O cartão postal de Belo Horizonte, capital mineira, está novamente ameaçado. Depois de passar por projetos minerários que destruíram seu lado “invisível”, mais um empreendimento entra em votação nesta sexta-feira (25). O projeto da empresa Taquaril poderá retirar 30 milhões de toneladas de minério de ferro do local e entra em contradição com o processo de tombamento da serra, já iniciado.
A votação do licenciamento está em pauta no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). O Instituto Guaicuy tenta impedir a votação por meio de uma Ação Civil Pública, ajuizada na segunda-feira (21).
A principal argumentação do Guaicuy é que o processo de tombamento da Serra do Curral já se iniciou e, portanto, o local possui proteção provisória. A justificativa se embasa no artigo 10 do Decreto-Lei 25, de 1937, que determina que o processo de tombamento pode ser iniciado pela notificação do órgão competente, e, assim, já constaria como tombamento provisório, sendo equiparado ao definitivo em termos de proteção.
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O estudo de tombamento foi feito pelo Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), dentro do processo administrativo número PTE – 163/2018, que já começou e aguarda votação do Conselho Estadual de Patrimônio Cultural (Conep).
Pedro Andrade, um dos advogados autores da ação, explica que a aprovação do projeto Taquaril, neste momento, iria travar a proteção da Serra do Curral. Por isso, a ação pede que o licenciamento não seja votado nesta sexta pelo Copam. Mas, caso isso aconteça, pede ainda que a 5ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte a considere nula por antecipação.
“Entendemos que colocar o projeto em votação é totalmente imaturo, pois existe uma série de dúvidas e uma série de adequações que deveriam ser feitas”, aponta.
Tombamento encontra resistência
O governo de Romeu Zema (Novo) tem sido denunciado como forte oposição à proteção por lei da Serra do Curral. Essa afirmação consta em carta divulgada na segunda-feira (21) pelos conselheiros estaduais do Patrimônio Cultural de Minas Gerais, integrantes do Conep.
Entre as denúncias, eles citam a deslegitimação do estudo feito pelo Iepha, que embasa o tombamento da Serra do Curral, e também “manobras jurídico-administrativas” no Conep que estariam atrasando a aprovação desse estudo.
O Conep é subordinado à Secretaria de Estado de Cultura e tem como presidente o secretário de Estado de Cultura. É composto também pelo presidente do Iepha e por mais 19 representantes de instituições e da sociedade civil.
Cronologia
O estudo foi concluído em 2020 e aprovado pelo Iepha nos primeiros meses de 2021. A orientação era de que o Conep o apreciasse em sua primeira reunião do ano. Porém, nenhuma reunião do órgão foi convocada durante todo o ano de 2021.
Depois de forte mobilização, o Conep foi convocado para uma reunião em 21 de dezembro de 2021, em que não houve debate sobre o estudo realizado, mas sim um “informe” de que sua aprovação seria estendida por mais de seis meses. Segundo os conselheiros, a justificativa seria estimar os “impactos econômicos” do tombamento, “procedimento nunca visto em qualquer ato de tombamento”, diz a carta.
“Nós exigimos que seja convocada imediatamente uma reunião extraordinária para ser reconhecido o tombamento provisório da Serra do Curral”, completa a arquiteta e urbanista Débora Queiroz, integrante do Conep e uma das signatárias da carta. Ela também destaca a necessidade de uma recomposição do Conep de forma transparente e democrática, já que os mandatos se encerraram em janeiro deste ano.
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O governo estadual afirmou que a demora na aprovação do estudo tem relação com os municípios que serão envolvidos no tombamento: Belo Horizonte, Nova Lima e Sabará. “Os municípios contemplados questionaram, na Justiça, sobre as consequências dessa proteção em seus territórios”, informa. O Iepha teria se interessado em apresentar os estudos às administrações de cada localidade, o que foi acolhido pelo Ministério Público de Minas Gerais.
A administração não respondeu sobre a possível ilegalidade de votar um projeto minerário para uma área que já iniciou o processo de tombamento.
Mas o que o governo mineiro quer?
Apesar de Minas Gerais ter sofrido fortemente com as consequências da mineração, aparentemente, possui uma administração que propicia ainda mais a exploração no estado. Apenas em novembro de 2021, o governo de Romeu Zema assinou cinco parcerias com empresas mineradoras. E a tendência tem sido a mesma desde o início da gestão.
“O governo, de fato, está tentando emplacar essa mineração na Serra do Curral, apesar de todos esses problemas que temos dito”, analisa o advogado Pedro Andrade. “Assim que saiu o estudo de tombamento, o governo fez uma crítica dizendo que violava a lei da iniciativa privada e a liberdade econômica”, relembra Pedro.
Edição: Larissa Costa