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Marx, Engels e o Manifesto

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Marx termina o Manifesto com o lema da Liga dos Comunistas: “os proletários nada têm a perder a não ser as suas algemas. Têm um mundo inteiro a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos!” - Foto: Reprodução
Ainda hoje, o Manifesto pode ser considerado a melhor introdução ao estudo do pensamento de Marx

O ano de 1847 foi muito ativo para Marx e Engels. Eles aderiram à Liga dos Justos, que mais tarde passou a ser Liga dos Comunistas.

Em julho desse mesmo ano, Marx publicou o livro Miséria da Filosofia. Em novembro, aconteceu o II Congresso da Liga dos Comunistas, em Londres, onde Marx e Engels desenvolveram um ativo trabalho de persuasão dos representantes operários, que os convenceu das vantagens de seus pontos de vista. Então, eles foram designados para redigir um Manifesto do Partido Comunista.

Marx, então com 29 anos, fez uma série de conferências na sede da Associação dos Operários Alemães de Bruxelas sobre o trabalho assalariado e a exploração dos operários no regime capitalista. Todavia, além da controvérsia com Proudhon (pois, Marx defendia a greve dos trabalhadores), manteve uma controvérsia também com Karl Heinzen[1], em que Marx afirmava que a opção que se impunha ao proletariado não era entre “monarquia” ou “república” e sim entre “domínio da classe burguesa” ou “domínio da classe operária”. Marx chamou a atenção de Heinzen para o atraso da Alemanha semifeudal dizendo que “os operários alemães sabem que a própria luta deles contra a burguesia só poderá vingar no dia em que a burguesia tiver triunfado”.

Após serem convocados para escreverem o Manifesto, Engels escreveu um texto e o entregou a Marx, com o título “Os Princípios do Comunismo”, texto esse em forma de perguntas e respostas, que expunham as bases da doutrina comunista que ambos defendiam. Marx regressou para Bruxelas e se servindo do texto de Engels usa-o para escrever o Manifesto do Partido Comunista, que enviaria a Londres, ao final do mês de janeiro de 1848.

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O Manifesto tem início com uma ementa do desenvolvimento social da humanidade, em que Marx diz que a história de todas as sociedades, desde o seu aparecimento até os dias de hoje, teria sido a história da luta de classes. Mostra também, que a própria burguesia conseguiu tomar o poder e implantar o capitalismo por meio de uma luta contra as instituições feudais. Ou seja, pela necessidade de obter mercados novos, a burguesia foi compelida a invadir todo o mundo, realizando expedições de tamanha grandeza muito superior ao das cruzadas. Daí a burguesia passou a construir enormes edificações, tão grandes quanto as pirâmides do Egito, como também aos aquedutos romanos e as catedrais góticas. Construiu imensos centros urbanos, com grandes populações, desenvolvendo também uma extraordinária tecnologia.

Isso tudo, fez com que a burguesia não conseguisse controlar mais as forças que a colocou em movimento. Então, as forças produtivas fizeram novas exigências, o que as colocaram em choque com as relações capitalistas de produção. Começou a se enraizar a contradição entre o caráter tecnicamente socializado do sistema capitalista – a centralização dos meios de produção – e a “apropriação privada”, na qual se baseava o regime burguês.

As classes que se opunham ao domínio burguês, estavam fadadas a desaparecer, com o desenvolvimento das grandes indústrias. No entanto, existia uma classe que tenderia a crescer e se fortalecer mais e mais, pois ela é o mais autêntico produto das grandes indústrias. Essa classe se chama proletariado moderno.

Tudo isso, levaria a burguesia a temer a ascensão do proletariado, começando a combater a parte mais convicta dos partidos operários de cada país, formada pelos comunistas. Começou então, as campanhas anticomunistas, em que a burguesia se escandalizou com a pretensão que tinham de abolir a propriedade privada. Marx, mais uma vez, vem lembrar aos burgueses que, na sociedade capitalista, a propriedade privada já se encontra de “fato” abolida para a grande parte da população.

