Falta-nos ar em todos os sentidos. A nossa esperança segue um fiozinho fino, quase linear, se agarra na imaterialidade. Há uma memória do antes. Do que era força. Do que era encontro. Alegria. Dos corpos suados. Da roda do beijo. Samba. Pretos e pretas se amando. Multidão. Da alegria de termos descoberto a tecnologia do pré-sal e o próprio pré-sal. Da universidade no interior. Do salário mínimo e de poder comer carne de boi todo dia. Minha casa minha vida.
Um cansaço do limite que esse tempo pandêmico impõe à rotina. Impõe aos sonhos. Essa obrigação de viver com a mesmice. Estamos à flor da pele. Uma luta para não naturalizar toda essa desgraça cotidiana.
Há mais de um ano o mundo vive os efeitos da pandemia do novo coronavírus. No Brasil tivemos o alento de conseguir viver a alegria do carnaval de 2020. Sem aqueles dias de anestesia carnavalesca os impactos do isolamento social e da crise econômica, social, ambiental e política que assola o país teriam sido ainda mais nefastos para a nossa saúde mental, gravada ainda mais diante da política de morte do governo bosonarista.
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Sem nenhum planejamento ou política de contenção da doença, Bolsonaro e aqueles que o elegeram carregam consigo a responsabilidade da morte de mais 260 mil pessoas. O Brasil é considerado pelos órgãos mundiais de controle da pandemia um dos piores países no combate ao vírus.
O Congresso Nacional segue omisso e pactuando com toda essa desumanidade, cumprindo a rigor a agenda neoliberal imposta pós-golpe de 2016, com o esvaziamento das políticas públicas, assim como o sucateamento das empresas estatais com a intenção de privatizá-las a custo pífio.
Os estados brasileiros estão em colapso e o presidente diz em entrevista para que se deixe de “mimimi”. Existem várias teorias sobre quem é o presidente, algumas questionam a saúde mental do mesmo, mas o fato é que o seu projeto de morte segue em curso devastando vidas, etnias, crianças, jovens, mulheres, homens, famílias inteiras. E tudo isso protegido e sustentado pelo Congresso Nacional e pelo Judiciário.
Não se pode admitir que o país perca ao dia mais de 1800 vidas humanas já tendo a vacina e, com toda eficiência que temos no SUS, considerado o melhor sistema de saúde do mundo.
Elite acostumada a banalização da morte
É fato que a elite brasileira está acostumada a banalizar a vida, afinal foram 400 anos de escravidão, de um holocausto diaspórico sem precedentes, inclusive institucionalizado e reproduzido por um Estado entreguista, tal qual o da atualidade.
Percebe-se o quanto o Congresso Nacional também tem descaso pela vida humana, vide o fato que mesmo o país atravessando uma crise econômica, além da sanitária, com milhares de pessoas passando fome com a carestia do custo de vida, querem atrelar a política emergencial à redução das verbas que vão para educação e para saúde, não bastando o sucateamento feito com a estipulação do Teto dos Gastos.
Passa-se longe desses espaços pouco representativos alguma espécie de ética, alias a inoperância do Conselho de Ética do Congresso Nacional é lastimável diante de vários casos de quebra de decoro parlamentar. Porém o que é incompreensível no atual legislativo nacional brasileiro é mais de 62 protocolos de impeachment contra Bolsonaro, cujo silêncio imoral do antigo e atual presidente da Câmara é vergonhoso.
Congresso Nacional segue omisso e pactuando com toda desumanidade
E para completar temos o BBB que, assim como a bancada da bala, do boi e da bíblia, nos entorpece e distorce a realidade que vivemos nestes tempos pandêmicos. Elimina-se a participante com 99,17, mas nem de longe se cria algum constrangimento em ter o presidente-morte sem nenhum tipo de penalidade pelo descaso com a saúde do país. Enquanto isso devemos seguir como diz o poeta Gonzaguinha na letra de Comportamento Geral de 1973, “agradecidos pela xepa da feira, orando pelo bem do patrão e esquecer que estamos desempregados”.
Por fim, pode ser que o retardamento na aplicação das vacinas seja a covardia dessa elite perversa de não querer a volta do povo organizado as ruas, seja como for, seguimos juntas e juntos no propósito do auto-cuidado e do cuidado coletivo, reforçando o uso de álcool em gel, da mascara e do distanciamento e isolamento social. Lutar para seguir vivas!
Andreia Roseno - Makota Kinanjenu – é assistente social, conselheira do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial da Cidade de Belo Horizonte (COMPIR) e integrante da Rede de Mulheres Negras de Minas Gerais
Edição: Elis Almeida