A descoberta do Ouro em fins do século XVII e na primeira metade do século XVIII nas terras das Minas Gerais, provocou uma mudança significativa na configuração da sociedade colonial escravista, grande contingente de pessoas se deslocaram para a região em busca do “sonho dourado” da atividade mineradora. Entre essa população, uma enorme parcela de africanos escravizados, foram utilizados entre outras atividades, no duro trabalho das minas e rios na busca de metais preciosos, a comando dos senhores de escravos.
Desta forma, uma preocupação constante das autoridades coloniais e classes dominantes da época, era o medo de revoltas escravas, o assalto a vilas, a fuga do cativeiro e a formação dos Quilombos. O receio da Coroa Portuguesa, da repetição em território mineiro do exemplo de resistência e luta de “Palmares de Pernambuco” foi uma constante durante todo o século 18, receio que será renovado durante o século 19 em razão da “revolução dos negros”, que ocorre no Haiti em 1791.
Entre 1710 e 1798 houve a descoberta e destruição de 160 quilombos em Minas Gerais
O historiador Carlos Magno Guimarães (UFMG) nos informa que entre 1710 e 1798 a documentação disponível indica a descoberta e destruição de aproximadamente 160 quilombos em Minas Gerais. Nesse sentido, devemos compreender a fuga de negros e formação dos quilombos como uma resistência ao sistema escravista. E por isso mesmo, uma forma de organização sistematicamente combatida e reprimida.
Nos quilombos em Minas, eram praticadas agricultura de subsistência, criação pastoril e alguns casos de atividades mineradoras (variando as atividades conforme a região), possuíam uma organização interna, trocavam e mantinham uma rede de informações e trocas comerciais com outros setores da sociedade colonial mineira.
Quilombo Grande
Entre os quilombos existentes em Minas Gerais nesse período, talvez o mais conhecido seja o caso do “Quilombo do Ambrósio” pelo número de sua população e as intensas campanhas pelo seu aniquilamento por tropas de capitães do mato. O Quilombo do Ambrósio é citado por pesquisadores como parte do que aparece como “Campo Grande” e/ou “Quilombo Grande” nos documentos e arquivos.
O pesquisador Tarcísio José Martins, que estuda o período e os quilombos mineiros há décadas, indica não se tratar apenas de alguns núcleos quilombolas, mas que o “Quilombo Campo Grande” seria uma junção ou confederação de 27 núcleos e vilas existentes (nesse aspecto maior que Palmares), que possuíam articulações entre si, em um território que abrangeu do Sul/Sudoeste até o Triângulo Mineiro da capitania.
“Quilombo Campo Grande” seria uma junção de 27 núcleos e vilas
A conformação do Quilombo Campo Grande, segundo Tarcísio José Martins, estaria ligada, entre outros motivos, à fuga da imposição pelo governo colonial de um sistema de Captação e tributação de impostos aos moradores das vilas mineiras a partir de 1735, contribuindo para o aumento populacional das vilas do Quilombo Campo Grande. Foram intensas as campanhas e guerras contra o Campo Grande, gerando grandes investimentos do governo colonial em tropas e suplementos para derrotar os quilombolas, até meados de 1760.
Luta ontem, resistência hoje
A história do Quilombo Campo Grande, ainda parece distante do grande público e livros didáticos. Contudo, notamos o interesse de novos pesquisadores (as) pelo tema nos últimos anos, como por exemplo um estudo de acadêmicos da PUC-MG em reconstruir cartograficamente a localização dos quilombos do Campo Grande, através dos mapas elaborados nas campanhas de guerra, que se encontram sob guarda do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB-USP) e do Arquivo Histórico Ultramarino (AHU).
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A luta pela memória e resgate da história da resistência negra nos quilombos se faz extremamente necessária, em tempos de negacionismo histórico. Como a homenagem realizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ao nomear de Quilombo Campo Grande um dos maiores acampamentos da região sudeste, localizado em Campo do Meio-MG. Que resiste a 25 anos contra investidas de latifundiários e do agronegócio. A luta de ontem é a resistência de hoje!
Marcos Bertachi é historiador, graduado pela Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ), mestrando em Geografia pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG).
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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Elis Almeida