A vitrola e os discos funcionam como combustíveis para lhe dar forças para sair daquele “inferno”
Do alto do morro, que parece mais um penhasco, a vida e os sonhos passam como nuvens passageiras. Nascimento parece não acreditar mais na vida. A cada dia, ele morre um pouquinho.
Desempregado, sem família e perambulando pelas ruas, agora, vive perto das nuvens. Ele diz que fica mais próximo do céu, onde, em muito breve, será sua próxima morada.
Ele olha ao redor e não consegue ter qualquer motivação. Pensa alto:
- Como sonhar aqui? Como ter forças neste lugar?
Urubus e ratos disputam a comida com toda a gente.
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Num cantinho de seu barraco mal-acabado e sujo, uma vitrola dessas antigas que achou no lixo. A vitrola e os discos funcionam como combustíveis para lhe dar forças para sair daquele “inferno”. Um adesivo chama atenção na vitrola: “a vitória chegou!”.
Coloca na vitrola, pela milésima vez, um disco dos Racionais, o “Sobrevivendo no inferno”, e canta junto e bem alto para Deus ou alguém escutar:
Minha intenção é ruim, esvazia o lugar
Eu tô em cima, eu tô a fim, um, dois pra atirar
Eu sou bem pior do que você tá vendo
O preto aqui não tem dó, é 100% veneno
A primeira faz bum, a segunda faz tá
Eu tenho uma missão e não vou parar
Meu estilo é pesado e faz tremer o chão
Minha palavra vale um tiro, eu tenho muita munição
Na queda ou na ascensão, minha atitude vai além
E tem disposição pro mal e pro bem.
Veja bem, ninguém é mais que ninguém
Veja bem, veja bem, eles são nossos irmãos também
Mas de cocaína e crack, Whisky e conhaque
Os manos morrem rapidinho sem lugar de destaque.
Racionais Capítulo 4, Versículo 3.
Rubinho Giaquinto é covereador da Coletiva em Belo Horizonte.
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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa