Não foi por apego à liberdade que Inglaterra apoiou independência de colônias
No ano em que o Brasil completa duzentos anos de sua independência, é preciso refletir sobre fatores que facilitaram o apoio das potências internacionais nas libertações dos países latino-americanos.
O século XIX caracteriza-se pela pregação liberal, de interesse burguês. Se do lado romântico aparece clara a ideia de nação, do lado liberal, reivindica a regularidade constitucional, para evitar os possíveis arbítrios e para que se viva de acordo com as leis da razão. O liberalismo e a força da burguesia fazem extinguir os monopólios que eram meios privilegiados de enriquecimento de Portugal e Espanha. O chamado parasitismo colonialista ibérico.
Espanha e Portugal entraram em declínio sem suas colônias
Sem o aparelho estatal forte não poderia haver monopólio e nem mercantilismo. Quanto mais avançava o liberalismo, maior era o crescimento industrial e comercial da Inglaterra, França e Alemanha; maior era o declínio de Espanha e Portugal. Ao longo do século XIX, a Inglaterra não apenas submeteu Portugal ao seu domínio, mas também todo o oceano Atlântico que era crucial para a Espanha. Ela derrotou sobretudo na economia, todos os seus adversários, europeus ou não.
Apesar disso, no entanto, França e Alemanha mantiveram importância no cenário europeu e ocidental do século XIX. Ao contrário da Espanha e de Portugal, que não estavam preparados para viver sem a América, e com a independência dos países latinos, os dois países entram em declínio.
A doutrina tanto política quanto econômica do liberalismo contribui para a libertação dos países da América Latina. Havia interesse por uma América fracionada saísse do controle da Espanha e de Portugal. Não foi pelo apego à liberdade que a Inglaterra apoiou com entusiasmo a independência das antigas colônias de Portugal e Espanha. Estas revertiam-se em campo ideal para as atividades de um centro poderoso como o inglês. É da Inglaterra que as novas nações vão buscar capitais, tecnologia para implantar suas ferrovias, suas minas, efetuar suas exportações e importações.
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O caráter ideológico nessa situação deve ser detectado na justificativa da independência das colônias americanas na certeza de que suas fraquezas e deficiências; seu subdesenvolvimento; sua inferioridade tecnológica e cultural as levariam à condição de dependentes da Inglaterra, no modo de imperialismo informal, diferente do imperialismo institucional e do colonialismo.
O poder de convencimento do liberalismo está assentado na necessidade de modernização, liberdade e valorização da individualidade. Mas no liberalismo e no capitalismo, essa ideia segue um rumo contraditório. Quer indivíduos independentes para desenvolver funções econômicas, isto é, ganhar e consumir. Mas quando esses indivíduos agem com individualidade em busca do progresso da humanidade; quando reclamam o livre exercício de sua faculdade de imaginação, entram em choque com as ideologias capitalistas que visam a padronização.
O individualismo progressista valoriza o caráter único e incomparável de cada cidadão. Durante o processo de independência das nações americanas o discurso liberal foi uma força retórica irresistível que dissolveu as práticas e as formas de manutenção das colônias.
Maiores líderes por independência foram Simon Bolívar e José San Martim
Os crioulos, filhos de espanhóis nascidos na América, influenciados pela trilogia da Revolução Francesa (1789) “igualdade, liberdade e fraternidade”, com apoio da Inglaterra e dos EUA, convocaram as populações das colônias a se rebelaram contra a Espanha. Os dois maiores líderes crioulos foram Simon Bolívar e José San Martim, organizadores de exércitos populares que levaram a proclamação de independência de vários países da América.
Quando todos os países da América tiveram proclamadas suas independências, em 1826 houve uma reunião no Panamá, na qual Simon Bolívar propunha acordo de solidariedade e integração entre os países do continente. Estados Unidos e Inglaterra impediram que tal acordo fosse realizado, permanecendo a fragmentação e total dependência política, econômica e cultural de toda a América Latina.
Antônio de Paiva Moura é mestre em história pela PUC-RS e autor de América Latina; fatores ideológicos na colonização, disponível aqui.
Edição: Elis Almeida