Ser útil não significa estar disponível a toda hora
Passado mais de um ano, a pandemia provocada pelo coronavírus trouxe a aceleração de mudanças no mundo do trabalho e na relação cotidiana entre as pessoas que não podem ser consideradas frutos da modernidade. A lógica da multitarefa frente às inovações informacionais e tecnológicas, de que estamos mais capazes de administrar o tempo para resolver inúmeras questões, não pode ser um caminho para a verdade. É preciso questionar!
Esta perspectiva de polivalência no trabalho esconde a categoria da mais-valia, à qual procura retirar da nossa força de trabalho todo o suor. A ideia de ser colaborador não se encaixa em um mundo em que o resultado desta economia é a venda da força de trabalho. A proposta de “vestir a camisa” não nos torna igualitários entre patrão e empregados. A condição de dar o sangue (querem nosso suor e sangue), não nos faz estar aproximados na mesma condição de justiça.
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O que se pretende com a lógica de apresentar o conforto do trabalho remoto é mais uma etapa de precarização da vida humana. O acúmulo de trabalho não é utilidade. Deve ser lido por nós, frente a desigualdade provocada pelo sistema de produção vigente, que nos condiciona a acreditar que somos parte de uma riqueza que é socialmente produzida, mas não se reparte. O capitalismo quer que nós, a classe trabalhadora, romantizemos a utopia de que estamos chegando lá. Que lá? Quem lá?
Ser útil não significa estar disponível a toda hora. É necessário parar!
Nossas vidas não podem ser determinadas a partir do pressuposto de que estamos a serviço de um mercado que não nos incluiu. Os donos dos meios de produção, na pandemia, definiram que a economia não pode parar, mesmo que custe as nossas vidas. Nos ônibus ou por trás das telas, morremos entre o vírus e o genocídio anunciado.
Portanto, é necessário parar! É importante entender o ser social para além do trabalho. Até mesmo para compreender a que custo existimos.
No processo de produção capitalista, a exploração nos tira a real capacidade de sermos felizes, uma vez que as nossas condições materiais básicas são construídas à prestação. Na venda da nossa mão de obra, de uma produtividade a cada dia mais barata e fragilizada.
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Ao parar, podemos compreender o horizonte que não nos inclui. Na parada, podemos olhar para trás. No momento da “paragem”, conseguimos ver que a nossa diversidade enquanto classe não compõe os espaços de poder. É neste movimento de paralisação que temos a capacidade teleológica de refletir, que podemos nos comprometer com o poder popular. Que traz à distância uma capacidade de síntese para uma nova alvorada.
Parar não significa estabilidade, ao contrário, significa mudança. Uma outra ordem é possível, urgente e necessária!
Leonardo Koury é assistente social, professor, conselheiro do CRESS-MG e militante da Frente Brasil Popular.
Edição: Rafaella Dotta