Minas Gerais

PRIVATIZAÇÃO

Com crédito consignado em Auxílio Brasil, empresas tentam lucrar com a miséria alheia

Empresários, como Romeu Zema (Novo), se beneficiam de medidas liberais adotadas pelo governo

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Antonio Cruz - Agência Brasil

O Ministério Público Federal solicitou ao Tribunal de Contas da União (TCU) a suspensão do crédito consignado do Auxílio Brasil pela Caixa Econômica Federal. No pedido, o subprocurador Lucas Furtado requer que o banco público se abstenha de realizar novos empréstimos consignados, até que o TCU se manifeste de maneira definitiva sobre o assunto.

Além disso, Furtado diz que é preciso impedir a utilização do empréstimo consignado “com finalidade meramente eleitoral e em detrimento das finalidades vinculadas do banco, relativas à proteção da segurança nacional ou ao atendimento de relevante interesse coletivo”.

Na última semana, veículos de imprensa repercutiram que uma das 12 empresas autorizadas a oferecer o crédito a beneficiários do Auxílio Brasil é a Zema Crédito, Financiamento e Investimento S/A, que tem como sócio o governador de Minas, Romeu Zema (Novo).

Com a autorização, a empresa poderá emprestar até R$ 2.569 a pessoas em situação de pobreza ou extrema pobreza, com juros mensais de até 3,45% por mês, totalizando 50,23% ao ano. Essa taxa é maior que a do consignado de aposentados e pensionistas do INSS, que é 2,14%.

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A notícia rendeu críticas ao governador reeleito, acusado de se beneficiar da aliança com Jair Bolsonaro (PL), a quem declarou apoio nas eleições presidenciais. Críticos também lembram que, em maio de 2021, Zema foi contra um auxílio estadual de R$ 600 criado pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, mas acabou sancionando o projeto após a repercussão negativa do posicionamento.

Em todo o Brasil, a prática de colocar os beneficiários do auxílio à disposição do mercado de crédito foi considerada uma forma de explorar os mais pobres. “Chega a ser cruel, pois pega as pessoas em situação de fragilidade e oferece um dinheiro fácil, com juros exorbitantes, deixando uma bomba relógio nas mãos dessas pessoas. Ao mesmo tempo, é eleitoreiro, pois liberaram isso agora”, avalia o economista Weslley Cantelmo, presidente do Instituto Economias e Planejamento (IEP).

Os negócios do rei

O caso também chama a atenção para as relações entre os interesses privados de políticos e as medidas que eles adotam em cargos públicos. Com sede em Araxá, o Grupo Zema tem negócios nos ramos de empréstimos, seguros, consórcios e vendas de eletrodomésticos, imóveis, roupas e veículos.

A Zema Imóveis, por exemplo, atua na construção e incorporação imobiliária. Paralelamente, o governo de Minas está desmontando a Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (Cohab), com o leilão de imóveis públicos, conforme noticiou o Brasil de Fato MG. Enquanto isso, segundo a Fundação João Pinheiro, Minas tem o segundo maior déficit habitacional do país, com 496 mil famílias em situações de gasto excessivo com aluguel, habitação precária ou coabitação (mais de uma família morando no mesmo domicílio).

“Você mantém o povo sem casa porque ele vai ter que trabalhar para você, vai ter que pagar aluguel, vai ter que comer, ter água, ter luz. Aí, recebe R$ 600 e tem que pegar R$ 2 mil emprestados para pagar o aluguel que atrasou e vence todo mês. É o que temos visto aqui na comunidade”, observa Edneia Aparecida de Souza, moradora do bairro Taquaril, região Leste de Belo Horizonte, e dirigente do Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM).

Quem ganha dinheiro com o liberalismo

Para Weslley Cantelmo, é preciso perguntar, sempre, quais empresas estão lucrando quando governos colocam em prática o neoliberalismo, com privatizações e desmonte de programas voltados para a população pobre. Para o economista, o partido Novo é um exemplo de como essa política beneficia grandes grupos econômicos.

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“Quando eles falam de privatização e modernização, eles tentam criar nichos de mercado a partir da própria atividade pública. Na educação, tentam colocar grandes corporações dentro das escolas públicas. Em outros setores, há uma infraestrutura posta pelo Estado, as empresas públicas, que eles querem substituir, como a Cemig e Copasa. No saneamento, eles têm retirado o monopólio estatal para estabelecer monopólios regionais privados”, exemplifica.

Nessa lógica, o Auxílio Brasil acabou servindo para expandir o mercado consumidor de empresas como a Zema Financeira. “Vai ter o auxílio? Então, vamos permitir que a pessoa pegue crédito consignado com os bancos e financeiras”, conclui.

Edição: Larissa Costa