Costuma-se “comemorar” no Brasil, em 02 de junho o dia, sem impostos, mas o que, de fato, se comemora nesse dia? Vamos aprofundar a análise desse tema.
Na era moderna, toda sociedade organizada tem como base a presença do Estado. As sociedades reconheceram o Estado como necessário para manter a estabilidade social (pacto social) e garantir direitos. Daí decorre que não existe direitos sem Estado. Este ente (Estado) precisa de recursos (tributos) para exercer sua função social. Daí o conceito de Estado Fiscal.
Desta forma, não existe Estado sem tributos, nem direitos sem Estado. Com este referencial teórico, fica evidenciado que defender dia sem imposto é defender dia sem Estado e dia sem direitos, ou seja, é defender a barbárie, o que não é ou não deveria ser digno de comemoração e aplausos.
Claro que cada um é livre para se expressar, mas que expresse esclarecido e consciente. Assim, se ignorar os fatos, será uma opção, uma escolha, não um desconhecimento.
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Sigamos! Como o Estado Fiscal depende dos impostos, dia sem imposto implica dia sem Estado, sem escolas públicas, sem funcionários que organizam o trânsito, sem policiais para manter um nível mínimo de segurança, sem vacinação, postos de saúde e hospitais públicos, sem programas de transferência de rendas, sem leis e sem sistema judiciário, sem coleta de lixo, sem iluminação pública, sem controle do tráfego aéreo, sem forças de segurança e uma série de outros serviços prestados silenciosa e diariamente pelos servidores públicos para todos os cidadãos.
Como você acha que seria uma sociedade assim, sem impostos e sem Estado? Uma barbárie, como na idade média. Ainda que o objetivo explícito da campanha “Um dia sem impostos”, que muitos defendem, seja divulgar que os preços seriam menores se retirados os impostos (visão individualista e nada solidária), o objetivo implícito só pode ser o de enfraquecer ainda mais a sociedade e aumentar as desigualdades. Sobre o tema, vale visitar o site da organização Oxfam.
Afinal, sem os impostos cobrados, não há Estado, sem Estado não há direitos, todos os serviços públicos não serão prestados e a maioria da sociedade será prejudicada. O benefício imediato pode até ser prazeroso para o bolso, mas os efeitos colaterais são muitos e duradouros.
Claro que pagar preços menores faz brilhar os olhos de todos, mas, daí a defender dia sem impostos, vendendo a ilusão de que sem impostos a vida seria melhor, é sinal de desconhecimento ou má fé.
A questão tributária é bem mais complexa e não comporta soluções simplistas. A carga tributária brasileira, cerca de 31,64% do PIB em 2020, segundo dados do Tesouro Nacional, pode até ser repensada, mas isso depende da sociedade que queremos. O problema maior da carga tributária brasileira situa-se em quem paga e quem não paga a conta (a carga tributária do rico é bem menor que a carga tributária do pobre).
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Diferentemente do que predomina no mundo, no Brasil, a carga tributária é calcada nos tributos sobre consumo, nos quais os menos aquinhoados pagam mais. No modelo brasileiro, é baixa ou nula a tributação sobre Lucros e Dividendos, além de existir uma grande quantidade de desarrazoadas renúncias fiscais (gasto tributário).
É urgente que o Sistema Tributário Brasileiro, assim como a divisão mais equitativa dos recursos arrecadados (gasto público), seja revisto e reformado. Precisamos de um sistema tributário melhor, mais justo, e de um gasto público de qualidade.
Não é de um dia sem impostos que precisamos. O que precisamos é dividir melhor a conta e termos mais solidariedade. Muitos dos que defendem o dia sem impostos podem pagar por plano de saúde, escola particular, usam carros ou até helicópteros, frequentam restaurantes de luxo, desfrutam de férias em resorts, mas a realidade da maior parte dos brasileiros é outra e, para esta parcela da população, um dia sem impostos é mera ilusão, de efeito amargo.
Dia sem impostos é dia sem Estado, é dia sem solidariedade, é dia sem pensar nos 90% da população brasileira que dependem diariamente dos serviços públicos de educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, etc.
Agora, que não cabe mais alegar desconhecimento, você vai mesmo escolher comemorar dia sem impostos? Eu não!
Marco Tulio da Silva é advogado, economista e vice-presidente da Associação dos Funcionários Fiscais de MG (Affemg).
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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Wallace Oliveira