Diante da incompetência do governo federal, a chegada da variante B.1.617 do coronavírus ao Brasil, na semana passada, reacende a necessidade da atuação dos estados e municípios para evitar uma terceira onda da pandemia ainda mais letal que as anteriores.
A cepa, descoberta na Índia no final de 2020, já foi detectada em mais de 50 países de todos os continentes. No Brasil, os primeiros casos registrados da cepa foram detectados em tripulantes do navio MV Shandong da Zhi, que chegou no Maranhão, fretado pela mineradora Vale S.A. para transportar minério de ferro.
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Em Minas Gerais, a Prefeitura de Juiz de Fora foi notificada, na noite de quinta (27), pelo Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde do Estado de Minas Gerais (CIEVS) de que o resultado do sequenciamento genético de um paciente, que está internado com covid-19, testou positivo para a variante indiana do coronavírus.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde da cidade, o paciente está acompanhado e monitorado pelo Departamento de Vigilância Epidemiológica desde a sua chegada ao município e todas as medidas e protocolos de segurança sanitária foram tomadas. Além dos seis tripulantes do navio no Maranhão, a cepa indiana também foi registrada em uma pessoa em Campo dos Goytacazes, no Rio de Janeiro.
Chegada da cepa indiana é preocupante, já que ela se mostrou 50% mais infectante que a variante identificada no Reino Unido
Clarissa Lages, médica de família e integrante da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares acredita que é inevitável que essa cepa se espalhe pelo Brasil rapidamente, sobretudo considerando a falta de seriedade com que o governo federal trata a pandemia desde o início. No entanto, ainda há a possibilidade de os governos estaduais e municipais tomarem medidas que possam atenuar o impacto da circulação dessa variante.
“Em primeiro lugar, a vacinação precisa acontecer de uma forma mais rápida. A gente está vacinando muito pouco, em quatro meses a gente conseguiu vacinar 10% da população do Brasil. Se manter nesse ritmo, vai demorar três anos para terminar de vacinar os 90% restantes. Quando a gente aumenta a velocidade da vacinação, a gente impede a circulação dessa nova cepa e de todas as cepas do coronavírus”, avalia.
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Outra medida urgente, para a médica, seria a testagem em massa, principalmente das pessoas viajantes, seja em rodoviárias ou aeroportos. A partir disso, pessoas positivadas deveriam ser orientadas ao isolamento, para evitar a transmissão do vírus. O investimento no rastreamento genômico também é necessário para identificar qual cepa está circulando.
Variantes perigosas
No mesmo sentido de Clarissa, o médico infectologista Unaí Tupinambás, membro dos comitês de enfrentamento à covid-19 da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que a chegada da cepa indiana no país é preocupante, já que ela se mostrou 50% mais infectante que a B.1.1.7, variante identificada no Reino Unido que já era um motivo de preocupação global. Ser mais infectante significa que seria necessária uma menor carga viral para contaminar uma pessoa.
Caso não sejam tomadas medidas corretas, o risco, segundo Unaí, é real de a cepa indiana obter vantagem sobre a variante P1, prevalente no Brasil, o que causaria um aumento incontrolável da covid-19 em todo o país. No entanto, já são mais de um ano de erros cometidos pelo governo federal, que não controlou portos, fronteiras e aeroportos.
Tensão pelo colapso do sistema de saúde deve persistir até o final do ano
“A inação do governo federal causou essa grande tragédia sanitária e humanitária que o Brasil vive. Estudos epidemiológicos mostram que se o Brasil fosse medianamente eficaz no controle da pandemia poderíamos ter evitado 75% das mortes, ou seja, de cada quatro mortes, três mortes são evitáveis”, explica Unaí, que também é professor do Departamento de Clínica Médica da UFMG.
Para ele, neste contexto, pouco pode ser feito pelos municípios brasileiros para conter a circulação da nova cepa, mas medidas como barreiras sanitárias, checagem de chegada de ônibus nas rodoviárias e de passageiros nos aeroportos, aliadas à vacinação e a medidas “não farmacológicas” – como distanciamento físico, isolamento social, uso de máscara, quarentena, e até mesmo lockdown – podem contribuir para barrar a variante e diminuir as possibilidades de novas mutação do vírus.
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De acordo com o último boletim da Secretaria de Estado de Saúde (SES) de Minas Gerais, já são quase 40 mil vidas perdidas no estado. Em Belo Horizonte, segundo boletim municipal, o número de vidas perdidas ultrapassou 5 mil. O alerta para a ocupação de leitos UTI para covid-19 permanece em alerta vermelho, chegando a 78,2%.
A tensão pelo colapso do sistema de saúde, segundo Unaí, deve persistir pelo menos até o final do ano. “Como a gente não consegue fazer lockdown, restrição de mobilidade urbana, só a vacina vai nos tirar dessa grande crise”, comenta o médico.
“Poderíamos ter evitado 75% das mortes”
Até agora, estudos apontam que as vacinas AstraZeneca/Universidade de Oxford e Pfizer/BioNTech continuam eficazes contra a variante detectada na Índia, cepa B.1.617 do coronavírus. Sobre a CoronaVac (Sinovac/Instituto Butantan), há estudos em andamento sobre a eficácia do imunizante.
Ações da Saúde
Como prevenção de uma terceira onda no estado, a SES de Minas Gerais, em nota, afirma que tem ampliado ações de vigilância genômica do coronavírus para identificar mutações do vírus. Além disso, a secretaria afirma que solicitou à Vigilância Sanitária, a ampliação das medidas de fiscalização de entrada de passageiros oriundos do exterior no aeroporto internacional de Belo Horizonte.
A Secretaria Municipal de Belo Horizonte informou à reportagem que avalia diariamente o cenário assistencial da cidade para definir a abertura de novos leitos e contratação de profissionais. Ainda, disse que mantém monitoramento constante dos indicadores da doença no município. “Qualquer agravamento que comprometa a capacidade de atendimento será tratado da forma devida, com o objetivo de preservar vidas”, diz a nota.
Edição: Elis Almeida