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Área de cerrado equivalente a um terço de BH pode ser desmatada para dar lugar a agronegócio

Empreendimento em Bonito de Minas propõe desmate de 10 mil hectares em região que abriga espécies raras

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |

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A área faz divisa com o Parque Estadual do Veredas do Peruaçu e pode preservar uma vegetação primária do cerrado, ou seja, intocada pela ação humana - Foto: Ravi Mariano

Minas Gerais pode protagonizar, sob aval do governo, um dos maiores desmates de cerrado no Brasil. É o que afirmam biólogos e ambientalistas que acompanham a disputa em torno da finalidade dada à Fazenda Nova Buriti, em Bonito de Minas, no Norte do estado.

O terreno, com uma extensão de 10,3 mil hectares é de propriedade da empresa BrasilAgro, que, em fevereiro deste ano, entrou com um pedido de licença prévia de instalação no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) para a implementação de um projeto de agronegócio no território.

 

No entanto, especialistas alertam que a região é de extrema importância para a fauna e para a flora do estado. A área faz divisa com o Parque Estadual do Veredas do Peruaçu e pode preservar uma vegetação primária do cerrado, ou seja, intocada pela ação humana.

“A gente sabe que na área uma pequena parte foi utilizada na década de 1970 para plantio de eucalipto. O restante da área diretamente afetada [caso o empreendimento seja aprovado] não teve qualquer utilização em larga escala. Então, a gente pode falar de cerrado primário, pois são áreas intocadas”, alerta Lígia Vial, assessora jurídica da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA).

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Lígia foi uma das responsáveis pelo parecer técnico apresentado ao Copam, que questiona diversos trechos do pedido de licenciamento. “A área não é propícia para esse empreendimento porque quando tira a vegetação, vira areia. A que custo seria possível plantar capim para gado? A própria empresa já afirmou isso. A aptidão da região é para a coleta extrativista de frutos do cerrado”, argumenta.

Além do parecer, a AMDA, a Associação para a Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro (Angá) e outras entidades ambientais que acompanham a pauta também apresentaram, em 17 de março, um requerimento ao Ministério Público Estadual solicitando a suspensão do licenciamento.

Local é abrigo de espécies ameaçadas de extinção

Tanto a Fazenda Nova Buriti quanto o Parque Estadual Veredas do Peruaçu estão inseridos na Área de Proteção Ambiental Cochá e Gibão, que abriga um dos afluentes do Rio São Francisco.

Apesar do terreno em disputa não ser oficialmente protegido pelos órgãos ambientais, especialistas afirmam que a área é abrigo de importantes espécies da flora e da fauna. Entre eles, o cachorro do mato vinagre, animal extremamente raro no país, ameaçado de extinção.


Cachorro do mato vinagre / Foto: Zoológico do DF

"Há pouquíssimos registros do cachorro do mato vinagre nos últimos 30 anos. Cada grupo desses animais precisa de 14 mil hectares para sobreviver", explica o biólogo Gustavo Malacco. Na avaliação do especialista, o EIA/Rima apresentado pela empresa também desconsidera os impactos que o empreendimento pode trazer às comunidades tradicionais que há séculos vivem na região.

“Qual comunidade tradicional que tem acesso à consulta pública que é publicada na internet? Isso é um grande desrespeito com as pessoas que vão ser impactadas. É uma imoralidade gigante”, critica.

Terra devoluta

Além dos problemas ambientais e sociais apontados pelos ambientalistas, Lígia Vial explica que o território em questão também pode estar envolvido em um processo de terra devoluta, ou seja, de posse do governo.

Ela relata que antes da empresa BrasilAgro dar início ao pedido de licenciamento para o empreendimento, a AMDA já havia solicitado ao Instituto Estadual de Florestas (IEF) uma investigação sobre a origem do território.

“Nós descobrimos, com perícia e outras investigações, que houve uma falsificação de documento em grande parte dos terrenos daquela região, inclusive nesse. Documentações feitas muito antes da BrasilAgro comprar a terra”, aponta.

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“Há indícios de que a terra é devoluta e isso facilita muito a criação de uma Unidade de Conservação no território, porque a terra já pertenceria ao Estado”, completa Lígia. Atualmente o processo está em investigação no IEF.

Ela ainda ressalta que nos últimos quatro anos nenhuma unidade de conservação foi criada pelo governo de Romeu Zema (Novo). Em contrapartida, para a ativista, os processos de licenciamento ambientais estão cada vez mais fragilizados.

Trâmite no Copam

No dia 22 de março, o processo de licenciamento da BrasilAgro foi suspenso após o pedido de diligência apresentado pela presidenta do Copam, Vanessa Naves. O debate não está previsto na pauta da próxima reunião do conselho e, de acordo com ambientalistas, que acompanham o tema, por enquanto, não há previsão de quando deve ser retomado.

Outro lado

Sobre os questionamentos ambientais e sociais com relação ao empreendimento, em nota a BrasilAgro informou que o projeto vem sendo construído “a partir de uma discussão democrática com a sociedade civil e com a comunidade local, e que o cultivo de alimentos na propriedade só ocorrerá após autorização das autoridades envolvidas”. A empresa informou ainda que “mais de 50% das terras serão preservadas”.

A reportagem também entrou em contato com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente para comentar o caso, mas não obteve retorno até o fechamento do texto.

Edição: Larissa Costa