Desde o último dia 14, os dias de Jairo dos Santos, Iago Oliveira e Pablo Oliveira têm sido de apreensão. A data marca o desfecho de uma operação de despejo, que culminou na prisão dos três militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) de Montes Claros, no Norte de Minas Gerais. Desde então, os manifestantes denunciam que têm sofrido ameaças de morte e perseguição de jagunços. Por isso, estão refugiados em local seguro que não foi divulgado.
A ocupação Tereza de Benguela, alvo do despejo, teve início no dia 13 de maio, quando mais de 50 famílias reivindicavam o cumprimento da função social de um terreno de 30 hectares na cidade. A área, de acordo com o movimento, integra, desde 2016, uma Zona Especial de Interesse Social e é de posse da família de Jairo Ataíde (DEM), ex-prefeito de Montes Claros. Ainda de acordo com o movimento, os donos do terreno devem ao governo cerca de R$ 8 milhões em IPTU.
Desapropriação, prisão e ação de jagunços
Jairo dos Santos, integrante da coordenação nacional do MTST, relata que já nas primeiras horas da ocupação, o local foi cercado pelos proprietários do terreno e por jagunços. As vias de acesso foram bloqueadas com carregamentos de terra, o que impossibilitou a entrada de água, de alimentos e também a presença de advogados e apoiadores da ação. “Os proprietários diziam que iriam fazer justiça com as próprias mãos”, relembra. Segundo Jairo, os dizeres eram: “saiam daqui que vocês vão morrer”.
Ainda de acordo com Jairo, a Polícia Militar (PM) abandonou a ocupação após a chegada dos jagunços e, mesmo com os chamados da comunidade, não retornou ao local. “Quando eles [jagunços] conseguiram derrubar a maioria das habitações, a PM entrou, mas não fez nada. Os policiais ficaram assistindo aos jagunços derrubando as barracas. A polícia cumprimentou todos os jagunços”, denuncia.
Com a ação, as famílias foram retiradas do terreno. Nove delas, que ficaram em situação de rua, foram encaminhadas para outra ocupação do movimento. Jairo afirma que a PM tentou impedir a realocação dessas famílias na ocupação Marielle Franco, que não está sob ordem de despejo. Nesse conflito, foi decretada a prisão dos três militantes.
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Após a prisão, o MTST ficou cinco horas sem notícias dos manifestantes, que não foram encaminhados para a delegacia da cidade. Nas redes sociais, parlamentares cobraram respostas do governo sobre o paradeiro dos militantes.
“As pessoas só nos acharam porque, num golpe de sorte, consegui pegar meu celular na mesa do escrivão e mandar a localização num grupo pedindo socorro”, conta Jairo. Com a ação do militante, integrantes do movimento, parlamentares e defensores dos direitos humanos se dirigiram para o quartel onde estavam os detidos.
Caso foi denunciado internacionalmente
Na última sexta (20), a deputada federal Áurea Carolina, a vereadora de Belo Horizonte Bella Gonçalves, ambas do PSOL, o deputado federal Rogério Correia (PT) e Izadora Brito, da coordenação nacional do MTST, denunciaram a situação à Organização das Nações Unidas (ONU), à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização de Estados Americanos (OEA), ao Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e ao Conselho Estadual de Direitos Humanos (Conedh-MG).
“Não podemos permitir que esse tipo de abuso aconteça sem qualquer consequência para os agressores e para os gestores públicos envolvidos. Impunidade gera ainda mais violência. O povo tem quem o defenda e aqui estamos para colocar a boca no mundo e fazer a denúncia”, diz o documento.
Além disso, o movimento também entrou com uma ação na Corregedoria da Polícia Militar e no Ministério Público e aguarda a apuração. No entanto, as perseguições e ameaças contra os manifestantes prosseguem. “Tem jagunço procurando a gente pela cidade, parado na porta do nosso serviço”, relata Jairo.
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O militante explica também que uma onda de ataques e incitações de violência contra os manifestantes têm sido articuladas nas redes sociais e em portais ligados ao grupo político oposto ao movimento. “Tem a milícia armada, mas também tem a milícia digital. Agora, a gente é alvo não só do grupo que reprimiu a gente, mas de qualquer um que concorde com essa postura”, denuncia.
O outro lado
A reportagem tentou contato com a assessoria de imprensa da Polícia Militar, por e-mail e por telefone, para um posicionamento da entidade sobre o caso. No entanto, até o fechamento deste texto, não houve resposta.
A equipe também tentou contato com Jairo Ataíde, mas não conseguiu localizar o ex-prefeito. A reportagem segue aberta para um posicionamento dos envolvidos.
Edição: Larissa Costa