As vias de acesso às comunidades e distritos de Mariana (MG), atingidas pelo mar de rejeitos das mineradoras Samarco, Vale e BHP, estão em situação precária. Deslizamentos de encostas e estradas esburacadas colocam em risco a vida de moradores, que sofrem com as mais diversas consequências do rompimento da barragem de Fundão, desde 2015.
O senhor Vicente Celestino, morador da zona rural de Paracatu de Cima, relata o risco de acidente devido aos buracos na estrada que leva ao subdistrito. “Na semana passada estourou um pneu e quase saí da estrada para o caminhão não bater em mim”, declara o atingido.
Além do risco de morte, o dano material fica na conta das pessoas atingidas. “Perdi o pneu, a roda amassou e o prejuízo é da gente”, acrescenta.
Moradores e prefeitura cobram
A partir do acordo firmado em 2017, a responsabilidade pela manutenção das estradas é da Fundação Renova que, segundo relatos dos moradores, não faz os devidos reparos. “Desde que a barragem rompeu, a gente fica brigando para arrumarem a estrada e eles sempre fazem o paliativo, um serviço muito ruim”, desabafa Mônica dos Santos, atingida e moradora de Bento Rodrigues.
Segundo Mônica, que também é membro da Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão de Mariana (CABF), “essa cobrança de manutenção da estrada é feita desde sempre”. A CABF, com apoio da Cáritas MG, Assessoria Técnica Independente, tem feito recorrentes denúncias da situação e cobrado a resolução do problema.
:: Leia mais notícias do Brasil de Fato MG. Clique aqui ::
A Comissão Municipal para Assuntos Ligados à Fundação Renova (Comar), que tem a função de acompanhar os serviços feitos pela Renova, também está se movimentando nesse sentido. “A gente tem feito reuniões, conversas, notificações e cobranças sobre a manutenção desses trechos”, afirma o presidente da comissão, Newton Godoy.
A Fundação Renova foi procurada pela reportagem, e respondeu que continua a fazer manutenção nas vias usadas para as atividades reparatórias. Mas confirma que devido ao grande volume de chuvas desde outubro, as estradas foram bastante impactadas.
"Durante o período das chuvas, a Fundação Renova realizou reparos de forma emergencial, além de melhorias, para garantir o acesso dos usuários em todas as vias. As manutenções das estradas devem ser retomadas no próximo mês", garantiu a Fundação.
Período de chuvas agrava precariedade das estradas
Ao risco de acidentes se somam outras violações de direitos provocadas pela péssima condição das estradas, como o isolamento comunitário e a restrição do direito de ir e vir das famílias já assoladas pelas consequências do crime-desastre.
“Esses dias, acabei encontrando mais barreiras para trafegar, o córrego encheu e não teve como passar”, afirma o atingido José de Félix, motorista que faz o transporte escolar da comunidade de Ponte do Gama.
Em janeiro deste ano, um desabamento de encosta deixou a estrada de acesso à comunidade de Bento Rodrigues interditada. Com isso, moradores da zona rural ficaram até mesmo sem o abastecimento de água, feito por caminhão pipa.
Cobrada pela CABF, a Fundação Renova prometeu resolver o problema até 27 de janeiro de 2022, o que não aconteceu. Na terça (15), aconteceu uma reunião entre a Prefeitura de Mariana, a Fundação Renova, a Comissão de Atingidos e a Cáritas MG para tratar sobre o problema.
Veículos pesados das mineradoras e da Renova pioram a situação
Mais uma denúncia relacionada às estradas é a alta movimentação de ônibus e caminhões pesados das mineradoras, bem como de terceirizadas – devido às obras nos territórios de origem e a construção dos reassentamentos coletivos das comunidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo. Situação que acontece desde o rompimento da barragem, em 2015.
Marino D’Angelo, atingido de Paracatu de Cima e membro da CABF, relata a imprudência de motoristas que trabalham para as mineradoras. “Na hora que eles acabam o serviço, que o povo vai embora, o asfalto é só deles. Se a gente reclamar não resolvem nada”, relata.
No segundo semestre de 2021, houve um acidente fatal no trevo de Paracatu de Baixo, relacionado à precariedade das estradas. “Essas empresas destruíram tudo aqui na região, chegaram aqui achando que são salvadores da pátria, mas não resolvem nada. A sensação é que a gente precisa arredar porque eles estão chegando”, indigna-se Marino.
:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::
Segundo Vicente Celestino, de Paracatu de Cima, após o rompimento da barragem as estradas ficaram mais precárias e, diante da falta fiscalização, o deslocamento se tornou ainda mais difícil para a comunidade.
“Alguns barrancos desabaram, a prefeitura restaurou parte do asfalto, mas entupiu canaletas e caixas de água fluvial", reclama o atingido. “As empresas Samarco, Vale e BHP, não estão nem aí para os atingidos”, completa.
Desde o ano passado, a CABF, com apoio da Cáritas MG e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), vem denunciando os descasos com as estruturas dessas estradas e a falta de manutenção por parte da Fundação Renova, gerenciada pelas mineradoras causadoras do crime.
Edição: Larissa Costa