Minas Gerais

DESINVESTIMENTO

Com Zema (Novo), Minas não tem política de habitação, afirmam movimentos

Em 2022, a despesa com moradia é mil vezes menor que com segurança pública

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Gil Leonardi - Imprensa MG

As chuvas do fim do ano se aproximam e, novamente, o drama das famílias sem casa ou vivendo em áreas de risco tende a se repetir. Se entre outubro de 2021 e fevereiro de 2022 o estado teve cerca de 70 mil pessoas desabrigadas ou desalojadas, segundo dados da Defesa Civil, não houve, por outro lado, políticas estaduais que garantissem o acesso à moradia adequada.

Um estudo da Fundação João Pinheiro mostra que Minas é o segundo estado com maior déficit habitacional no Brasil, com 496 mil famílias em situações de gasto excessivo com aluguel, habitação precária ou coabitação. As informações são de 2019, mas, de acordo com o Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD), tudo leva a crer que esse indicador piorou.

“Houve uma pandemia, a economia não cresceu, tivemos maior concentração de renda, o desemprego persiste, a informalidade aumentou, o poder de compra dos trabalhadores caiu, o preço dos aluguéis subiu e os governos não fizeram política de habitação. Então, não há porque esperar uma situação melhor”, argumenta Wallace Oliveira, da coordenação do MTD.

Um levantamento feito pelo mandato da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) aponta que, entre 2018 e 2022, a função “habitação” teve uma redução de investimentos em Minas Gerais. Por outro lado, tem aumentado o número de imóveis vendidos pelo governo, pertencentes à Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (Cohab).

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Para debater o assunto, na última semana, Beatriz presidiu uma reunião da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa, como parte das atividades de escuta da população e monitoramento do governo, promovidas pelo projeto Fiscaliza Mais.

“Nós sempre buscamos cumprir esse papel de fiscalização da Assembleia, pois é uma forma como a população pode acompanhar e ver temas que são relevantes para a vida dela. E morar é um tema muito significativo nas nossas vidas, com dignidade, em locais onde o Estado dê a cada pessoa as condições estruturais do território”, afirma a deputada.

Minas é o segundo estado com maior déficit habitacional no Brasil

Na audiência, estiveram presentes representantes de movimentos de luta por moradia, da Defensoria Pública de Minas Gerais, estudiosos do assunto, bem como o diretor-presidente da Cohab, Weber Oliveira, e o superintendente de Integração e Segurança Alimentar e Nutricional da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), Henrique Carvalho.

Ao fim do debate, Beatriz avaliou que o governo não respondeu satisfatoriamente às questões colocadas e, por isso, uma nova audiência terá que ser realizada. “Vocês não prestaram informações à Assembleia, de modo que nós pudéssemos fazer uma análise da política habitacional”, criticou.

Moradia não é prioridade do governo Zema

Dados do portal Transparência MG mostram que, em 2022, o gasto com habitação foi cerca de mil vezes menor que o gasto com segurança pública. A segurança tem cerca de R$ 12 bilhões de despesa empenhada, enquanto a habitação tem R$ 12 milhões.

“O direito à habitação foi jogado para escanteio, a importância dada a ele é menor do que deveria ser. Por outro lado, as políticas públicas não têm a efetividade necessária para a garantia desse direito que todos temos”, comenta Iracema Generoso, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) no Departamento de Minas Gerais.

A arquiteta Marina Sanders, integrante do Coletivo Habite a Política, lembra que, pela Constituição, a garantia do direito à moradia, com uma casa adequada, infraestrutura e serviços urbanos, é uma competência comum da União, de estados e municípios. Esse desafio, segundo ela, só pode ser enfrentado de maneira conjunta.

“Tem que ter uma força-tarefa, tem que ter plano, investimento. E, ainda assim, é difícil. Hoje, o que vemos, é o contrário. Tivemos, desde o golpe de 2016, a dissolução do Ministério das Cidades e corte da verba federal para moradia. No governo do estado, a Diretoria de Promoção de Política Habitacional está dentro da Superintendência de Integração e Segurança Alimentar e Nutricional. Então, há uma diminuição da importância da habitação”, pontua.

Desmonte da Cohab

Movimentos de luta por moradia denunciam que o governo Zema (Novo) opera um desmonte da Cohab, companhia responsável por implementar a política de habitação no estado. O desmonte, segundo as organizações, tem sido feito com retirada de investimentos e venda de imóveis da companhia.

De fato, há um ano, em audiência da Comissão Extraordinária de Privatizações, o secretário de Desenvolvimento Econômico, Fernando Passalio, defendeu que se abra mão da companhia. “Precisamos de ter uma política habitacional, mas não uma Cohab”, disse, mas não explicou como essa política seria executada.

Na mesma época, reportagem do Brasil de Fato mostrou que o governo tentava leiloar 1,5 milhões de metros quadrados em imóveis públicos. Em tese, o dinheiro das vendas abasteceria o Fundo Estadual de Habitação, mas, como denunciou o Brasil de Fato, o recurso pode cair no caixa único do governo e ser gasto em outras áreas, como ocorreu com os recursos do Fundo Estadual de Erradicação da Miséria.

Título de propriedade não resolve o déficit

De acordo com Weber Dias, presidente da Cohab, no último período, foram entregues 6 mil títulos de propriedade em 200 cidades e outros 9 mil serão entregues até junho de 2023. Além disso, 20% das casas regularizadas serão objetos de melhorias de até R$ 22 mil.

Jairo Pereira, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), ressalta que a regularização fundiária pode ser uma política importante para dar segurança jurídica, mas não é a política adequada para atacar o problema do déficit.

“Onde a Cohab estava nas chuvas do ano passado, quando a avenida Bandeirantes, em Ribeirão das Neves, foi inundada e 132 famílias não tinham para onde ir e estavam com as casas em risco para cair? Ali perto, fica a Fazenda da Mata, que foi a leilão. É mais barato arrecadar no mercado de imóveis ou fornecer lote urbanizado para a população?”, questionou.

Edição: Elis Almeida