Em toda sua vida, nunca havia entrado numa casa tão grande, rica e cafona
Desempregado e falido. Andava pela rua largado e fodido. Assim, encontrava-se Ribeiro Prata. Sem dinheiro para tomar café até na pior espelunca caída do centro velho.
Estava tão fodido que seu único terno sabia de cor o caminho do bairro Bonfim, no centro de Belo Horizonte. A magreza também espantava os espelhos dos shoppings.
Vivia fugido do dono dos quartos em que morava de aluguel no fundo da casa. Estava matando cachorro a grito e jacaré a beliscão.
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Numa tarde em que a fome era amiga das mais íntimas e seu sapato parecia ter vindo de uma 3° guerra mundial, seus olhos estavam embargados de tão tristes e sem esperança no futuro, eis que a fada madrinha lhe dá o ar da graça. Avistou um garoto com um panfleto que dizia: precisa-se de um professor de xavequês. Caramba! Taí minha sorte! Isso é minha praia!
Não deve haver um professor melhor que eu nessa matéria. Foi até a biblioteca pública pesquisar sobre o país do xaveco e a sua língua. Descobriu que esse país foi invadido pelos portugueses no século XV e teve dizimada toda a sua população nativa.
Comprou um cartão telefônico e ligou para a residência da pessoa que pedia pelo tal professor de xavequês.
- Alô, alô... aqui é Ribeiro Prata, o professor de xavequês. Pois, não!
- O senhor pode vir na sexta?
- Qual é o endereço?
- Fica na Pampulha. Você conhece? Aquela lagoa grande.
- Sim. Conheço.
Ele pensou: vou ter que andar a pé toda a Avenida Antônio Carlos. Será uns 15 quilômetros de viação canelinha. Como diz a molecada: Vou de Coluna Prestes. Mas tá de boa!
Chegou no dia marcado suadíssimo, ofegante e com uma fome de leão. Logo, admirou o tamanho da casa. Em toda sua vida, nunca havia entrado numa casa tão grande, rica e cafona.
Era uma casa bem grande, com 15 carros na garagem, seguranças, cachorros enormes e um jardim que parecia do Éden.
Os seguranças deram uma geral daquelas nele. Tá armado aí, vagabundo? Ou, sou professor, meu chapa! Ele ficou puto e ainda esperou por quase duas horas. Tem algo para comer aí, zé? Aqui não é boteco, porra! Ribeiro Prata ficou azul de raiva!
Veio um velho daqueles parecidos com Dom Pedro II. A roupa fedia naftalina misturada com phebo.
Perguntou o velho:
- Tu és bom em xavequês?
- Sim. Sou o melhor.
- Onde aprendeu?
- Na televisão. Nas novelas. Nas revistas.
- Certo. Com os parças da faculdade de direito.
O velho calou-se e chamou seu filho. Um juiz recém-formado.
- Esse será seu aluno. Ele precisa aprender o xavequês para a gente dar um golpe aí no país do xaveco. Lá tem bastante ouro e prata. Beleza. Começa quando?
- Amanhã.
O velho ficou animado. O curso foi um sucesso. O garoto aprendeu rápido. Deram o golpe. Ribeiro Prata ficou bem na fita. Todo dia almoça no centro o prato do dia. Tomava todas também.
Mas observou um amigo:
- Ribeiro, fala uma coisa aqui pra nós?
- O quê?
- Tens certeza que ensinou tudo certo a esse jovem juiz?
Deu uma risada, e disse:
- Claro que não!
- Tô vendo!
- Está dando tudo errado.
- Você é fantástico - disse o amigo!
- Você ainda não viu foi nada, meu amigo!
- Ainda o povo não há de passar fome mais no país do xaveco. Vai haver uma rebelião.
Você ensina tudo, menos o pulo do gato!
Rubinho Giaquinto é covereador da Coletiva em Belo Horizonte.
Edição: Rafaella Dotta