"Se Zema combatesse a sonegação e reduzisse os privilégios fiscais para grandes empresas, o auxílio emergencial poderia ser muito superior a R$ 39". A avaliação é do auditor fiscal Lindolfo de Castro, ex-diretor do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais (Sindifisco-MG).
Entenda
Na última semana, o Governo de Minas anunciou o programa Renda Minas, que prevê um auxílio emergencial de R$ 39 mensais para cada pessoa enquadrada no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) como em situação de extrema pobreza, no qual o valor da renda per capita mensal da família é de até R$ 89.
Pessoas diferentes da mesma família, desde que contempladas pela regra, podem receber os R$ 39. De acordo com o governo, serão repassados ao projeto R$ 346 milhões, e cada grupo familiar pode pleitear uma média de R$ 117 por mês.
Observando os aumentos provocados pela inflação na cesta de consumo básica dos brasileiros, R$ 39,00 claramente se torna insignificante
A quantia será distribuída em até três parcelas, pagas de outubro até dezembro, "dependendo da disponibilidade orçamentária" do Estado, como informou o Executivo mineiro em decreto. O recebimento do auxílio emergencial do governo federal - que passou de R$ 600 para R$ 300 - não impede o recebimento do Renda Minas.
“Não dá para comprar arroz”
A verba de R$ 39 gerou críticas nas redes sociais. Muitos usuários ironizam que o dinheiro não daria para comprar um pacote de arroz, que neste ano já acumula uma alta de 19%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Caixa do Estado
Segundo cálculos da Defensoria Pública do Estado e da Secretaria de Estado de Fazenda, previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias de Minas Gerais, o valor destinado em 2020 para as renúncias fiscais é de aproximadamente R$ 14,8 bilhões. Já a estimativa de 2021 é que a verba seja de R$ 15,7 bilhões, como mostra a tabela abaixo:
" O governo mineiro concede em torno de R$ 14 bilhões de benefícios fiscais por ano para grandes empresas, para empresários que vão engrossar os lucros, e para quem necessita dá R$ 39. Se ele enfrentasse o poder econômico, poderia não só melhorar esse valor, como resolver o problema das finanças do Estado. Existem condições de buscar uma solução pela receita”, declara o auditor que cita, ainda, o imbróglio da Lei Kandir.
Esse é o tipo de política do governo Zema: por um lado perdoa a União, por outro concede um auxílio miserável
"Além de tudo existe essa negociação desastrada, na qual o governo de Minas deu um perdão para a dívida da União de mais de R$ 100 bilhões. Esse é o tipo de política do governo Zema: por um lado perdoa a União, por outro concede um auxílio miserável", avalia Lindolfo Fernandes.
Auxílio fere a dignidade e não acompanha a inflação, aponta economista
Carolina Rocha, vice-presidenta do Sindicato dos Economistas de Minas Gerais e mestranda em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal), reflete se as estratégias governamentais são eficazes para reduzir os impactos da crise na vida da população mineira.
Ela pondera que o valor de R$ 39 pode ser um complemento ao auxílio emergencial aprovado pela Câmara dos Deputados, o que eleva a renda mensal, mas exemplifica que mesmo assim o valor não acompanha a inflação.
A medida governamental contradiz o quesito principal que é a garantia da dignidade, uma vez que este valor não é capaz de cobrir nem mesmo a alimentação
"O PIB [Produto Interno Bruno] para o segundo trimestre de 2020 caiu 9,7% em relação ao trimestre imediatamente anterior. Sob a ótica da demanda, a Formação Bruta de Capital Fixo contribuiu com -15,4%, o consumo das famílias com -12,5% e o consumo do governo com -8,8%. Por outro lado, variação da inflação no Brasil para o mês de agosto foi de +0,24%. Desta variação, o grupo de alimentação e bebidas foi um dos maiores, com percentual de +0,78%, habitação +0,36%, transportes +0,82% e saúde 0,50%”.
Carolina explica que essa inflação se trata de uma oferta causada por aumentos nos custos de bens e serviços e que o crescimento dos preços impacta em maior intensidade justamente as famílias de menor renda. “Observando os aumentos provocados pela inflação na cesta de consumo básica dos brasileiros, R$ 39,00 claramente se torna insignificante”, diz.
Contexto brasileiro e mineiro
Ainda segundo a economista, se pensarmos nas tentativas de ajustes das contas públicas por meio de reformas e corte de investimentos, a renda se tornaria mais irrisória.
“A medida governamental contradiz o quesito principal que é a garantia da dignidade, uma vez que este valor não é capaz de cobrir nem mesmo a alimentação das pessoas. Até mesmo se considerarmos o fato de que este valor servirá como complemento, não seria o suficiente para garantir o básico. Muitas famílias vivem de aluguel, possuem filhos, estão desempregadas e não têm outro caminho a seguir senão aceitar o que o governo tem a oferecer”, complementa.
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Edição: Elis Almeida