O povo brasileiro é de outro mundo. Aqui só tem “cientista”
Hoje fui ensaiar com a minha banda. Saio com minha guitarra na mão, pelas ruas do bairro. A molecada fica "maluca" querendo tocar também. Um garoto chega perto e me pergunta:
- Você sabe tocar aquela música do Clube da Esquina, O Trem Azul?
- Sei. Por que?
- Porque vamos fazer uma festa lá debaixo do viaduto e a dona Dolores gosta muito dessa música aí. Você poderia ir lá tocar pra ela?
- Claro. Que horas vai rolar a parada lá?
- Uai, chega às cinco da tarde, beleza?
- Beleza. Fechô, então!
Como combinado, cheguei às cinco. O garoto foi me apresentando para todas as pessoas. Fiquei surpreso pela simpatia e a alegria de todo mundo ali. Tinha tudo que uma festa pode ter: bolo, refrigerantes, brigadeiro, salgadinhos...
Uma senhora mais expansiva chegou perto de mim e falou:
- Que guitarra bonita, moço! Parece com a dos Paralamas.
- Toca aí pra gente, vai!
- Claro.
Olhei a minha volta e tinha aproximamente umas 25 pessoas. Escuto uma voz grave e bem alta.
:: Leia mais notícias do Brasil de Fato MG ::
- Conceição, minha filha! Não atrapalha a cantoria.
Ensaiamos a música para homenagear a dona Dolores. Tá tudo direitinho. Tem até um coral no refrão.
- Moço da guitarra, em que tom você vai cantar e tocar, será no tom original do Lô Borges?
Balanço a cabeça que sim.
- Beleza. Pessoal, venham todos pra cá.
:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::
De repente, avisto a dona Dolores numa cadeira de rodas e muito bem vestida, com um sorriso nos lábios. Ela quer me dar um abraço de agradecimento. Descubro que sofreu um derrame.
A festa foi maravilhosa! Ali, bem debaixo do viaduto, com muita solidariedade e alegria. Saio de lá com a alma e o coração renovados. Fiquei abismado com a afinação das pessoas e com o conhecimento musical do “maestro”. Um garoto de 13 anos me pediu uma guitarra de presente. Ele estava com uma camisa da Legião Urbana.
Mil coisas passam pela minha cabeça. O povo brasileiro é de outro mundo. Aqui só tem “cientista”. Nós inventamos tudo a toda hora. A música agora não sai da minha cachola.
“Coisas que a gente se esquece de dizer
Frases que o vento vem às vezes me lembrar
Coisas que ficaram muito tempo por dizer
Na canção do vento não se cansam de voar
Você pega o trem azul, o Sol na cabeça
O Sol pega o trem azul, você na cabeça
Um Sol na cabeça...”
Rubinho Giaquinto é covereador da Coletiva em Belo Horizonte
--
Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa