1. Arrecadação cresceu, mas governo abriu mão de R$ 126 bilhões
Romeu Zema, do partido Novo, se elegeu culpando governos anteriores pelo déficit nas contas públicas e prometendo resolver o problema. Com essa justificativa, congelou salários, fez uma reforma da Previdência que aumentou as cobranças sobre servidores e deixou de investir o mínimo constitucional em áreas como educação.
Para as mineradoras, locadoras de veículos e agronegócio, não faltaram benefícios, como a isenção de impostos. Para o governo federal, Zema deu um presente: nas compensações das perdas da Lei Kandir, Minas abriu mão de receber R$ 126 bilhões a que tinha direito, mais de 90% do total devido pela União.
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É verdade que, nos últimos dois anos, as receitas do Estado cresceram. Em 2020, isso ocorreu principalmente porque houve um aporte de recursos federais, em razão da Lei Complementar 173 e do Orçamento de Guerra. Em 2021, houve um aumento das receitas próprias do estado.
“De janeiro a novembro deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado, houve um crescimento, descontada a inflação, de 16% da receita total, muito em função das receitas próprias, especialmente o ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços]”, explica o economista Thiago Rodarte, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Agora, o governador chega ao fim do ano com uma previsão de déficit de R$ 11,7 bilhões, prevista na Lei Orçamentária Anual (LOA). Mas Thiago alerta: é precipitado prever o déficit no próximo ano. “Neste momento, esse discurso pode ser apropriado por quem quer a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), com base em uma avaliação equivocada da situação das contas públicas”.
2. Acordo com a Vale, com Judiciário, com tudo... exceto com os atingidos
Em fevereiro, a Vale S/A, o governo de Minas e as instituições de Justiça celebraram um acordo de R$ 37 bilhões, cerca de R$ 17 bilhões a menos que o valor cobrado inicialmente pela reparação do crime na bacia do Paraopeba, cometido há quase três anos pela mineradora. O acordo extingue duas ações judiciais: uma que pedia dano moral coletivo aos atingidos, de R$ 28 bilhões, e outra que pedia indenização ao Estado, de R$ 26 bilhões. O valor final a ser pago é inferior ao lucro líquido da Vale no primeiro semestre deste ano.
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Atingidos e entidades que acompanham o caso afirmam que não houve espaço para participação popular no acordo. Com parte do dinheiro, cerca de R$ 3,5 bilhões, será construída uma grande obra de infraestrutura viária na Região Metropolitana de BH, que o governo chama de rodoanel e os movimentos têm chamado de “rodominério”, por beneficiar mineradoras.
Prefeitos e movimentos são críticos à obra, considerando que ela terá impactos ambientais, causará a remoção de famílias e ainda gerará cobranças à população. “Estão discutindo traçado e falando em pedágio. Não tem detalhamento de planilha de custos, a contabilidade é totalmente bagunçada. Ninguém conhece o projeto, que está guardado na gaveta”, criticou, em audiência na Assembleia Legislativa, o prefeito de BH, Alexandre Kalil.
3. CPI mostra aparelhamento da Cemig
Desde julho, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia investiga possíveis irregularidades na gestão da Cemig nos últimos três anos. Entre as descobertas, aparecem contratações sem licitação, espionagens e suposto favorecimento de aliados do governo.
Um desses casos diz respeito à Exec, empresa de recursos humanos que selecionou o presidente da companhia, Reynaldo Passanezi. No ano passado, a mesma empresa assessorou o partido Novo no recrutamento de candidatos a prefeito em oito capitais brasileiras. Dois sócios da Exec, os empresários Rodrigo Foz Forte e Carlos Eduardo Altona, são filiados ao Novo.
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Em outro caso, uma licitação para serviços de teleatendimento foi aberta e a empresa AeC, fundada pelo ex-secretário de Desenvolvimento Econômico de Zema, tinha sido derrotada pela concorrente Audac. Porém, meses depois, a Cemig suspendeu o contrato da Audac e firmou outro contrato com a transnacional de tecnologia IBM, sem licitação e sem concorrência, no valor de R$1,1 bilhão. Essa, por sua vez, subcontratou a AeC, que havia perdido a licitação.
4. Minas sob intervenção por nove anos?
Em outubro, Zema pediu à Assembleia Legislativa urgência para o Projeto de Lei (PL) 1.202/2019, que prevê a adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal do governo federal. Se essa proposta for aprovada, a dívida do estado com a União, de mais de R$ 130 bilhões, poderá ser suspensa por nove anos e, depois, retomada com o pagamento de todos os encargos e o valor aumentado, comprometendo futuros governos.
Pelo alongamento da dívida, o Regime impõe um pacote fechado de exigências: proibição de concursos, congelamento de salários, venda de estatais como a Cemig e a Copasa e proibição de novos investimentos nas áreas sociais.
Pelas regras do Regime, a gestão financeira do estado será subordinada a um conselho de supervisão da União, que poderá barrar medidas como contratação de professores, médicos e pesquisadores. E pelas regras, Minas não poderá questionar judicialmente nenhuma cláusula do contrato da dívida com a União.
A justificativa do governo é sanar as contas estaduais, mas, o caso do primeiro estado que aderiu ao Regime até hoje, o Rio de Janeiro, há quatro anos, a dívida consolidada líquida saltou de R$ 106 bilhões para R$ 172 bilhões (um acréscimo de R$ 66 bi), segundo dados do próprio relatório de encerramento do Plano de Recuperação Fiscal do Rio.
No último mês, 21 lideranças sindicais críticas às propostas, liberadas de sua atividade laboral para exercer o trabalho sindical, foram informadas que o governo de Minas cancelaria a sua liberação a partir de 6 de dezembro. Cinco sindicalistas conseguiram reverter a decisão na Justiça.
Edição: Wallace Oliveira