e Claudia Priscilla também assinam o documentário Bixa Travesty, em cartaz nos cinemas do Brasil. A produção acompanha a cantora transexual negra Linn da Quebrada, que apresenta seu corpo político, na esfera pública e privada, como ferramenta de luta pela desconstrução de estereótipos de gênero, classe e raça.
“De alguma forma, a gente houve a identificação de pessoas trans que assistem ao filme, que se sentem mais fortes e que sentem algum prazer em sair de casa mesmo sabendo que os índices de morte no Brasil são terríveis, principalmente de mulheres trans”, comenta Kiko sobre o sucesso do filme.
Bixa Travesty circulou em vários festivais pelo mundo, foi apresentado no festival de Berlim 2018 e vencedor do prêmio Teddy, dedicado a obras com temática LGBTQIA+. A obra também foi premiada nos festivais de Toronto, Barcelona, Brasília e no Mix Brasil. Em Belo Horizonte, está em cartaz no Cinema Belas Artes, na rua Gonçalves Dias, 1.581, no bairro Lourdes.
Edição: Elis Almeida