Há poucos meses das eleições, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, anunciou que irá aumentar o salário dos servidores públicos em 10%. O aumento para os policiais, como prometido em 2019, não ocorreu. Desde 2015, Minas Gerais enfrenta déficits nas contas públicas.
De onde, então, virão recursos para bancar o compromisso do governador? Ou será que há dinheiro em caixa e ele não gostaria de revelar? Essa possibilidade foi aventada ano passado.
Há anos, os salários dos servidores estaduais não passam por reajustes, que devem ocorrer anualmente
Há anos, os salários dos servidores estaduais não passam por reajustes, que devem ocorrer anualmente para repor as perdas inflacionárias. Em 2021, os funcionários públicos de Minas, que já acumulam perdas na renda, foram ainda mais castigados mediante a disparada da inflação.
A intenção de Zema é tentar amenizar essa situação. Pelo projeto que foi encaminhado à Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o reajuste será de 10,06% nos rendimentos de servidores em atividade e aposentados. O pessoal do Legislativo e Judiciário estão de fora, porque não são competência do governador. Serão cerca de 614 mil servidores beneficiados.
Desde que assumiu, Zema não autorizou reajuste aos servidores alegando crise financeira. Agora, perto das eleições, ele concede reposição salarial
Até o momento, não se sabe a fonte do dinheiro.
Chama atenção que desde quando assumiu o governo, Zema não autorizou a atualização inflacionária alegando crise financeira. Agora, perto das eleições, ele concede reposição salarial. A situação de calamidade, porém, não foi totalmente superada.
Segundo a Lei Orçamentária Anual (LOA), neste ano a despesa com funcionários e outros encargos trabalhistas será de R$ 55,5 bilhões, levando em conta os profissionais dos três poderes.
A LOA ainda estima que em 2022 a receita corrente líquida (RCL) será de R$ 78,9 bilhões. Cerca de 70% dela (que compreende basicamente os impostos) equivale à folha de pagamento. Descontando as despesas com, por exemplo, custeio e manutenção das estruturas governamentais, sobra ao Executivo investir neste ano aproximadamente 9,2% ou R$ 7,2 bilhões da RCL.
É duvidoso se Zema cumprirá com sua palavra
A Instituição Fiscal Independente, do Senado, calculou em relatório de 2020 a saúde financeira dos estados. Minas, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro são os entes mais endividados e com menos capacidade de realizarem investimentos. Os três estados têm nota D, como de pior pagador.
Diante disso, é duvidoso se Zema cumprirá com sua palavra. É bom lembrar: em 2019 o mandatário prometeu aumento nos salários dos profissionais da segurança pública. Pelo acordo com eles, o reajuste seria em três parcelas. Apenas a primeira, de 13%, foi cumprida. As outras, cada uma de 12%, não foram.
E, para completar, o governo quer condicionar o pagamento do restante à aprovação do Regime de Recuperação Fiscal.
Algo bem remoto sinaliza a efetivação do mais novo reajuste. No ano passado, deputados e o governador travaram uma disputa em torno dos cofres públicos. Diante da retórica de crise do governo, o deputado Ulysses Gomes (PT) requisitou à Secretaria de Fazenda informações relativas às contas públicas. O pedido foi negado. A intenção seria avaliar a situação fiscal.
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Aventou-se a hipótese de o governo estar escondendo a situação financeira, que melhorou em decorrência do crescimento arrecadatório e do acordo com a Vale. Segundo parlamentares, ao ocultar a informação, o objetivo é realizar benfeitorias em ano eleitoral e manter a retórica da importância do RRF.
Tudo isso, claro, são hipóteses. Mas, de duas, uma: ou há recursos disponíveis que ninguém saiba ou o governador fez promessas em vão.
O projeto de Zema deve ser aprovado pela Assembleia, que ainda não começou a discutí-lo. Assim como foi em 2019, durante a discussão do reajuste da segurança pública, essa pauta vai tomar a agenda política estadual. Isso porque policiais civis e militares estão descontentes com a ideia de Zema. Eles querem a efetivação do acordo daquele ano.
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Nas semanas anteriores, eles realizaram grandes manifestações em Belo Horizonte e entraram em greve. No próximo dia 9 anunciaram mais um protesto para acuar ainda mais o governo. E também os deputados. Afinal, se eles votarem pelos 10% irão contrariar a segurança, categoria politicamente forte.
Marcelo Gomes é jornalista e analista político do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas.
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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Rafaella Dotta