“Mulher é bicho esquisito, todo mês sangra”. Mesmo com a música de Rita Lee na década de 1980, o assunto ainda é tabu, permeado de preconceito e desinformação. Entre outros povos e culturas, a menstruação coloca o ser feminino em condição divina, fonte geradora da vida.
Em pleno século XXI é urgente pensarmos a menstruação como questão de saúde pública. Metade da população mundial, cerca de 7,6 bilhões de pessoas, sangram ou já sangraram mensalmente. Tão comum e natural quanto menstruar é a ideia de que os dias do ciclo são os mais desagradáveis do mês, apesar de entendermos que ele é muitíssimo importante para a saúde do corpo feminino.
Mulheres substituem o absorvente por papel higiênico, roupas velhas ou toalha de papel
A menstruação é, portanto, um processo natural, uma questão de saúde pública e, no contexto de extrema desigualdade socioeconômica, a menstruação passa a ser também um problema econômico. Para muitas pessoas, falta dinheiro para comprar produtos de higiene, como o absorvente.
E como isso pode afetar a saúde de uma mulher?
A antropóloga da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mirian Goldemberg, entrevistou mulheres em todo o país com idade entre 16 e 29 anos, e chegou à seguinte conclusão. "Uma em cada quatro jovens já faltou à aula por não poder comprar o absorvente e não falam que foi por isso. Elas têm vergonha, tentam esconder. A falta de absorvente provoca uma sensação de insegurança. É algo que elas sofrem sozinhas, como se fosse um fracasso, uma vergonha”.
O levantamento nacional inédito, coordenado pela pesquisadora procurou entender o fenômeno da pobreza menstrual. A Organização das Nações Unidas (ONU) já vem tratando o assunto como sendo de relevância mundial. Mas o que significa esse termo? Em primeiro lugar, é a falta de itens básicos durante a menstruação, seja por falta de informação ou de dinheiro para comprar os absorventes.
Uma em cada quatro jovens já faltou à aula por não poder comprar absorvente
Combater a pobreza e, por conseguinte, promover a dignidade menstrual, foi com essa intenção que a deputada estadual Leninha (PT-MG) apresentou Projeto de Lei que garante a gratuidade de absorventes higiênicos para pessoas em unidades escolares, unidades de saúde e também para pessoas em situação de privação de liberdade, albergadas, enfim, em situação de extrema vulnerabilidade social.
Mas, afinal, quanto custa menstruar?
A diretora executiva da Girl Up Brasil, Letícia Bahia, aponta que a estimativa é de que se gasta de R$3 mil a R$8mil ao longo da vida com a compra de absorventes. O absorvente e outros produtos de higiene íntima e menstrual ainda são vistos como produtos cosméticos e como produtos de luxo, supérfluos, são frequentemente tributados dessa forma.
É sob essas muitas nuances que a deputada estadual Leninha, do Partido dos Trabalhadores, trouxe esse tema na forma de um projeto de Lei.
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“Eu conheço de perto essa dor. Sou uma mulher periférica. Nascida numa família humilde e muito numerosa. Sei o quanto uma situação corriqueira como essa de comprar um absorvente, numa casa com mais de duas, três mulheres é uma condição onerosa. Quando presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia, pude acompanhar de perto questões como essa. De modo muito especial, a falta de dignidade de mulheres privadas de liberdade”, explica Leninha.
Para quem tem um banheiro dentro de casa, chuveiro com água quente, sabonete e absorventes descartáveis à disposição para trocá-los sempre que necessário, a falta de acesso a itens de higiene durante a menstruação pode parecer inimaginável. Mas, infelizmente, essa é a realidade de quem mora nas ruas, em abrigos ou presídios e enfrenta, mensalmente, as dificuldades de menstruar sem contar com saneamento básico nem com protetores menstruais.
Pretas e pardas são mais afetadas
“Também é importante destacar que a pobreza menstrual atinge mais as mulheres pretas e pardas (são mais de 108 milhões no país). Diante dessas condições o que ouvimos durante a construção do PL é que muitas mulheres substituem o absorvente por papel higiênico, roupas velhas ou toalha de papel”, afirma Leninha. O que oferece riscos à saúde, já que pode levar a infecções no trato urinário, rins ou lesões nos órgãos reprodutores femininos.
“Minas será o primeiro estado brasileiro a garantir dignidade menstrual para as suas mulheres, e isso é um grande avanço”, comemora a parlamentar.
Edição: Elis Almeida