A comunidade acadêmica da área da educação conhece muito bem Luciano Mendes Faria Filho. Afinal, com significativa produção nesse campo, particularmente da história da educação, com artigos, livros, participação em eventos, bancas e atividades de extensão, ele é autor já há muito tempo academicamente consagrado.
Agora, contudo, sob a alcunha de Luciano Mendes, ele põe em circulação, em apenas três anos, quatro obras literárias (“A primeira página”; “Entre mulheres”; “Homens de bem” e “A morte do professor”), que deverão consagrá-lo na ficção do mesmo modo que já o é na produção acadêmica. Apesar da publicação recente, são textos que vinham sendo elaborados há mais de dez anos e atestam o grau de maturidade atingido tanto pelo pesquisador quanto pelo ficcionista.
Em “A primeira página”, o texto que dá nome ao livro tem uma narrativa forte, consistente e que desperta a curiosidade sobre como o Pereira se safa do imbróglio em que se meteu com o seu Lucas. E a Jandi, então? Aliás, erotismo pouco é bobagem. “Entre mulheres” é uma maravilha! Trata com rara sensibilidade alguns temas sociais relevantes numa obra literária.
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Na mesma linha vem “Homens de bem”. De novo, um ótimo livro, com textos muito bem escritos, dinâmicos e que tratam de temas relevantes da atualidade sem resvalar para um "moralismo" ou para uma visão maniqueísta. O conto que dá nome ao livro deixa o leitor inculcado, porque é apresentado e concluído como excertos próprios de uma pesquisa feita nos moldes acadêmicos. Contudo, os documentos “transcritos” estão em estilo demasiadamente literário, o que combina pouco com a origem deles. Além disso, se encaixam tão perfeitamente que parecem ter sido produzidos para compor uma única peça. O que é realidade e o que é ficção em “Homens de bem”?
Nem deu tempo de guardar os três na estante e eis que aparece “A morte do professor”. Ambientada em Belo Horizonte do final dos anos 1920 e tendo o Primeiro Congresso de Instrução Primária de Minas Gerais como pano de fundo, a trama fictícia, mais uma vez, se estabelece em torno de elementos caros ao pesquisador e recorrentes nos quatro títulos: a imprensa, as questões sociais, a vida cotidiana e, claro, tudo isso temperado com paixão e desejo.
Como nos três títulos anteriores, a narrativa é excelente. É um texto que desperta a atenção do/a leitor/a desde o início, mantém o ritmo forte do enredo e organiza as falas dos personagens de modo cativante, consistente, sedutor e, principalmente, mobiliza o leitor para o desfecho. Afinal, quem matou o professor Clóvis Mendonça?
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A despeito da advertência ao final, é inevitável ao/à leitor/a que conhece um pouco da história de Minas do início do século 20 fazer associações entre a criação literária e certos dados da realidade, uma vez que muitas personalidades da vida pública são trazidas para a cena. Essa é uma característica recorrente na literatura e temos muitos mestres nessa arte. Da minha parte, acho que nem a literatura precisa prestar contas com a história e nem a história precisa ser escrita em estilo literário, mas quando as duas se encontram, ambas nos permitem ampliar nossa capacidade de fruição estética e de conhecer melhor nosso passado, refletir sobre quem somos e sinalizar para as expectativas que poderemos depositar no nosso futuro.
História e literatura. As duas se encontram e se encaixam perfeitamente na lavra de Luciano Mendes.
Serviço:
Livro: A morte do professor
Autor: Luciano Mendes
Editora: Caravana Grupo Editorial
João Valdir Alves de Souza é professor titular de sociologia da educação da Universidade Federal de Minas Gerais.
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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa