O tema deste ano da celebração do Dia Mundial da Alimentação, 16 de outubro, “Não deixando ninguém para trás”, faz refletir que questões dessa natureza não são utópicas. Estamos falando de pessoas, de grupos sociais distintos, que são diretamente afetados por processos de exclusão social históricos, no mundo e no Brasil.
Papa Francisco, nas comemorações dos 75 anos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), afirmou que: “Para a humanidade, a fome não é só uma tragédia, mas também uma vergonha”.
Inúmeros são os desafios atuais, no que se refere à alimentação, saúde e nutrição. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o mundo desperdiça atualmente, 570 milhões de toneladas de alimentos, somente no ambiente doméstico.
No mundo, a média é de 74 quilos de alimentos desperdiçados por pessoa. No Brasil, a média anual por pessoa é de 60 quilos.
Outro dado alarmante, apresentado este ano, pela Rede Brasileira de Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN), refere-se aos 33,1 milhões de brasileiros que não possuem o que comer em seus lares, a expressão máxima da violação do Direito Humano à Alimentação Adequada. E mais da metade da população brasileira (125,2 milhões de pessoas) possuem algum grau de insegurança alimentar (leve, moderada ou grave), segundo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA).
Quem são os responsáveis?
Para alguns, não existem responsáveis diretos por tamanha iniquidade, por processos que levam as pessoas a não ter acesso a uma alimentação adequada e saudável, sobretudo em um país frutífero como o Brasil, responsável pela liderança na exportação de alguns grãos e diferentes tipos de carnes. Ademais, o Brasil possui uma legislação que garante o Direito Humano à Alimentação Adequada previsto na Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN de 2006) e na Constituição Federal, desde 2010.
Mais perverso ainda é culpabilizarmos os sujeitos sociais que se encontram nos processos de exclusão alimentar, como se fossem suas escolhas ou responsabilidades, sendo responsabilidade e dever do Estado brasileiro a garantia de uma alimentação adequada para todos e todas.
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Trazer todos juntos
Ressaltamos que seguir de mãos juntas, significa trazer todos juntos e juntas. Os que sofrem privação alimentar por ausência de acesso ao alimento, os sobrepesos, os obesos, os diabéticos, dentre vários outros que não conseguem acessar alimentos mais saudáveis.
A ausência de uma alimentação adequada e saudável, relaciona-se às questões de disponibilidade e acesso, no que tange ao consumo de alimentos industrializados e não saudáveis advindos da indústria de alimentos, conhecidos como os alimentos processados e ultraprocessados, como apresentado no Guia Alimentar Para População Brasileira, desde 2014 pelo Ministério da Saúde.
É importante um olhar atento para os portadores de alimentação especial, como, por exemplo, indivíduos portadores de doença celíaca, que em algum momento já vivenciou um processo de exclusão alimentar no seu dia a dia, por dificuldade de acesso ao alimento adequado para a sua saúde e qualidade de vida.
Para cumprir a realização de seguirmos juntos e juntas, precisamos de uma mudança societária, e perceber que todos somos corresponsáveis pelo processo em curso de iniquidade e exclusão alimentar vivenciado por muitos em nossa sociedade.
É urgente que a sociedade brasileira cumpra o Direito Humano à Alimentação Adequada, em suas diferentes dimensões, por meio de um diálogo demócratico com os gestores públicos, profissionais de saúde, educadores em seus diferentes níveis (ensino fundamental ao nível superior), pais e sobretudo aos responsáveis pela produção e distribuição de alimentos.
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Esse diálogo poderá fomentar decisões políticas estruturais de maneira que tenhamos ampliação no interesse e envolvimento da sociedade brasileira, em movimentos diversos que permeiam a alimentação.
Essas discussões dizem respeito ao futuro da humanidade e o desafio de tornar realidade o que hoje nos parece utopia: seguirmos juntos.
É de suma importância o compromisso com uma sociedade em que o alimento esteja em todas as mesas. Como disse Papa Francisco, “não há democracia se existe fome”.
Melissa Luciana de Araújo é professora, nutricionista, doutoranda em Saúde e Nutrição na Universidade Federal de Ouro Preto e docente do curso de graduação em Nutrição da Faculdade Promove e Kennedy. Coordenadora da Comissão Permanente do Direito Humano à Alimentação Adequada do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável de Minas Gerais (CONSEA-MG) & Renata Siviero Martins é administradora e Mestra em Educação. Assessora de Projetos na Cáritas Brasileira MG. Presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional.
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Elis Almeida