Minas Gerais

Coluna

Caboclo Presidente

Imagem de perfil do Colunistaesd
Naquele dia foi a mesma coisa: sair atrás de comida e um pouco de afeto - Créditos da foto: Reprodução
Livro pra comida e prato pra a educação

Naquele dia foi a mesma coisa: sair atrás de comida e um pouco de afeto. Não entendia muito bem como a vida funcionava, discriminação por causa da sua classe social e da sua cor. Era o mais novo de uma família de quinze irmãos. Sua mãe morreu no parto. Seu pai morreu jogado num hospital sem atendimento por causa do novo coronavírus.

No tempo certo, o ódio foi crescendo dentro dele. Aos dezesseis anos, já era o bicho! Dos quinze irmãos, mais da metade morreu antes de completar um ano de idade. As atrocidades eram quase que natural para ele.

A vida não foi muito generosa. Sua feiura era motivo de chacota nas ruas onde morava. Ele ouvia tudo isso calado. Aliás, quase não falava. Nunca entrou numa escola. Seu dia a dia era pesado. Sua chegada na adolescência foi dolorosa. Constantes batidas violentas da polícia e agressões gratuitas de comerciantes por onde passava. Isso não importava para ele. Era uma geleira de sentimentos. Mas nunca agrediu ninguém. Apesar do seu corpanzil.

Nosso suposto herói foi esquecido por todo mundo. E cobrado por todo mundo. Era alto, uma cor brilhante e viva, por uma obra do acaso foi ficando bonito. E a vida foi lhe sorrindo. Numa bela tarde, nosso herói dormia numa praça da cidade que, naquele dia, seria usada como cenário comercial de uma grande empresa de telefonia. Nosso herói nem sabia o que estava acontecendo. Um ator faltou para a gravação do comercial. Foi um pânico geral na equipe. Nesse momento, nosso herói que dormia sem saber de nada aparece bem na frente da equipe de produção e pede algo para comer.

Hoje nosso herói está em cartaz nas telas de todo o cinema nacional. Profundamente consciente do país em que vive, sabe que tem uma missão gigantesca pela frente. Hoje é um ativista atuante no combate ao racismo e na denúncia da grande desigualdade que existe. Ficou tão popular que nosso caboclo virou presidente do país. Livro pra comida e prato pra a educação! Esse era o lema para transformar o seu país numa república popular e igual.

Rubinho Giaquinto é covereador da Coletiva em Belo Horizonte

Edição: Rafaella Dotta