Para Marx, “o comunismo não retira de ninguém o poder de apropriar-se de sua parte da produção social; suprime apenas o poder de, por meio dessa apropriação, explorar o trabalho alheio”. Se lerem o Manifesto, vemos que os comunistas não querem abolir a propriedade privada, ou seja, a propriedade objeto de uso pessoal, e sim a propriedade dos meios de produção.

Muitas acusações foram feitas pela burguesia aos comunistas, de quererem acabar com a família, para instituírem a posse coletiva das mulheres, outro absurdo. Foram respondidos de imediato por Marx: “para o burguês, sua mulher nada mais é do que um instrumento de produção. Ouvindo dizer que os instrumentos de produção serão explorados em comum, ele conclui, naturalmente que haverá comunidade de mulheres. Não imagina que se trata precisamente de libertar a mulher do seu papel atual de mero instrumento de produção”.

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Apenas para lembrar, foi com a Revolução Bolchevique que se estabeleceu a igualdade de direitos entre homens e mulheres na Rússia. Em 1919, Lênin escreveu que “no decorrer de dois anos, o poder soviético em um dos mais atrasados países da Europa fez mais para emancipar as mulheres e tornar seus direitos iguais aos do sexo 'forte' do que todas as repúblicas 'democráticas' avançadas e esclarecidas do mundo nos últimos 130 anos”.

Lênin ainda argumentou que “conhecimento, cultura, civilização, liberdade – em todas as repúblicas capitalistas burguesas do mundo, todas essas palavras bonitas são combinadas a infames, repugnantes e brutais leis nas quais as mulheres são tratadas como seres inferiores, leis que lidam com direitos no casamento e divórcio, que falam sobre o status inferior de uma criança nascida fora do casamento quando comparada a uma criança ‘legítima’, leis que garantem privilégios aos homens, leis que humilham e insultam as mulheres”.

Portanto, “a República Soviética, a república de trabalhadores e camponeses, prontamente exterminou essas leis e não deixou pedra sobre pedra na estrutura da fraude e da hipocrisia burguesa”, declarou Lênin. Além disso, as mulheres também tinham igualdade de direitos políticos. Já na década de 1920, as mulheres russas faziam parte dos conselhos de 600 cidades e vilas soviéticas, as principais instituições de poder do país.

Para falar a verdade, alguns cidadãos provenientes da burguesia, passaram a desprezar os subterfúgios ideológicos da classe a que pertenciam, sendo levados por motivos de inteligência e consciência, a aderir a causa do proletariado. Infelizmente, alguns ficam no meio do caminho. O reconhecimento de justiça da causa operária, segundo Marx é dificultado pela propagação de doutrinas que lançam distúrbio sobre o conceito de “socialismo”. Marx nos mostra no Manifesto, algumas dessas correntes: a de Karl Grun[2], a de Proudhon, a persistência dos sonhadores utopistas, o “socialismo” feudal (que se limitava a “aconselhar” as classes dominantes a “atenuarem” a exploração) etc.

Marx, após suas críticas aos conceitos teóricos que causavam confusão, termina o Manifesto com o lema da Liga dos Comunistas: “os proletários nada têm a perder a não ser as suas algemas. Têm um mundo inteiro a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos!”.

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Ainda hoje, o Manifesto pode ser considerado a melhor introdução ao estudo do pensamento de Marx. Já transcorridos exatos 174 anos desde que ele foi escrito, sempre nos surpreendemos como esse documento resistiu à ação do tempo, o que provoca uma enorme impressão a quem o lê. Quem o lê, fica deslumbrado, segundo o padre Henri Chambre[3].

               

Antonio Manoel Mendonça de Araujo é professor de Economia, conselheiro do Sindicato dos Economistas de Minas Gerais (Sindecon) e ex-coordenador da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (Abed-MG)

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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Notas de rodapé:

1. Karl Heinzen (22/02/1809 – 12/11/1880), autor revolucionário alemão. Defendia a violência terrorista contra dinastias dominantes e populações civis não envolvidas como um meio para um fim.

2. Karl Grun (30/09/1817 – 18/02/1887), jornalista, filósofo, técnico político e socialista alemão.

3. Henri Chambre (13/01/1908 – 08/10/1994), padre jesuíta francês, resistente durante a II Guerra Mundial, teólogo e eclesiástico, sovietologista.

 

Edição: Larissa Costa