Minas Gerais

RODOVIA DA MORTE

Pedágios podem custar mais de R$ 9 com contrato de privatização da BR-381/262/MG/ES

Edital de concessão, anunciado pelo governo federal, prevê 11 praças de cobrança. Leilão acontece em novembro

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Esse trecho é conhecido como “rodovia da morte”, devido às péssimas condições da estrada, o alto fluxo de caminhões e o grande número de acidentes. - BdF MG

Mais de 680 quilômetros do sistema rodoviário BR-381/262/MG/ES será entregue para a iniciativa privada ainda neste ano. 

O edital de concessão, publicado no início de setembro pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), prevê a exploração da infraestrutura e a prestação de serviço público por 30 anos, com contrato prorrogável por mais cinco. A concessão envolve o trecho da BR-381, de Belo Horizonte a Governador Valadares, e a BR-262, entre João Monlevade e Viana, cidade do Espírito Santo. O leilão está agendado para o dia 25 de novembro.

BR-381 é a rodovia com o maior número de acidentes em 2020

O lançamento do edital foi comemorado em cerimônia no Congresso Nacional, com a participação do ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas, dos governadores de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), além de deputados federais e senadores dos dois estados. 

A notícia pode parecer um alívio, já que esse trecho é conhecido como “rodovia da morte”, devido às péssimas condições da estrada, o alto fluxo de caminhões e o grande número de acidentes. A BR-381, que também tem o trecho que liga Belo Horizonte à São Paulo, é a rodovia com o maior número de acidentes registrados em 2020, com um total de 2.145 acidentes com vítimas, conforme o Painel de Acidentes Rodoviários, elaborado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT). 


A BR-381 é a rodovia com o maior número de acidentes registrados em 2020 / CNT

Pedágio

No entanto, para Rafael Calabria, coordenador de mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), alerta que a concessão é um modelo de gestão privada e que, na verdade, quem paga o investimento é a população, por meio dos pedágios. Ou seja, ao invés do Estado utilizar os impostos e recursos públicos para garantir a qualidade e a segurança das estradas, entregam para as empresas que acabam por arrecadar recurso dos pedágios.  

“Não é que a privatização seja a solução. A gente tem como contraponto os ônibus que são privatizados e são ruins. A gente questiona a explicação que se faz de que a concessão seria uma mágica que melhora e traz dinheiro. Não é. Se o contrato for ruim, vai ficar caro”, avalia. 

Pode parecer um alívio, mas quem vai pagar é a população 

Segundo informações da ANTT, o valor máximo das tarifas das praças de pedágio, que podem ser cobrados pela concessionária, variam de R$ 7,62 a R$ 9,17. A licitação será realizada na modalidade de concorrência, ou seja, por meio de leilão, com participação internacional, a partir do novo critério de modelo híbrido, que considera o valor da tarifa básica de pedágio e maior outorga como critério de desempate. O principal critério de julgamento do leilão será a menor tarifa. 


O valor máximo das tarifas das praças de pedágio, que podem ser cobrados pela concessionária, variam de R$ 7,62 a R$ 9,17 / ANTT

A expectativa, segundo Marcello Costa, secretário nacional de transportes terrestres do Ministério de Infraestrutura, é que haja uma “disputa entre os interessados”. “Este complexo é um dos mais importantes eixos de logística de cargas e de transporte de passageiros da região centro-sul do país”, disse. A pecuária, agricultura, mineração e a siderurgia, segundo a ANTT, serão, serão setores beneficiados com a concessão.

Nessa linha, Rafael aponta mais um limite dos processos de privatização: as classes mais pobres não são ouvidas ou consideradas, sobretudo quando se fala em tarifas tão caras de pedágio. “Tanto quem não consegue pagar a tarifa do busão quanto quem não consegue pagar o pedágio não são ouvidos. Fica minimizado o impacto ruim e supervalorizado o impacto bom. Aí é fácil ficar no discurso de que privatizar é uma mágica”, aponta.

Ponderações 

Para Rafael Ribeiro, professor de economia da Universidade Federal de Minas Gerais, embora os processos de privatização desencadeados por Paulo Guedes, como o da Eletrobrás, e os almejados por Romeu Zema em Minas Gerais, como a Cemig e a Copasa, sejam criticados por muitos especialistas, no caso das rodovias, as experiências não têm sido tão negativas. 

Segundo ele, o contrato de concessão do sistema rodoviário BR-381/262/MG/ES pode trazer benefícios para a população e para a economia de Minas Gerais, já que pode facilitar o escoamento de produtos e mercadorias de diversos setores. No entanto, para o economista, a grande questão é a ausência de um debate sério sobre regulação do serviço público. 

Se não for muito bem regulado no contrato, a empresa privada vai priorizar o lucro

“Normalmente, quando se concede o serviço para a iniciativa privada, se isso não for muito bem regulado no contrato de concessão e tiver formas e mecanismos para monitorar, como as agências reguladoras, o que acontece é que a empresa privada vai priorizar o lucro em detrimento da qualidade do serviço. No caso da concessão de estradas, tem dado certo na maioria das experiências, porque se consegue manter o subsídio cruzado”, argumenta. 

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O subsídio cruzado aparece, nesse caso, no processo de concessão de uma via rentável, como a BR-381, mas com o investimento embutido no valor do pedágio em uma via que não é tão rentável, no caso a BR-262, conseguindo manter ambas com a mesma qualidade. Segundo o economista, em situações de privatização de serviços como energia e saneamento, o subsídio cruzado deixa de existir, na medida em que as empresas acabam priorizando as localidades mais lucrativas, o que pode piorar o fornecimento em municípios menores, por exemplo. 

Valores divulgados

A previsão divulgada é que sejam aplicados R$ 7,37 bilhões para as obras e cerca de R$ 6 bilhões para custos de operação, sendo que a Taxa Interna de Retorno é de 8,47%. Segundo o professor de economia Rafael, essa taxa é como se fosse o lucro da concessionária e tem um valor razoável, condizente com a média de outros setores.  

Entre as principais mudanças estão 402 quilômetros de duplicação, 228 quilômetros de faixas adicionais, 131 quilômetros de vias marginais, 40 passarelas e o contorno de Manhuaçu. Segundo a ANTT, a estimativa é de que a concessão gere mais de 100 mil empregos diretos e indiretos. 

 

Edição: Elis Almeida