Minas Gerais

LENTIDÃO

Tombamento já poderia ter ocorrido em 2021 e Serra do Curral já estaria protegida da mineração

Na Assembleia Legislativa, deputada denunciou, na quinta (30), que a Gute Sicht retira 40 caminhões de terra por dia

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Em 2011, houve uma iniciativa para que a Serra do Curral fosse tombada, área localizada nos municípios de Nova Lima, Sabará e Belo Horizonte - Foto: Grupo Pé no Chão/Divulgação

Durante uma reunião na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na quinta (30), o secretário de Estado de Cultura e Turismo, Leônidas Oliveira, não soube dar detalhes a respeito do processo de tombamento da Serra do Curral. Mesmo após o decreto do governador Romeu Zema (Novo), que reconhece a Serra como bem de relevante interesse cultural de Minas Gerais, o secretário não explicou o porquê a mineradora Gute Sicht continua atuando no bairro Taquaril, em Belo Horizonte.

Segundo a deputada Beatriz Cerqueira (PT), a mineradora retira aproximadamente 40 caminhões de terra por dia, durante a madrugada, da região que deveria ser protegida. A atividade da empresa funciona por meio de termo de ajustamento de conduta (TAC) celebrado pela Gute Sicht com a Superintendência Regional de Meio Ambiente Central e Metropolitana (Supram).

“O governador dá entrevistas dizendo que a Serra está protegida, mas a mineração continua. Como a Serra pode estar protegida se a mineração está acontecendo? E o município de Belo Horizonte está contra. Cabe ao governo revogar esse TAC. O que ele está fazendo para impedir o funcionamento da Gute Sicht?”, questionou a deputada durante a reunião.

Embora o governador tenha cedido às pressões e assinado o decreto no dia 14 de junho, para especialistas, o tombamento da Serra do Curral já poderia ter ocorrido no ano passado e, portanto, a Serra do Curral já estaria protegida das ameaças da mineração. Porém, segundo denúncias, o governo de Minas Gerais dificultou e atrasou o processo no Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep).

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Uma década para não tombar

Em 2011, houve uma iniciativa para que a Serra do Curral fosse tombada, área localizada nos municípios de Nova Lima, Sabará e Belo Horizonte. Na época, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), provocado pelo Ministério Público, consentiu com o tombamento.

Contudo, sete anos depois, em 2018, o Iepha formalizou o procedimento. No ano seguinte, o Instituto contratou a consultora Praxis Projetos e Consultoria Ltda para elaborar um dossiê que atestasse a importância da Serra. O estudo foi concluído e validado em 2020.

A partir de então, o Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep), um órgão composto por representantes da sociedade civil, do Iepha e da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo, deveria pautar a questão em sua primeira reunião. Porém, o Conselho passou quase todo o ano de 2021 sem se reunir.

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No dia 21 de dezembro, enfim, o tombamento chegou a ser pauta de uma reunião ordinária, mas os dois representantes do governo tentaram impedir o prosseguimento da pauta, inclusive com o encerramento repentino da reunião.

O encontro foi transmitido ao vivo pelo YouTube e gravado. Porém, na última semana, o vídeo foi definido como conteúdo privado e não está mais acessível. A reportagem solicitou a liberação do vídeo à Secretaria de Estado de Cultura, por meio do Portal da Transparência de Minas Gerais.

Governo alegou ação civil pública

Na reunião do Conep, o secretário de Cultura, Leônidas Oliveira, e o presidente do Iepha, Felipe Pires, alegaram que a deliberação estaria impedida, em razão de uma ação civil pública do Instituto Guaicuy.

De acordo com Pedro Andrade, advogado do Instituto Guaicuy, o pedido da ação, que posteriormente foi indeferido pelo juiz, não inviabiliza a deliberação do Conep e, portanto, a alegação dos representantes do governo não procede. “Em nenhum momento pedimos que fosse cancelada a reunião do Conep. Pedíamos que o governo pautasse o estudo de tombamento na reunião do Conep”, explica.

Tombamento provisório

De acordo com o advogado Daniel Queiroga, com base na legislação, o tombamento provisório da Serra do Curral poderia ter sido efetuado pelo Conselho, assim que o estudo encomendado pelo Iepha ficou pronto, em 2020.

“O tombamento provisório tem os mesmos efeitos do tombamento definitivo, mas ele dura apenas enquanto o processo administrativo estiver acontecendo. Se o tombamento provisório tivesse ocorrido, a mineração da Serra do Curral pela Tamisa não teria sido autorizada”, explica.

Escuta seletiva

Defensores da Serra do Curral também destacam a diferença entre a forma como o governo tratou o processo de tombamento e, por outro lado, a deliberação que autorizou a mineração.

No primeiro, o governo fez um acordo com o Ministério Público prevendo uma suposta escuta da sociedade civil, com audiências públicas. No segundo, a definição tomada no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) não promoveu essa escuta. Além disso, o governador Romeu Zema chegou a dizer que quem não entende do assunto deveria ficar calado.

Interesse eleitoreiro

No dia 14 de junho, em meio a pressões e muitas críticas, Zema assinou um decreto que reconhece a Serra como bem de relevante interesse cultural e determinou que se tomassem providências para o tombamento estadual e a criação de um parque metropolitano.

O decreto pode ter sido um passo importante para o tombamento provisório da Serra. Para o advogado Pedro Andrade, além de insuficiente, a medida pode ter um “caráter eleitoreiro”. Seus efeitos poderiam ser revertidos após a disputa eleitoral.

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“O decreto não impede que se aprove depois um novo estudo de tombamento, diferente do atual, e esse novo estudo de tombamento traga modificações na demarcação das áreas”, observa.

Edição: Larissa Costa