“Vai comprometer os poucos espaços de captação de água que abastecem Belo Horizonte”. É o que pensa Álvaro Augusto de Oliveira, da Associação de Moradores do Bairro Vila da Serra, sobre a venda de um terreno localizado entre o Belvedere, na capital mineira, e o seu bairro, em Nova Lima.
O trecho possui cerca de 2 quilômetros e corresponde à área da antiga linha férrea do Belvedere RFFSA. Após a desativação da linha, o terreno ficou sob responsabilidade da Superintendência de Patrimônio da União (SPU).
Em novembro de 2021, a SPU anunciou que a área de 19 glebas está entre os 139 imóveis da União em Minas Gerais que serão leiloados até março de 2022.
A notícia surpreendeu os moradores da região que acreditam que a venda do terreno favorece os interesses de construtoras, que querem instalar uma rodovia no local, o que causaria danos ambientais.
A área é próxima à Serra do Curral, considerada estratégica para o abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). A Serra do Curral pertence à Reserva da Biosfera da Serra do Espinhaço e abriga nascentes que alimentam as bacias do Rio das Velhas e do Rio Paraopeba, dois cursos d'água responsáveis por quase todo o abastecimento da Grande BH.
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Próximo ao terreno, também está a Estação Ecológica Cercadinho, criada em 2006 pela Lei 15.979, com o objetivo de proteger o aquífero, o solo, a paisagem, a fauna e a flora da região. A estação também abriga nascentes e mananciais usados na captação de água para abastecimento da capital.
A Superintendência de Patrimônio da União foi procurada pela reportagem, mas não respondeu.
Moradores querem construir parque no local
Apesar de estar sob responsabilidade da União, os moradores da região relatam que a área estava abandonada e sofria com invasões.
“Todos os anos, especialmente no tempo seco do inverno, a área sofre com incêndios. Não há brigada de incêndio, nenhuma proteção contra o fogo e a vegetação é constantemente destruída”, contou Laura Lima, membro da Associação Amigos do Belvedere, ao Brasil de Fato MG.
Segundo ela, a falta de cuidado com o local fez com os moradores se mobilizassem para a preservar e dar utilidade à área. Dessa forma, desde o ano de 2002, a população utiliza o lugar como um parque improvisado. Em 2017, foi apresentado à Câmara Municipal de Belo Horizonte um projeto de lei com o objetivo de formalizar a criação de um parque linear na área. O projeto foi aprovado de forma quase unânime pelo legislativo, com apenas um voto contrário. Porém, para ser sancionado pelo executivo, era necessário que a União cedesse o terreno ao município.
Na ocasião, o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, encaminhou um ofício à SPU solicitando a cessão da área verde para a criação do parque. No ofício, o prefeito enfatiza que a área não conta com espaço público de convivência estruturado e que a criação do parque reduziria as ocupações irregulares do terreno.
Álvaro, da Associação de Moradores do Bairro Vila da Serra, conta ainda que a Prefeitura de BH informou aos moradores que não teria condições de arcar com os custos da administração do parque. Depois do anúncio, a população se colocou à disposição de receber o terreno, por meio de transferência da prefeitura, e administrá-lo. Todavia, a área não foi cedida à prefeitura, o projeto de lei não foi sancionado e perdeu a validade.
Trânsito de BH também seria impactado
Os moradores acreditam ainda que, caso seja construída a rodovia – desejada pelas construtoras – pioraria a especulação imobiliária na área. Isso porque, seriam construídos novos condomínios e apartamentos na região.
“Isso representa mais milhares de veículos individuais transitando pela região, que já não suporta o tráfego atual. Sem investimento em um sistema de transporte coletivo eficiente ou sem reforma do Trevo do BH Shopping e do Anel Rodoviário, que são funis do volume já excessivo de veículos, pontos de congestionamento e acidentes constantes, a construção de uma via expressa só vai agravar o problema”, explicou Laura, da Associação Amigos do Belvedere.
Álvaro enfatiza que a rodovia teria um potencial do tamanho de duas Avenidas do Contorno. “Nós estamos falando de uma nova cidade sendo criada atrás da serra do curral sem a população saber”, declarou.
Movimento ganha força
Com o anúncio do leilão do terreno, os moradores apostam na disputa do apoio da sociedade para a construção do parque linear. “O parque teria equipamentos de lazer como parquinho infantil, ciclovia e pista de caminhada, bowl de skate, entre outros equipamentos, reaproveitando espaços anteriormente subutilizados” explica Laura.
Na internet, na última quarta-feira (2), a turismóloga Márcia Mascarenhas da Fonseca afirmou que “o Parque Linear é de suma importância ecológica e social para os moradores de BH e também para os turistas que se hospedam na região”.
A vereadora de Belo Horizonte Duda Salabert (PDT) também se posicionou nas redes sociais sobre o assunto. “Essa luta é importantíssima e urgente. Temos que preservar e ampliar as áreas verdes da cidade. Vamos juntas e juntos pelo cancelamento do leilão da área do parque”, disse.
Edição: Larissa Costa