Em meio à pandemia do Coronavírus, o governador Romeu Zema (Novo) voltou a defender, nesta terça-feira (7), a adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) do governo federal, a venda da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), reformas administrativa e previdenciária, entre outras medidas.
Com a crise sanitária, a economia mineira, que já enfrentava uma profunda crise ao longo da década, deve sofrer forte retração neste ano. Um estudo publicado pela Fundação João Pinheiro nesta semana, apontou como melhor cenário possível, com a pandemia durando até 15 de junho, uma contração de 2,3 % no PIB mineiro. No pior cenário levantado, com duração até 15 de agosto, o PIB estadual deve recuar 3,9% em 2020.
Pelas estimativas da Fundação João Pinheiro (FJP), os setores mais afetados devem ser o comércio (possível retração 5,1% e 8,7%), a construção civil (de 5,1% a 8,6%) e a indústria de transformação (entre 3,3% e 5,8%). A arrecadação tributária também tende a cair. De acordo com o governo de Minas, R$ 7,5 bilhões deixarão de ser arrecadados em Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O déficit das contas públicas, segundo o governo, deve superar o previsto na Lei Orçamentária Anual, que era de R$ 13,3 bilhões.
Mais Estado é necessário
A propagação do novo coronavírus gera adoecimento em massa e exige isolamento, levando à paralisação das atividades. Governos de diferentes países e unidades federativas respondem a esse quadro aumentando os investimentos. Isto tende a gerar incremento da dívida pública, já que as receitas não estão aumentando. Porém, o endividamento na crise pode funcionar como uma ferramenta para mitigar os efeitos da pandemia e impulsionar recuperação econômica.
“Em todo o mundo, governos terão problemas com o aumento da dívida pública. Ora, se esse aumento possibilitar crescimento econômico, o crescimento econômico vai gerar aumento subsequente das receitas tributárias, fazendo com que a relação dívida/PIB, no futuro, possa não ser tão grande quanto no presente”, explica o economista Frederico Jayme Júnior, integrante do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG.
Ele ressalta que, na economia mineira, o quadro é agravado pela significativa dependência quanto à exportação de produtos primários e intensivos em recursos naturais, como o café, minério de ferro, ferro-gusa, aço e ferroligas. Por essa razão, o estado, que é o terceiro maior exportador do país, costuma sofrer além do normal. “Minas Gerais hoje é um estado pouco diversificado em termos de seu parque industrial, o que o torna muito dependente da demanda internacional, principalmente”, comenta.
Um dos maiores compradores de commodities mineiras é a China, território, onde inicialmente a epidemia se manifestou. No primeiro bimestre de 2020, a produção industrial chinesa recuou 13,5%, em comparação com o mesmo período de 2019. A taxa de investimentos despencou 24,5% e as vendas no varejo tiveram queda de 20,5%. Ao mesmo tempo, as exportações mineiras para o gigante asiático recuaram 26,8%. A importação de insumos também diminuiu nesse período, embora isso não seja necessariamente causado pela desaceleração da China, mas também esteja relacionado a outros fatores, como a desvalorização do câmbio.
Para o economista Frederico Jayme, o enfrentamento à crise nos estados requer a participação do governo federal. “Ou bem o governo se organiza para um arranjo federativo capaz de diminuir os impactos dessa pandemia ou a situação vai ser muito grave. Não adianta o governo federal manter uma política radicalizada, principalmente com relação à dívida dos estados”, defende.
Zema na contramão
Em Minas Gerais, 190 organizações lançaram um documento cobrando do governo de Minas políticas robustas de fortalecimento da saúde pública, proteção aos trabalhadores e recuperação da economia, entre outras. “As medidas até agora anunciadas são insuficientes para garantia da vida dos mais pobres. Bolsonaro e Zema postergam iniciativas que são urgentes para salvar vidas, gerando assim pressão pela flexibilização do isolamento social o que traria graves consequências”, afirma o texto.
Acusado de não apresentar nenhum plano para mitigar os efeitos da crise econômica, o governo Zema faz da pandemia mais uma oportunidade para defender a adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal. “Já enviamos para a Assembleia Legislativa o pedido de adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal e a privatização da Codemig. Em breve, vamos enviar as reformas da previdência e administrativa”, afirmou o governador.
O Regime de Recuperação Fiscal (Lei Complementar 159/2017) prevê que os estados participantes terão sua dívida com a União suspensa por três anos, prorrogáveis por mais três. Depois, voltam a pagar a dívida com encargos financeiros. Para aderir, seria preciso cumprir 20 exigências, entre as quais a privatização de estatais como a Cemig e a Copasa, a retirada de direitos dos funcionários públicos e a submissão do Estado de Minas Gerais a um conselho supervisor da União, custeado com recursos estaduais. Há dois anos e meio, o Rio de Janeiro foi o primeiro e único a aderir ao Regime. Só no último ano, a dívida consolidada do estado fluminense saltou de R$ 155 bilhões para R$ 167 bilhões.
O presidente da Central Única dos Trabalhadores de Minas (CUT), Jairo Nogueira Filho, critica a postura do governador de Minas. “Ele está aproveitando o momento para colocar o que ele queria desde o início. Temos empresas como Cemig, que teve no ano passado um lucro de quase R$ 3 bi, e a Copasa, que teve lucro de quase R$ 800 milhões. Essas empresas têm dinheiro em caixa e poderíamos estar discutindo isenção das contas de água e luz para as pessoas que precisam e geração de renda. Mas o governo está pensando o contrário, em tirar ainda mais a participação do Estado, privatizar algumas coisas. O Regime de Recuperação Fiscal é isso”, argumenta.
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Edição: Elis Almeida