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Só a tarifa zero pode garantir plenamente o direito ao voto

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Reprodução - Passe Livre SP
A democracia só existe se todos os cidadãos forem capazes de exercê-la

Na semana que precedeu o primeiro turno das eleições nacionais, uma polêmica apareceu e se espalhou como rastilho de pólvora. Os habitantes de Porto Alegre (RS), cidade que possuía uma prática garantida em lei de gratuidade no transporte público em dia de eleições, se surpreenderam com o fato de que, naquele pleito, teriam que pagar para circular na cidade e exercer seu direito (também um dever, previsto em lei) de votar.

A decisão vinha em razão de uma lei aprovada em novembro de 2021, que revogou a gratuidade nesse e em outros dias. A notícia causou uma forte reação em todo o país e logo prefeitos, movimentos sociais, defensorias públicas estaduais e partidos começaram a pressionar para que o passe livre eleitoral fosse garantido.

A reação em cadeia começou quando o prefeito do Rio de Janeiro (RJ), Eduardo Paes, anunciou a tarifa zero para o dia das eleições. No mesmo dia, o partido Rede Sustentabilidade entrava com uma representação no TSE pedindo a gratuidade no transporte público a nível nacional. Ao mesmo tempo, a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul exigia a volta do passe livre nas cidades que o haviam perdido.

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O efeito dessas ações foi estabelecer o exemplo e precedente para que uma quantidade significativa de municípios adotasse a tarifa zero para as eleições. Segundo levantamento do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), 64 cidades no Brasil todo implementaram o passe livre eleitoral – entre elas, 11 capitais (Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Manaus, Curitiba, Porto Alegre, São Luís, Maceió, Campo Grande, Porto Velho, Florianópolis, Boa Vista e Palmas).

A população total contemplada com a gratuidade, incluindo aí os 46 municípios que já possuem tarifa zero universal no sistema de transporte, beira os 40 milhões de habitantes – um pouco menos de 20% de toda a população brasileira. Assim, uma sequência de eventos acabou por acarretar a maior experiência de tarifa zero simultânea do Brasil e, possivelmente do mundo!

Democracia e direito à cidade

Como movimento social, sempre argumentamos que uma cidade só existe para quem pode circular por ela. O mesmo acontece com a democracia, que só existe se todos os cidadãos forem capazes de exercê-la. O que temos visto nas combalidas democracias liberais do mundo ocidental é uma ofensiva da extrema-direita na supressão do direito ao voto das minorias, grupos vulneráveis e mais pobres. Nos EUA, avançam leis que dificultam o registro ao voto, concentram seções eleitorais e mantêm urnas distantes de distritos pobres, em um esforço para que o partido republicano e o trumpismo saia fortalecido.

O Brasil sempre fez suas eleições em domingos, dia de descanso para maior parte da população, e sempre teve um sistema eleitoral pujante, rápido e preciso, do qual podemos nos orgulhar. Ainda assim, convivemos com uma taxa de abstenção de eleitores que beira os 20%. Parte dela se explica por desatualização dos dados – eleitores que já morreram, migrantes que não atualizaram o título etc. Mas, parte se dá pela desmobilização da população pobre em ir votar. Em um contexto de aumento da pobreza e da inflação, duas ou quatro passagens de ônibus podem ser a diferença entre o voto e o não-voto.

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A extrema-direita brasileira também não tem nenhum pudor em buscar suprimir o voto dos mais pobres. Prova disso são os sucessivos recursos apresentados pela campanha de Jair Bolsonaro contra a gratuidade dos ônibus. Quem, em sã consciência, pode ser contra o ônibus gratuito em dia de eleição? É de um escárnio sem tamanho.

Por isso, no dia 19 de outubro, faltando 11 dias para as eleições do dia 30, mais de 80 organizações da sociedade civil lançam a campanha Passe Livre Pela Democracia para que seja garantido o direito ao transporte e ao voto no Brasil inteiro. Acesse o site www.passelivrepelademocracia.org/ e ajude a pressionar o prefeito da capital de seu estado.

André Veloso é economista e integrante do movimento Tarifa Zero BH

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Larissa Costa