Voltar o Brasil aos tempos de pré-Constituição, como pretende a chamada Reforma Administrativa proposta pelo governo Bolsonaro, atinge em cheio uma das maiores conquistas do país: o Sistema Único de Saúde.
Se aprovada, o SUS tal qual como conhecemos hoje, será um dos grandes alvos das mudanças estruturais da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32. Além de perder financiamento, as políticas públicas de saúde poderão ser repassadas à iniciativa privada até mesmo sem contrapartida financeira.
Projeto vai tutelar profissional ao gestor de plantão
O ex-presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e atual conselheiro, Francisco Batista Júnior, avalia que se não for barrada, a PEC 32 “será a mais dura derrota, porque significará, na prática, a extinção da política pública mais democrática e inclusiva que dispomos. É um golpe mortal no Sistema Único de Saúde, naquilo que diz respeito aos seus princípios fundamentais, a universalidade, a integralidade e a equidade”.
O médico de família e comunidade do SUS-BH, Bruno Pedralva, também teme que a aprovação do texto inviabilize a existência do SUS.
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“A PEC 32 sucateia e desmonta o Sistema Único de Saúde. Primeiro porque enfraquece todas as políticas públicas e, particularmente, a saúde. Profissionais da saúde do SUS vão ficar tutelados pelo gestor de plantão, pelo prefeito, governador. Os vínculos vão ficar muito frágeis. A estabilidade, que é um direito constitucional para que os servidores tivessem compromisso com o povo e não com gestor de plantão, vai cair se essa PEC for aprovada. E segundo, ela abre brechas para a privatização completa dos serviços de saúde".
Redução de servidores de carreira dará lugar ao fisiologismo e ao cabide de empregos
Conselho denuncia favorecimento do setor privado
A possibilidade de entregar a estrutura do SUS ao setor privado preocupa o Conselho Nacional de Saúde (CNS) que pediu o arquivamento imediato da PEC 32. O documento com as considerações e recomendações foi enviado à Câmara dos Deputados, ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal de Contas da União (TCU).
“A PEC nº 32/2020 entrega grande parte do serviço público ao setor privado, repassando a esse, recursos financeiros e sem retorno aos cofres públicos, restando para a sociedade setores sucateados e longa espera em atendimento”, diz trecho da nota técnica do CNS.
Na avaliação do ex-presidente do CNS, a redução de servidores de carreira proposta pela PEC também dará lugar ao fisiologismo e ao cabide de empregos como regra no serviço público. Ainda segundo ele, o concurso público, as carreiras e a estabilidade do servidor é “a garantia de acesso ao Sistema dos mais preparados profissionais e da sua imunidade à nociva ingerência político partidária na administração pública, com todos os graves problemas que essa ingerência causa”.
SUS, pandemia e PEC 32
A lição que muitos tiraram com a pandemia de covid-19 foi que a estrutura pública, em especial na área da saúde, é um forte aliado para superar essa que foi a mais grave crise desde a Segunda Guerra Mundial.
Mais de 150 milhões de brasileiros dependem do SUS exclusivamente, segundo dados do IBGE de 2019. Essa necessidade da saúde pública foi ainda mais evidente com o enfrentamento da pandemia. No Brasil, a produção de vacina, por exemplo, teve o aporte de duas autarquias ligadas ao SUS a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Butantã.
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"O SUS se mostrou essencial, salvou vidas, tanto na assistência direta às pessoas, quanto na prevenção da infecção no coronavírus, cada vacina no braço do povo brasileiro é fruto do SUS", defende Bruno Pedralva.
Para Francisco Batista Júnior, o SUS terá ainda que acompanhar as consequências e sequelas da covid-19 nos próximos anos. “Suas consequências a médio e longo prazos já são bastante conhecidas com as pessoas vitimadas necessitando de longos tratamentos de problemas clínicos, físicos e psicológicos que permanecem após a fase aguda e de tratamento. As alterações propostas pela PEC 32 eliminam qualquer possibilidade de disponibilizar para a população um Sistema com plena capacidade de dar a resposta necessária à população”.
Edição: Elis Almeida